Vincent Van Gogh e o poder da sinestesia na arte

Vincent Van Gogh e o poder da sinestesia na arte
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 02 dezembro, 2021

Vincent Van Gogh explicou nas suas cartas que, para ele, os sons tinham cores e que certas cores, como o amarelo ou o azul, eram como fogos de artifício acariciando seus sentidos. Por isso que o seu “Girassóis” e o “Noite estrelada” são até hoje telas vibrantes dotadas de vida, de movimento. Indícios evidentes, todos eles, de que o célebre gênio pós-impressionista era sinestésico.

Pode ser que esse dado seja novo para muitas pessoas. No entanto, há muito tempo isso se tornou evidente após a análise de muitas dessas cartas que Van Gogh enviava ao seu irmão Theo ou, até mesmo, pela análise das suas pinturas. A Associação Americana de Sinestesia (ASA), por exemplo, demonstrou a presença de “fotismos” no seu estilo de pintura, ou seja, um tipo de resposta sensorial que quem tem cromestesia apresenta.

“A cor representa o entusiasmo da vida.”
-Vincent Van Gogh-

A cromestesia é uma experiência dos sentidos, na qual a pessoa associa sons com cores. Os tons mais agudos, por exemplo, provocam a percepção de cores mais intensas, mais vívidas e brilhantes. Por sua vez, as cores também podem induzir sensações auditivas ou musicais. Era o que acontecia com Franz Liszt quando compunha e também era o que sentia Van Gogh, esse gênio no meio do caminho entre a loucura e a maníaco-depressão que deixou esse mundo sem saber o que acontecia com ele e a importância que suas criações tiveram na arte.

Noite Estrelada sobre o Ródano, de Vincent Van Gogh

Vincent Van Gogh e o mundo das cores

Em 1881, em Haia, Vincent Van Gogh escreveu uma carta ao seu irmão. Na carta, ele explicava que cada pintor tinha sua paleta de cores preferidas e que essas tonalidades preferidas eram uma maneira pela qual o artista conseguia atravessar a escuridão do seu coração para encontrar a luz. Ele também comentou que alguns pintores tinha a majestosa qualidade de usar suas mãos com o virtuosismo de um violinista e que determinadas obras chegavam a ser música pura.

Alguns anos depois, em 1885, Van Gogh decidiu estudar piano. No entanto, essa experiência durou pouco e acabou da pior forma para ele. Pouco depois de começar as aulas, o artista declarou que a experiência de tocar era deslumbrante: cada nota evocava uma cor. Seu professor, assustado com essas declarações, decidiu expulsá-lo do local após declarar que Van Gogh “estava louco”.

Essa informação não deixa de nos fazer dar um pequeno sorriso. Porque dentre todas as patologias que Vincent Van Gogh sofria, essa, a de experimentar sensações cromáticas com estímulos musicais era, sem dúvidas, seu melhor dom, uma nuance que talvez tenha dado à sua arte uma expressividade excepcional e uma riqueza sensitiva pouco observada até o momento. Suas enérgicas pinceladas, por exemplo, dotavam cada detalhe de movimento, nos quais o amarelo lhe permitia sentir a alegria, o som da esperança que em determinados momentos tanto fez falta na vida de Van Gogh.

“Quando sinto falta de alguma religião, saio à noite para pintar as estrelas.”
-Vincent Van Gogh-

Girassois de Van Gogh

Ao mesmo tempo, uma coisa que seus companheiros de ofício criticavam era que o uso das cores que ele fazia nada tinha a ver com a realidade. No entanto, isso era algo secundário para Van Gogh. Não tinha importância alguma na verdade. As cores, para ele, eram a expressão e a busca de determinadas emoções e sensações.

Assim como um dia explicou ao irmão, ele se sentia incapaz de copiar a realidade. Suas mãos, sua mente, seu olhar nunca conseguiram chegar a um acordo com a natureza ou com tudo aquilo que os outros enxergavam com nitidez. Para Van Gogh, o mundo pulsava de outra maneira, ele tinha outras perspectivas, outras formas que materializava do seu jeito. Afinal de contas, a sinestesia tem essa mesma faculdade, a de permitir à pessoa sentir a vida de uma maneira quase privilegiada, mas estranha ao mesmo tempo.

A sinestesia e o mundo da arte

A sinestesia não é uma doença, é conveniente deixar essa informação clara desde o começo. Ela é uma condição neurológica por meio da qual ocorre uma comunicação incomum entre os sentidos que permite ver os sons, sentir o gosto das cores ou escutar as formas… Temos assim, por exemplo, Elisabeth Sulser, a única mulher do mundo que apresenta uma combinação de todas essas características: ela vê cores ao escutar música ou qualquer som e, além disso, também sente o gosto.

Os neurologistas dizem que quando chegamos ao mundo todos somos sinestésicos, mas à medida que nossas estruturas neuronais amadurecem, todos esses sentidos vão se especializando até se diferenciarem uns dos outros.

No entanto, 4% da população conserva essas capacidades sinestésicas, e a grande maioria dessas pessoas, curiosamente, desenvolve capacidades artísticas.

A sinestesia, por exemplo, é muito comum entre os músicos e entre os pintores, com exemplos como Van Gogh, e escritores, como Vladimir Nabokov. Na verdade, esse último explicou que grande parte da sua família também tinha esse dom, mas que sempre teve a sensação de que não aproveitava essa capacidade tanto quanto deveria, principalmente porque não a entendia.

Sinestesia

Foi a mesma coisa que o próprio Vincent Van Gogh deve ter sentido. A sensação de que o mundo, aos seus olhos e aos seus ouvidos, era às vezes caótico e desconcertante, a sensação de que essa particularidade era mais uma característica da sua loucura aos olhos do mundo. No entanto, hoje em dia já sabemos que a sinestesia colocava uma lente particular nos seus olhos, a partir da qual via a realidade de uma maneira que nos dias de hoje ainda continua nos fascinando.


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