Modelo DISC: o que a Mulher Maravilha tem a ver com o estudo da personalidade?
No início do século passado, o Dr. William Marston criou o modelo DISC para o estudo da personalidade, definindo quatro ‘pontos cardeais’ da mesma (‘Domínio’, ‘Influência’, ‘Submissão’ e ‘Conformidade’). Mais tarde, um famoso personagem de quadrinhos seria criado com esse modelo como inspiração.
Por volta do ano 400 aC, o grego Hipócrates, fundador da medicina clássica, desenvolveu a teoria dos “quatro humores”. De acordo com esta arquitetura abstrata, os quatro fluidos presentes no corpo humano (sangue, muco, bílis amarela e bílis preto) deveriam ser equilibrados, sendo no entanto mais comum que algum deles predominasse, gerando, assim, um determinado tipo de temperamento: sanguíneo, fleumático, colérico e melancólico.
Cerca de 1500 anos depois, foi colocada à venda a edição 8 de ‘All Stars Comics‘, estrelada por uma nova heroína chamada Mulher Maravilha (uma das primeiras e, sem dúvida, a mais popular). Assinava como roteirista da edição seu criador, Charles Moulton. Mas o que esse fato tem a ver com a teoria de Hipócrates?
Um psicólogo interessado em “pessoas normais”
Fácil: Charles Moulton não era mais do que o pseudônimo sob o qual se escondia William Marston, ex-professor de psicologia e inventor do polígrafo. Marston havia concebido seu quadrinho como uma ferramenta para promover tanto uma referência feminista para as meninas da América dos anos 40, como para a “divulgação subliminar” de algumas de suas teorias psicológicas.
Essas teorias foram baseadas em seu modelo DISC, o primeiro modelo de estudo da personalidade da era moderna baseado, como o de Hipócrates, em quatro “pontos cardeais” do comportamento humano. Esses pontos de referência representavam quatro personalidades extremas que aparecem de forma combinada em todas as pessoas: as diferentes combinações possíveis definem os perfis DISC próprios de cada pessoa.
O nome do modelo vem das abreviações dessas personalidades: Dominância (D), Indução (I), Submissão (S) e Conformidade (C). Note que, em português, o mais comum é traduzir tais termos como ‘Dominância’, ‘Influência’, ‘eStabilidade’ e ‘Conformidade’. No entanto, uma vez que esta tradução pode ser problemática (pois introduz nuances negativas em dois estilos de personalidade) às vezes o S aparece como “serenidade” e o C como “cumprimento”.
O professor Marston, um homem de vida privada pouco convencional*, não se interessava muito pelo estudo da doença mental como psicólogo: seu interesse era na aplicação da psicologia fora de um ambiente puramente clínico, com as pessoas ‘normais’ como objeto de estudo. De fato, foi precisamente em um livro chamado “As emoções das Pessoas Normais” que ele detalhou o DISC pela primeira vez, em 1928.
O que significa a sigla DISC?
Qual é o significado real de cada uma das 4 siglas do DISC, e com base em que critérios essa diferenciação é estabelecida? O modelo DISC leva em conta dois eixos: como o indivíduo se percebe em relação ao meio social (superior ou inferior) e se percebe o ambiente como favorável ou antagonista. Desta forma, os quatro estilos de comportamento de acordo com Marston são os seguintes:
- Dominância. Considera-se superior ao seu entorno, o qual vê como um antagonista. Portanto, se concentra em exercer seu poder. Predomina em pessoas tenazes e firmes, que não fazem rodeios, que demonstram confiança em si mesmas e se concentram em atingir seus objetivos.
- Influência. Também se considera superior ao seu entorno, mas da perspectiva de quem o vê como favorável. Por essa razão, prefere exercer sua influência sobre os outros. Predomina em pessoas otimistas, extrovertidas e entusiasmadas.
- Conformidade. Considera-se inferior a um ambiente antagonista, por isso está comprometido a “fazer a coisa certa”. Predomina em pessoas reservadas, prudentes e analíticas.
- eStabilidade. Um perfil que visa a cooperação (e até a obediência), porque é considerado inferior ao seu ambiente, mas aceita essa inferioridade (não vê seu ambiente como um antagonista). Predomina em pessoas serenas, humildes e pacientes.
Estados e usos atuais do modelo DISC
Dado que Marston nunca patenteou (nem registrou a marca) do modelo DISC – tampouco o fez quando inventou o primeiro polígrafo – hoje existem diversas metodologias e testes baseados no mesmo, muitos deles de natureza comercial e aplicada a áreas como a de RH: conhecer o perfil comportamental de um candidato para um determinado cargo de trabalho pode ser essencial para os responsáveis pela seleção do pessoal de uma empresa.
Também tem sido amplamente utilizado por orientadores em ambientes educacionais, com o objetivo de compreender as reações e motivações dos alunos. Graças à aplicação do modelo DISC, também é possível aprofundar o autoconhecimento do nosso próprio comportamento, o que – entre outras coisas – pode nos ajudar a adaptar nossas estratégias de comunicação com os outros.
*Recentemente, foi lançado o filme “Professor Marston e as Mulheres-Maravilhas “, que aborda tanto sua vida privada quanto a relação entre os quadrinhos e seu modelo DISC.