A marca invisível deixada nas vítimas de maus-tratos

A marca invisível deixada nas vítimas de maus-tratos
Laura Reguera

Escrito e verificado por a psicóloga Laura Reguera.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

Muitas vezes os meios de comunicação fazem referência ao número de denúncias que aconteceram em um período de tempo ou à quantidade de vítimas de maus-tratos que morrem nas mãos de seus companheiros. No entanto, a situação envolve muito mais para quem sofre e, por outro lado, nem todos os casos estão incluídos nas cifras estatísticas (falsos positivos e falsos negativos).

Não costumam falar das surras ou dos hematomas, menos ainda das feridas que não se veem. Porque os maus-tratos não machucam apenas o corpo. Quando alguém está em uma relação de maus-tratos é normal que apareça um grande mal-estar psicológico que está ali e que precisa ser remediado, começando por dar voz às pessoas que tantas vezes foram silenciadas.

“Continua me causando surpresa que existam pessoas, seres humanos como nós, que sejam capazes de, com absoluta consciência e de maneira decidida, fazer mal de modo contínuo e sistemático. Ainda mais quando, além disso, conseguem que a vítima se transforme em um ser fraco, bastante vulnerável”.
-Maria José Rodríguez de Armenta-

O transtorno de estresse pós-traumático nas vítimas de maus-tratos

Quando falamos em estresse pós-traumático costumamos a associá-lo a desastres naturais, roubos, assassinatos, guerras ou atentados. Mas não aos maus-tratos, quando eles também podem ser explicados nesse âmbito. Na verdade, esse transtorno se caracteriza por voltar a experimentar o evento, pela ausência de tranquilidade e a tentativa infrutífera de esquecer, sintomas que se observam muitas vezes nas vítimas de violência de gênero.

O transtorno de estresse pós-traumático nessas pessoas tem características muito específicas. Por um lado, é normal voltar a sofrer os eventos traumáticos em qualquer momento, e, ainda por cima, com seu companheiro. Isso faz com que ela esteja alerta e em constante vigilância, já que quem provoca o dano é justamente quem deveria apoiar e proteger.

Por outro lado, o trauma vai destruindo o estado emocional das pessoas que sofrem pouco a pouco, já que costumam tardar anos para pedir ajuda. Na verdade, é comum continuar com o agressor para evitar uma nova agressão, por isso a vítima muitas vezes entende que não existe solução possível para a situação (desamparo aprendido, abandono).

Vítimas de maus-tratos

A síndrome da mulher maltratada

O fato de acreditar que não existe solução para aquilo que acontece com elas, ou seja, entrar em situação de desamparo aprendido, pode derivar também na síndrome da mulher maltratada. A vítima se adapta à situação que está vivendo e minimiza a dor. Mas não é só isso, também distorce a realidade, negando ou diminuindo a gravidade do problema que sofre.

Além do mais, pode mudar a forma como percebe os outros e a si mesma. Nesse sentido, pode enganar a si mesma e idealizar o agressor, se convencendo de que ele deixará de agredi-la porque está apaixonado por ela. Na verdade, pode chegar a perdoá-lo e culpar a si mesma pela situação que está vivendo, chegando a pensar que é o tratamento que merece.

Os maus-tratos e a depressão

As vítimas de maus-tratos costumam ter baixa autoestima, mas também costumam ficar isoladas, o que faz com que não obtenham apoio social nem reforço emocional positivo. Tudo isso vai debilitando ainda mais a pessoa, o que pode levá-la a cair em depressão.

Esse transtorno faz com que a vítima tenha dificuldades para tomar decisões e se concentrar, além de produzir uma deterioração no rendimento profissional e o aumento da sua insegurança. A mulher entra em um círculo vicioso em que cada vez é mais difícil sair da situação de maus-tratos.

A depressão tem outra consequência: o suicídio. Em diversos estudos observou-se que 29% das mulheres internadas em urgências hospitalares por tentativa de suicídio eram vítimas de maus-tratos. Na verdade, a probabilidade de suicídio entre mulheres maltratadas é cinco vezes maior que no resto da população.

“Esta ânsia emocional de domínio, de controle e de poder sobre a outra pessoa é a principal força que alimenta a violência doméstica entre os casais”.
-Luis Rojas Marcos-

Vítimas de maus-tratos

A ansiedade associada aos maus-tratos

Como seria de imaginar, os transtornos de ansiedade também têm uma incidência maior entre as pessoas maltratadas se comparadas com as demais mulheres. Além do transtorno de estresse pós-traumático já mencionado, também se descobriu que são maiores as fobias, a agorafobia, o transtorno de ansiedade generalizada e o transtorno obsessivo compulsivo.

Este último aparece como uma tentativa para controlar a ansiedade que aparece frente a uma situação tão imprevisível. Dessa maneira, aparecem pensamentos obsessivos sobre o agressor, como também condutas compulsivas para tentar reduzir a ansiedade que é gerada com as frases que aparecem em sua mente.

“Frente as atrocidades nós temos que tomar partido. O silêncio estimula o carrasco”.
-Elie Wiesel-

O agressor exerce o seu poder e força sobre as suas vítimas de uma forma que termina destruindo o outro, e ele atua tanto por fora quanto por dentro. A nível psicológico, os maus-tratos deixam uma marca na pessoa maltratada que tem consequências ruins, por isso é importante prestar atenção e oferecer uma saída possível para a situação em que ela se encontra.

Imagens cortesia de Chris Lawton, Tertia Van Rensburg e Rene Bohmer.


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