Transtorno de somatização: quando o corpo fala

Transtorno de somatização: quando o corpo fala
Francisco Pérez

Escrito e verificado por o psicólogo Francisco Pérez.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

As pessoas que sofrem com um transtorno de somatização costumam apresentar vários sintomas somáticos (corporais) que causam mal-estar ou podem provocar problemas significativos na vida diária. Contudo, algumas vezes podem apresentar apenas um sintoma grave, e não vários sintomas. Nesses casos, o mais característico é a dor.

Os sintomas podem ser específicos (por exemplo, dor localizada) ou relativamente não específicos (por exemplo, fadiga). Os sintomas às vezes denotam sensações corporais normais ou um mal-estar que geralmente não significa uma doença grave.

O sofrimento da pessoa com transtorno de somatização é real

A pessoa que sofre de um transtorno de somatização realmente sofre. Seu mal-estar é verdadeiro, a medicina explicando a causa ou não. Assim, os sintomas podem estar associados ou não a outra condição médica. Na verdade, com frequência essas pessoas apresentam condições médicas junto com o transtorno de somatização. Por exemplo, uma pessoa pode estar gravemente incapacitada pelos sintomas de um transtorno de somatização depois de um infarto não complicado do miocárdio. Isso acontece mesmo quando o próprio infarto do miocárdio não provocou nenhuma incapacidade.

Se existisse outra condição médica ou um risco elevado de ter uma, os pensamentos, sentimentos e comportamentos associados a essa doença seriam excessivos nessas pessoas. Por outro lado, as pessoas com transtorno de somatização tendem a ter níveis muito altos de preocupação com a doença. Dessa forma, avaliam incorretamente seus sintomas corporais e os consideram ameaçadores, prejudiciais ou incômodos. Frequentemente pensam o pior sobre sua saúde.

Inclusive quando há provas de que tudo está bem com sua saúde, alguns pacientes ainda temem que seus sintomas sejam graves.

Mulher com transtorno de somatização

Os problemas de saúde assumem um papel central na vida do indivíduo

No transtorno de somatização, os problemas de saúde podem assumir um papel central na vida da pessoa. Esses problemas podem acabar se transformando em uma característica da sua identidade e finalmente acabar dominando as relações interpessoais.

As pessoas com transtorno de somatização costumam experimentar um mal-estar que se foca principalmente nos sintomas somáticos e seu significado. Quando são diretamente questionadas sobre seu mal-estar, algumas pessoas o descrevem também em relação a outros aspectos das suas vidas. Outras pessoas negam qualquer fonte de angústia, além dos sintomas somáticos.

A qualidade de vida diminui 

A qualidade de vida relacionada com a saúde é afetada frequentemente, tanto no plano físico quanto no mental. No transtorno de somatização a deterioração é característica, e quando é persistente, pode dar lugar à incapacidade. Nesses casos, o paciente costuma ir com frequência a consultas médicas e, inclusive, procura vários especialistas. No entanto, isso raramente alivia suas preocupações.

Essas pessoas muitas vezes parecem não responder às intervenções médicas e as novas intervenções podem piorar a apresentação dos sintomas, criando um círculo vicioso. Alguns desses indivíduos parecem anormalmente sensíveis aos efeitos colaterais dos medicamentos. Além disso, alguns sentem que sua avaliação clínica e o correspondente tratamento não foram suficientes.

Quais características as pessoas com transtorno de somatização apresentam?

As características que as pessoas com transtorno de somatização costumam apresentar são as seguintes:

Características cognitivas ou de pensamento

As características cognitivas incluem uma atenção focada nos sintomas somáticos e na atribuição das sensações corporais normais a uma doença física (possivelmente com interpretações catastróficas).

Além disso, também incluem preocupações relacionadas à doença e ao medo de que qualquer atividade física possa fazer mal ao corpo.

Características de comportamento

As características de comportamento relevantes associadas podem ser a repetida comprovação corporal de anomalias, a busca repetitiva de cuidados médicos e segurança e a evitação de atividades físicas. Essas características de comportamento são mais destacadas nos transtornos de somatização graves e persistentes, como se pode presumir.

Essas características geralmente estão associadas a consultas constantes de aconselhamento médico para diferentes sintomas somáticos ou corporais. Isso pode dar lugar a consultas médicas em que os indivíduos estão tão focados nas suas preocupações em relação aos sintomas somáticos que a conversa não pode se redirecionar a outros assuntos.

Frequentemente existe um alto nível de utilização de assistência médica. No entanto, isso raramente alivia as preocupações do indivíduo. Como consequência, a pessoa pode receber assistência médica de vários especialistas para os mesmos sintomas.

Exame médico

Visitas frequentes ao médico

Qualquer tentativa de tranquilizar o paciente por parte do médico e de explicar que os sintomas não são indicativos de uma doença física grave costuma ser efêmera. Os indivíduos sentem como se o médico não tratasse dos seus sintomas com a devida seriedade.

Dado que focar os sintomas corporais é uma característica principal da doença, as pessoas com transtorno de somatização costumam procurar os serviços de saúde médica em vez dos serviços de saúde mental.

Nos casos de indivíduos com transtorno de somatização, a recomendação do encaminhamento a um especialista de saúde mental pode ser recebida com surpresa ou, até mesmo, com uma clara rejeição.

Como o transtorno de somatização está associado a transtornos depressivos, existe um maior risco de suicídio. Não se sabe se o transtorno de somatização está associado ao risco de suicídio independentemente da sua associação com os transtornos depressivos.

Qual é a incidência do transtorno de somatização?

A incidência do transtorno de somatização é desconhecida, embora estime-se que na população adulta ela pode estar entre 5 e 7%. Por outro lado, acredita-se que é menor do que a do transtorno somatoforme indiferenciado. Além disso, as mulheres apresentam maior tendência a mencionar mais sintomas somáticos do que os homens, e a incidência do transtorno de somatização é provavelmente, como consequência disso, maior nas mulheres do que nos homens.

Critérios que devem estar presentes para fazer o diagnóstico de transtorno de somatização

Os critérios que devem ser levados em consideração pelos especialistas em saúde mental para fazer o diagnóstico do transtorno de somatização são os seguintes:

A. Um ou mais sintomas somáticos que causam mal-estar ou dão lugar a problemas significativos na vida diária.

B. Pensamentos, sentimentos ou comportamentos excessivos relacionados aos sintomas somáticos ou associados à preocupação com a saúde, como se torna evidente por uma ou mais das seguintes características:

  • Pensamentos desproporcionais e persistentes sobre a gravidade dos próprios sintomas.
  • Nível persistentemente elevado de ansiedade em relação à saúde ou aos sintomas.
  • Emprego de tempo e energia em excesso na preocupação com esses sintomas ou com a saúde.

C. Embora algum sintoma somático possa não estar continuamente presente, o estado sintomático é persistente (em geral por mais de seis meses).

Como o transtorno de somatização se desenvolve e qual é o seu andamento?

Nas pessoas idosas os sintomas somáticos e as condições médicas simultâneas são frequentes. Por isso, para fazer um diagnóstico é crucial ter atenção ao critério B anteriormente citado.

O transtorno de somatização pode estar subdiagnosticado nos idosos, seja porque certos sintomas (por exemplo, dor, fadiga) são considerados parte do envelhecimento normal ou porque a preocupação com a doença é considerada “compreensível” nos idosos, que geralmente têm mais doenças e precisam de mais medicamentos que os jovens. A depressão também é comum nos idosos que apresentam vários sintomas.

Transtorno de somatização nas crianças

Nas crianças, os sintomas mais comuns são dor abdominal recorrente, dor de cabeça, fadiga e náuseas. É mais frequente o predomínio de apenas um sintoma nas crianças do que nos adultos. Apesar de as crianças poderem ter reclamações somáticas, é raro que se preocupem com a “doença” per se antes da adolescência.

Menino doente com cachorro de pelúcia

A resposta dos pais frente aos sintomas é importante, já que isso pode determinar o nível de angústia associada. Os pais podem ser determinantes na interpretação dos sintomas, no tempo que vão faltar da escola e na busca de ajuda médica.

Como já vimos, o transtorno de somatização está associado a uma deterioração significativa do estado de saúde e a outros transtornos, como depressão ou ansiedade. Nesse sentido, buscar ajuda psicológica é imprescindível para melhorar a qualidade de vida desses pacientes.

Referências bibliográficas:

  • American Psychiatry Association (2014). Manual diagnóstico y estadístico de los trastornos mentales (DSM-5), 5ª Ed. Madrid: Editorial Médica Panamericana.

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  • American Psychiatry Association (2014). Manual diagnóstico y estadístico de los trastornos mentales (DSM-5), 5ª Ed. Madrid: Editorial Médica Panamericana.
  • Hilty, D. M., Bourgeois, J. A., Chang, C. H., & Servis, M. E. (2001). Somatization Disorder. Current Treatment Options in Neurology3(4), 305–320. Retrieved from http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/11389802

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