Nossa mente modifica as lembranças

Nossa mente modifica as lembranças

Última atualização: 30 maio, 2015

Quando presenciamos um acontecimento ou tentamos nos lembrar de algo do passado, cremos que estamos narrando as coisas tal como aconteceram, mas a verdade é que, muitas vezes, a mente modifica as lembranças.

Se colocarmos a um grupo de pessoas para observar um acontecimento, nenhuma explicará as coisas de forma exata. A mente não funciona como um gravador de vídeo no qual a realidade fica registrada; ela é muito mais complexa e entra em jogo a nossa capacidade de interpretação, nossas crenças, medos, valores, estado de humor, etc…

A forma como vemos os acontecimentos passados depende do nosso humor presente

Se pedirmos para uma mulher casada nos contar como foi o dia do seu casamento, usará o seu estado de humor presente para narrar o seu passado. Se agora continuar feliz com seu marido, contará o momento do enlace como o dia dos sonhos, quando na verdade esse dia pode não ter sido tão bom assim devido ao nervosismo. Entretanto, a mente o lembrará como perfeito pelo estado de felicidade em que se encontra no presente.

Mas se ao contrário, a mulher casada estiver passando por um mau momento ou estiver separada, irá se lembrar do seu casamento de uma forma menos feliz; minimizará os momentos bons e tentará procurar as coisas negativas do dia do seu enlace.

Da mesma forma, se perguntarmos para uma pessoa que agora está satisfeita com seu trabalho como foi o seu passado laboral, provavelmente irá abrandar as coisas negativas, verá o seu passado a partir de uma perspectiva positiva e ressaltará os momentos bons do seu passado profissional. Mas se ao contrário, a pessoa agora passa por um mau momento e até participa de greves, poderá resumir o seu passado profissional como terrível e repleto de sofrimento.

A mente modifica as lembranças com base no momento presente, procurando fazer com que tudo se encaixe e fique de acordo com ele. A parte da mente encarregada de editar essa informação chama-se hipocampo.

Quanto menos implicações emocionais, mais realista

Quantas vezes quisemos saber a opinião de alguém alheio a nossa família para ver qual era a sua percepção das coisas? Frequentemente, muitas pessoas que passam por problemas familiares são conscientes de que, quando entram em jogo sentimentos e emoções, é difícil ver as coisas como realmente são. Por isso, alguém que vê as coisas de fora poderia ser mais realista.

A grande maioria de nós já teve algum amigo ou conhecido que não via a realidade e, por mais que o tenhamos aconselhado, não nos ouvia ou até se ofendia por causa do estado de “cegueira” que provoca a paixão. A interpretação dos acontecimentos pode ser muito alterada se sentimentos vinculados estiverem envolvidos.

A mente pode confundir cenas inventadas com a realidade

O tipo de personalidade também influencia na hora de construir as lembranças. Pode-se chegar a confundir o real com o imaginário. Seria o caso de pessoas altamente sonhadoras que, frente a um acontecimento agradável, podem chegar a exagerar o que aconteceu e inventar pequenos detalhes que façam a lembrança ainda mais bonita. A pessoa não acha que está mentindo, mas de forma natural tende a “enfeitar” os acontecimentos de modo que na mente ficam gravadas as novas imagens.

Também pode ocorrer o contrário: frente a um episódio negativo, uma personalidade altamente temerosa e pessimista exagera negativamente o acontecido e grava na lembrança episódios que nunca aconteceram.

Em personalidades com um alto instinto de proteção pode acontecer que, frente a um episódio traumatizante, sejam apagadas partes que se fossem lembradas as machucariam em excesso. Como uma forma de proteção, a mente edita o acontecimento e procura torná-lo menos traumatizante.

O poder das perguntas sugestivas

Não apenas a nossa mente pode manipular as lembranças; se formos submetidos a perguntas sugestivas, corremos o risco de que a narrativa do episódio seja distorcida. Por isso, em processos penais estão proibidas as perguntas que manipulem o interrogado.

Não é o mesmo dizer pra alguém “Conte-me o que aconteceu exatamente” do que dar como certo um episódio. Exemplo de pergunta sugestiva: “Quando você entrou de penetra no show, você sabia que justo nesse momento o segurança não estava presente?” Este tipo de pergunta já está narrando como aconteceram os fatos, sendo que pode ser que as coisas não tenham acontecido dessa maneira. A pessoa, em vez de entrar de penetra intencionalmente, poderia ter outra explicação, mas ao formular a pergunta dessa forma esse detalhe poderia passar despercebido. A pessoa poderia responder o que lhe acontecera, deixando a afirmação que há na pergunta como válida.

As perguntas que manipulam são as que dão uma informação esperando ser validadas, como: “É verdade que você estava muito assustado?”. Esta pergunta pressiona para que seja muito simples responder “Sim”. A pergunta que não tentaria manipular e daria total liberdade de expressão seria: “Como você se sentiu?”, É uma pergunta que não dá informação e deixa que o outro se expresse sem pressões.

Quantas pessoas reclamam que os psicólogos não as ajudam a se esclarecer, mas que lhes fazem perguntas difíceis de responder? A explicação está no fato de que eles não querem manipular as respostas. Muitas pessoas preferem que lhes facilitem as respostas, mas dar ideias pode fazer com que o paciente não responda com a verdade que leva dentro de si.

Imagem cortesia de siripong siriwongnak.


Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.