Por que às vezes não conseguimos suportar a solidão?

Por que às vezes não conseguimos suportar a solidão?
Alicia Yagüe Fernández

Escrito e verificado por a psicóloga Alicia Yagüe Fernández.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

A forma como nos relacionamos com a solidão diz muito sobre nós. Tomar consciência de nossos estados de ânimo, pensamentos, desejos e necessidades, e também refletir sobre eles, nos permite encontrar estabilidade psicológica inclusive em momentos conflituosos. Essa introspecção será nutrida de acordo com o tempo que dedicamos para ficar sozinhos. Até que ponto você consegue suportar a solidão?

A capacidade de aproveitar a solidão como uma escolha é um sinal de maturidade emocional e independência que permite potencializar o autoconhecimento. É possível que nos achemos tão insuportáveis que a companhia de nós mesmos pareça ruim, e precisemos assim de outras pessoas para nos distrair. A dependência nas relações e os conflitos sentimentais levam a um vazio emocional, e uma não tolerância à solidão. Caímos em relações dependentes, uma simbiose de laços confusos baseados em sentimentos que não são genuínos.

“Os que odeiam a solidão odeiam apenas a si mesmos”.
-Anônimo-

Quando parece impossível suportar a solidão

Sentir bem-estar quando estamos sozinhos é uma experiência muito pessoal. Cada momento que passamos em solidão é único, pois nascem em nós diversas sensações que mudam em função do momento vital que estamos vivendo e de como nós nos encontramos psicologicamente.

Mulher triste por estar sozinha

Nem todas as mentes humanas têm sucesso em entender e integrar a dor que alguns conflitos e circunstâncias da vida trazem. Muitas vezes nos dá desespero escutar o eco da própria voz, e por isso nos rodeamos ao máximo de qualquer barulho exterior. Evitar escolher a si mesmo como companhia é fugir por um caminho sem saída, porque cedo ou tarde o vazio não é só notado como pode tomar conta de nós.

Se não suportamos a solidão, na verdade estamos vivendo com máscaras, a autenticidade é deixada de lado e acabamos jogando com base na evitação. Faremos todo o possível para não estar sozinhos, e disfarçaremos esse medo com todo tipo de justificativa falsa. Pularemos de relação em relação sem saber nem mesmo o que estamos buscando. Descontaremos nossa angústia em amigos e familiares para que eles suportem parte de nossa carga e nos aliviem o peso pelo menos momentaneamente. Tentaremos encontrar uma anestesia para a ansiedade atirando para todos os lados. Qualquer opção será válida para não enfrentar a solidão e a mensagem que vem com ela.

No caso da solidão nos causar desconforto, incômodos, tédio, angústia ou ansiedade, é conveniente parar para pensar: estou à vontade comigo mesmo? Há algo que está me preocupando por dentro? Fazendo com que eu fique inquieto? Eu sei dar nome às emoções que estou sentindo? Posso explicar em palavras aquilo que me atravessa a mente e o coração?

Quando a solidão é incômoda ou desagradável, há uma mensagem que está tentando se fazer ouvir. Algo não está funcionando bem se ocupamos constantemente nosso tempo com diferentes pessoas. Evitar a solidão a todo custo e a qualquer preço reflete um conflito intrapessoal. Se evitarmos ouvir o chamado dessa responsabilidade, acabaremos buscando qualquer forma para acalmar esse mal-estar sem nunca conseguirmos compreender o que está realmente acontecendo.

A solidão é reparadora

Diante de certos acontecimentos da vida é necessário um tempo de solidão para ordenar as ideias e integrar nossos sentimentos. A perdas e as mudanças geram grandes desequilíbrios emocionais que precisam de reflexão para serem entendidos e para que a calma seja recuperada.

Dedicar tempo à vida privada é essencial para poder sentir e assumir as nossas vivências. Claro que também precisamos de outras pessoas para compartilhar nossas experiências e inquietudes, mas escutar nossa própria voz é muito mais importante. Passar tempo com os outros não deve ser um substituto para a reflexão pessoal, e sim um complemento.

Mulher com os cabelos voando

Reservar momentos de silêncio consigo mesmo irá obrigá-lo a colocar o foco de atenção no seu mundo interno. Somos nós os únicos que podemos escutar nossos pensamentos e enfrentar nossas emoções. Ninguém mais entrará na nossa mente e tomará a responsabilidade de gerir aquilo que nos afeta, isso está em nossas mãos. Então, é na hora da solidão que podemos aproveitar a calma e aprender a gerenciar o mal-estar.

A solidão nos permite fazer o esforço necessário para entender a nós mesmos. A solidão nos dá a oportunidade de escolher o que fazer, quando e como, e de aproveitar todo o processo com consciência e sem distrações.

“A solidão é o império da consciência”.
-Gustavo Adolfo Bécquer-  

Onde foi parar a autenticidade das relações?

Quando falamos de relacionamentos, o mais importante é a qualidade, e não a quantidade. A presença de alguém ao seu lado pode fazer você se sentir ainda mais sozinho do que você estava quando efetivamente não tinha ninguém ao seu lado. A companhia não assegura o bem-estar individual.

Precisamos de carinho dos outros desde o momento em que nascemos. Buscamos o contato humano de forma inata, como espécie social que somos. A família, os amigos, os namorados, os colegas de trabalho e cada um dos núcleos sociais dos quais fazemos parte são essenciais para nosso desenvolvimento individual. As relações interpessoais influenciam a nossa personalidade, nossas habilidades sociais e o próprio controle emocional que conseguimos desenvolver em relação ao ambiente externo. Mas tão importante quanto tudo isso é a capacidade de estar sozinho. Gostar de estar consigo mesmo é o primeiro passo para poder estar bem também com os demais.

Além disso, o fato de atualmente estarmos vivendo um momento em que estamos disponíveis o tempo todo nos conduz paradoxalmente a uma desconexão e deterioração de vínculos reais. Passamos mais tempo nos comunicando através de telas do que olhando nos olhos. Temos acesso a uma enorme quantidade de pessoas e a possibilidades diversas de relações, mas estas acabam sendo efêmeras e não cumprem as necessidades afetivas humanas mais profundas. Como consequência, ficamos incomodados quando estamos sós e insatisfeitos com as novas relações que criamos.

“O caráter independente surge de poder ser o suficiente pra si mesmo”.
-Francisco Grandmontagne-

Mulher abraçada a homem

A solidão escolhida é a melhor companhia que se pode ter

Aproveitar os momentos de solidão dependerá de nossa capacidade introspectiva. Dizendo de outra maneira, da capacidade que temos para nos analisar. Essa capacidade reflete o nível de compromisso e a dedicação que temos com nós mesmos. Ou seja, até que ponto estamos assumindo a responsabilidade pela própria vida sem delegar nosso mundo interior e nossos conflitos para que outras pessoas os resolvam. Uma coisa é buscar a companhia alheia para dar o que te sobra, outra coisa é buscar a companhia alheia para ter o que te falta.

Não se trata de simplesmente não ter a presença de ninguém. Estamos falando da capacidade de aproveitar o momento estando sozinho. Fazer companhia para si mesmo, escolher a si mesmo como companheiro e aproveitar o momento. Inclusive nas horas em que poderíamos estar acompanhados. É isso que define se chegamos lá. Isso garantirá que a relação com os outros seja baseada no desejo, e não na necessidade.

“Que agradável surpresa é descobrir que, no fim das contas, estar sozinho não é necessariamente a mesma coisa que se sentir sozinho”.
-Ellen Burstyn-


Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.