Amnésia: tipos e características

Amnésia: tipos e características
Alejandro Sanfeliciano

Escrito e verificado por o psicólogo Alejandro Sanfeliciano.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

Um dos transtornos de memória mais conhecidos é a amnésia. Trata-se de um problema clínico que causa déficits importantes na hora de codificar, armazenar ou recuperar informações de experiências. O processo psicológico básico da memória é complexo e multifatorial. Devido a esse fato, a amnésia é, em muito casos, um sintoma bastante complicado de explicar com precisão.

Nesse sentido, os pacientes com amnésia têm sido uma fonte de incalculável valor quando falamos em compreender um pouco melhor como funciona nossa memória. Investigar os diferentes déficits que nós podemos encontrar nos ajuda a entender com mais profundidade a estrutura e a funcionalidade da memória. A maior parte das pesquisas nesse tema foram realizadas até então em torno da síndrome amnésica, uma síndrome em que a memória episódica encontra-se danificada.

Mas o que é memória episódica? É a memória para fatos, de tudo o que já ocorreu ou sabemos que ocorreu em um momento no tempo. Quando investigamos a amnésia nesse tipo de memória, o fazemos a partir de uma organização temporal do dano. A partir disso, podemos organizá-la em dois tipos: (A) amnésia retrógrada, onde ocorre a perda de lembranças de tudo que ocorreu antes da doença ou acidente, e (B) amnésia anterógrada – onde ocorre a perda da capacidade de formar novas memórias após a doença ou acidente. A seguir explicaremos essas categorias de modo mais amplo.

Amnésia retrógrada

A amnésia retrógrada é caracterizada pela incapacidade de acessar lembranças anteriores ao momento que se produziu a lesão na memória. O período de tempo afetado pode ser muito variável, gerando o esquecimento de alguns dias ou da vida toda. É importante ter em mente que as síndromes, transtornos e lesões que causam esse tipo de amnésia não afetam a capacidade de criar novas memórias. Também se encontram intactos outros tipos de memória, como a implícita – processos automáticos como mudar a marcha do carro – e a procedimental – uma memória motora, como andar de bicicleta.

Pássaros voando de árvore em forma de cabeça

A origem e causa desse transtorno costuma ser de caráter orgânico. Ou seja, é a consequência de uma lesão no tecido cerebral. Mais especificamente, no cérebro, ela pode ser ocasionada por lesões no hipocampo, nos gânglios da base ou no diencéfalo. Não quer dizer, no entanto, que a amnésia retrógrada não pode ocorrer sem nenhum tipo de lesão. Quando isso ocorre, ela é chamada de amnésia psicogênica ou funcional.

Um dos pacientes mais estudados com um caso de síndrome amnésica foi Clive Wearing. Esse indivíduo era incapaz de recordar qualquer informação que tivesse ocorrido antes de um acidente que sofreu em 1985. Esse acidente causou a destruição de seu hipocampo e danos graves em seus lobos temporais. Além da amnésia retrógrada, Clive também sofria de amnésia anterógrada, que não permitia a criação de novas memórias. A vida desse paciente supunha viver em um contínuo e eterno presente do qual ele não podia escapar.

Amnésia anterógrada

Ao contrário do transtorno do tipo retrógrado, a amnésia anterógrada supõe a incapacidade de criar novas lembranças depois da lesão. Desse modo, qualquer informação que se tenha armazenado antes da lesão permanece guardada na memória, que fica ainda intacta com fenômenos normais de recordação. Assim como a anterior, na maioria dos casos a situação é produto de uma lesão orgânica, em que as estruturas hipotalâmicas e temporais se encontram danificadas.

Uma características curiosa desse transtorno é que só a codificação da memória explícita se encontra danificada. Isso quer dizer que esse sujeito, apesar de sua incapacidade de criar novas memórias, pode aprender novas habilidades procedimentais ou implícitas. Por exemplo, se um paciente com amnésia anterógrada toca piano todos os dias, ele irá melhorando com o tempo. Mas ele não se lembrará de maneira consciente de ter tocado piano em nenhum momento, porque todo dia para ele seria o primeiro dia.

Borboletas de folhas em árvore em forma de cabeça

Um dos casos de amnésia anterógrada mais famoso foi o caso de HM. Essa é a sigla para o nome do paciente Henry Molaison, um dos primeiros no estudo da localização no cérebro das estruturas responsáveis pela memória. Esse sujeito teve que se submeter a uma cirurgia para dar fim a seus ataques epiléticos graves. Nesse procedimento cirúrgico, foi retirado seu foco epilético – justamente grande partes das estruturas hipotalâmicas. De fato, a cirurgia colocou um fim no seu histórico de ataques de epilepsia, mas criou também um dano grave em sua memória.

HM era incapaz de lembrar qualquer coisa nova após a operação, mas suas capacidades executivas e procedimentais encontravam-se intactas. Na hora de engatar uma conversa com ele, era coerente e à primeira vista não parecia ter nenhum problema. Mas ao abandonar a conversa e voltar novamente, ele não se lembrava de nada.

Anteriormente mencionamos que todos os tipos de amnésia são independentes: uma pode aparecer sem que apareça a outra. Cabe ressaltar nesse sentido em particular que a realidade da síndrome amnésica é muito mais complexa. O mais normal é que as lesões afetem vários lugares do cérebro, o que acaba desencadeando amnésias de caráter misto. Ainda assim, os estudos sobre esses pacientes com amnésias “puras” são muito interessantes para conhecer melhor como funciona a nossa memória.


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