Egas Moniz e a impressionante história da lobotomia

Egas Moniz e a impressionante história da lobotomia
Gema Sánchez Cuevas

Escrito e verificado por a psicóloga Gema Sánchez Cuevas.

Última atualização: 04 abril, 2018

A lobotomia foi um dos procedimentos mais controversos na história da saúde mental. Foi “inventada” por Egas Moniz nos anos 30. Desde então começou a se popularizar em todo o mundo. Foram realizadas milhares de lobotomias até os anos 50, quando ela começou a cair em desuso por seus graves efeitos adversos.

A lobotomia é um procedimento cirúrgico baseado no corte das conexões de um ou dos dois lobos do cérebro. Deste modo, o córtex pré-frontal fica separado das demais partes do cérebro. Esta cirurgia também é conhecida pelo nome de “leucotomia”.

Egas Moniz não foi o primeiro a tentar fazer este tipo de procedimento. Em 1980 o médico Gottlieb Burkhardt realizou seis cirurgias deste estilo. Dois dos pacientes morreram, e por isso ele deteve suas pesquisas. O certo é que nos finais do século XIX e no início do século XX, a lobotomia fez diversas vítimas em todo o mundo.

“Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.
– Carl Gustav Jung –

Egas Moniz e suas questionáveis pesquisas

Em 1935 Egas Moniz, neurologista e professor da Universidade de Lisboa, iniciou sua própria “pesquisa” em torno da lobotomia. As aspas na palavra pesquisa se devem ao fato de Moniz ter feito uma cirurgia deste estilo em um chimpanzé. Como notou que o animal mostrava um comportamento mais dócil, deduziu que o procedimento era aplicável ao ser humano.

Egas Moniz

Este procedimento “pouco científico” foi questionado durante décadas. O certo é que nenhum estudo sério pode, a partir de um único caso, extrapolar as conclusões para todos os casos e todos os pacientes. É verdade que os estudos de caso único têm um grande valor para a ciência, seja em doenças raras ou para abrir campos mais amplos de pesquisa, mas suas conclusões não devem ser generalizadas.

Neste caso, existe um condição que ainda limita mais a generalização: a lobotomia é aplicada a um primata e não a um ser humano. Mesmo assim, Egas Moniz ganhou o prêmio Nobel de Medicina de 1949 por sua “invenção”.

Egas Moniz trabalhou com outro neurologista chamado Almeida Lima. Os dois fizeram as primeiras lobotomias do mundo. O procedimento consistia em abrir dois furos no crânio do paciente. Depois, era aplicada uma injeção de álcool sobre o córtex para matar esta parte do cérebro. Ele e seu companheiro eram os que avaliavam o progresso dos pacientes depois dessa intervenção. Logicamente, viam evolução em todos os casos.

Os continuadores da prática

Uma vez que Egas Moniz começou a popularizar sua invenção pela Europa, foi imitado por vários neurologistas em todo o mundo. O mais famoso deles foi Walter FreemanEste sujeito, na realidade, não era cirurgião. Mesmo assim, desenvolveu uma técnica que ficou conhecida com o nome de “lobotomia quebra-gelo”.

Esquema explicando lobotomia

Este médico norte-americano descobriu que poderia alcançar várias regiões do cérebro mais facilmente através dos olhos. Ele introduzia um instrumento similar a um fura-gelo através deles, “mexia um pouco” e pronto. Conseguia fazer lobotomias em somente 5 minutos. 

O grau de “industrialização” que Freeman alcançou com este procedimento foi tão alto que ele começou a oferecer o serviço “a domicílio”. Tinha uma van que chamava de “Lobotomóvel”. Com ela, percorreu muitas regiões dos Estados Unidos fazendo lobotomias a torto e a direito, para todo tipo de problema psicológico. Estima-se que naqueles anos foram lobotomizados entre 40 mil e 50 mil pacientes em todo o mundo.

A abolição da lobotomia

Muitos dos pacientes submetidos à lobotomia morreram. Outros sofreram danos cerebrais graves, que às vezes se manifestavam imediatamente e outras vezes anos depois. Uma boa parte ficou em estado vegetativo e outros apresentaram um retrocesso cognitivo de suas faculdades. O procedimento se mantinha porque cerca de um terço dos pacientes lobotomizados melhoravam seus sintomas.

A lobotomia não era conduzida para curar uma doença mental. Seu objetivo era apenas “acalmar” o paciente. Por isso foi aplicada com particular fúria em quem sofria de transtornos de ansiedade, distúrbios obsessivo-compulsivos e depressão com risco de suicídio. A cirurgia foi aplicada em muitos pacientes esquizofrênicos, mas estes em particular não mostravam nenhuma melhoria.

Basicamente, a lobotomia provocava um corte com o mundo, por isso os pacientes “se acalmavam”. Muitos viram nela uma esperança, pois naquela época, e ainda hoje em dia e em determinados contextos, os pacientes de doenças mentais são submetidos a uma espécie de “cadeia perpétua” dentro de manicômios e hospitais psiquiátricos. O procedimento permitia que, ao menos, muitos deles pudessem sair do confinamento.

Lobotomia

A lobotomia começou a cair em desuso nos anos cinquenta, quando foi inventado o “Thorazine”, o primeiro antipsicótico. Curiosamente, seu inventor o chamou de “lobotomia química”. Nos anos 70 o procedimento foi proibido na maioria dos países. Sabe-se que ainda é praticado clandestinamente em muitos locais. Um grupo de cidadãos vem pedindo que o prêmio Nobel de Medicina de Egas Moniz seja cancelado, por considerarem que sua conquista causou mais danos do que benefícios à humanidade.


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