O Rei Leão: despertando a nostalgia

Fazer um remake sempre é complicado, mas se além disso o filme envolvido estiver nas lembranças de muitos, os problemas aumentam. O Rei Leão é um clássico, a grande joia da Disney dos anos 90. Hoje, falaremos sobre a sua nova versão.
O Rei Leão: despertando a nostalgia
Leah Padalino

Escrito e verificado por Crítica de Cinema Leah Padalino.

Última atualização: 18 maio, 2023

A Disney pegou gosto por brincar com a nostalgia, fazendo remakes daqueles filmes que encantaram quem foi criança nos anos 90, na época que alguns chamam de “Renascimento da Disney”. Um público que, sem dúvida, vai às salas de cinema com o objetivo de voltar ao passado, mesmo que saia incomodado quando o remake não fica à altura do esperado. Um dos últimos longas lançados é também um dos mais amados por estes recém-adultos: o Hamlet da nossa era, O Rei Leão.

O período compreendido entre 1989 e 1999 foi glorioso para o estúdios Disney. Foi nessa década que estrearam títulos clássicos como Mulan, Tarzan, Hércules, A Bela e a Fera, A Pequena Sereia e, é claro, O Rei Leão.

A Disney havia impulsionado as suas produções, fazendo filmes de alta qualidade que até os adultos podiam apreciar. Esses longas surgiram em um momento anterior às novas tecnologias, mas com avanços suficientes para levar a magia da animação a patamares jamais alcançados.

O entretenimento das crianças vinha dessas produções. A internet ainda era uma fantasia do futuro e a experiência do cinema era absolutamente emocionante.

Entre todos esses filmes, O Rei Leão brilha com luz própria. É um longa amado por todos, ninguém é capaz de odiá-lo e só podemos nos render a ele. Este fascínio fez com que a história se transformasse em um musical que continua a lotar teatros e, como era de se esperar, os estúdios Disney decidiram fazer um remake.

Como é esta nova versão do clássico? Quais atualizações o filme antigo sofreu? Veremos a seguir.

Por que um remake?

Para responder a esta pergunta, neste caso específico, poderíamos simplesmente dizer: porque é lucrativo, muito lucrativo. No entanto, a situação pode ser considerada um pouco mais complexa.

É verdade que o público compareceu em massa às salas de cinema para assistir ao clássico da sua infância, mas também é verdade que costumamos ser muito críticos – às vezes de maneira injusta – com os remakes.

Esse caso apresenta mais uma particularidade. Enquanto em outros clássicos da Disney podemos encontrar discrepâncias entre o público que autoriza a liberdade criativa dos cineastas, há uma certa unanimidade com O Rei Leão. 

Para muitos, trata-se de um dos melhores filmes da Disney. Para outros, é o melhor longa com muita folga, e ele pode inclusive ser encontrado em listas que não incluem apenas obras de animação.

Assim, a nostalgia e a mais absoluta devoção jogam contra a liberdade criativa. Ou seja, O Rei Leão  se torna, de alguma maneira, intocável. Não há opção de modificá-lo, mudá-lo ou enfeitá-lo. Qualquer elemento adicionado – por mais bem intencionado que seja – será suscetível a críticas.

Os motivos que podem levar um estúdio a fazer um remake são muito diversos, desde contar a história a partir de outro ponto de vista até atualizar seus valores, passando por um afastamento intencional do original.

Aqui, o ponto interessante é que O Rei Leão é, por si só, um remake ou adaptação de Hamlet que, transportado para o reino animal, apresenta algo muito similar à obra de Shakespeare.

Após ver a versão de 2019, nos damos conta de que seus criadores foram muito conscientes do quanto seria difícil alterar o clássico, e permaneceram muito fiéis – até em excesso – ao original.

Nesse sentido, cabe perguntar qual era a necessidade de um remake. Era a nostalgia? Devolver aos novos adultos a sua infância? Ou talvez a única motivação tenha realmente sido financeira?

Seja como for, o filme entrega o que promete. O público foi às salas de cinema e se deixou levar pelo elemento nostálgico, muito bem apoiado pela trilha sonora que resgata temas inesquecíveis do longa original.

A obra também se transforma em um filme com uma grande qualidade visual, mas do qual provavelmente nos esqueceremos em alguns anos. Talvez fosse prescindível, não mostra nada novo, mas nós também não queríamos nada novo, e sim essa viagem prometida à mais terna infância.

Simba

A marca de Hamlet

Como já mencionamos, O Rei Leão é inspirado em Hamlet. As semelhanças são evidentes, mas foram colocadas em cena em um tom mais amável e próximo do público infantil.

Hamlet foi muito inovador em sua época, se aprofundou nos personagens e nos aspectos psicológicos, algo que rompia com a tradição. A tragédia influenciou enormemente a literatura universal, e não há dúvidas a respeito do seu papel de clássico.

O Rei Leão, além de usar esta obra como referência, tem foco nas emoções, nos sentimentos e nas motivações de seus personagens. Assim, traça uma história que, apesar de ser narrada por animais, é profundamente humana.

Shakespeare não falava apenas de vingança em Hamlet, mas da natureza humana, desenhando personagens que deram lugar a uma infinidade de análises a partir de perspectivas muito diversas.

Em O Rei Leão, conhecemos melhor Mufasa e nos aprofundamos mais na relação entre pai e filho, justificando enormemente a vingança e ganhando a empatia das crianças.

Assim, O Rei Leão não apenas se parece com Hamlet em seu enredo, mas também no próprio papel que desempenha no imaginário coletivo e nos estúdios Disney. Reúne drama, comédia, música, e nos faz testemunhas da tragédia da morte de alguém amado.

O Rei Leão traz uma visão mais profunda dos personagens, deixando de lado a visão infantil demais que caracterizava o cinema de animação e chegando, também, ao público adulto.

Simba e Zazu

O Rei Leão: a importância do nosso planeta

Embora não altere a trama original, O Rei Leão de 2019 apresenta um discurso que, apesar de estar presente nos anos 90, foi atualizado e tem um valor adicionado. Falamos da mensagem latente em todo o longa, que se torna explícita em vários personagens: o uso que fazemos dos recursos terrestres, o valor da natureza.

O ciclo da vida é a chave do filme. Mufasa explica a Simba a importância de compreender que todos os seres são fundamentais, desde os animais até as plantas. Se a avareza acabar por nos corromper e começarmos a abusar dos recursos que a terra nos dá, o ciclo se rompe e, com isso, impossibilita a vida.

Eles, como leões, poderiam ser os “fortes”, pois são os que se alimentam de outros animais herbívoros. No entanto, Mufasa destaca a importância do fato de que seus corpos, após a morte, vão alimentar a terra na qual nascem as plantas que, por sua vez, serão consumidas pelos herbívoros.

Assim, se todos contribuírem e não abusarem da sua condição, a vida será harmoniosa e possível, embora em muitos casos possa parecer injusta.

Scar é o personagem que encarna a avareza, a corrupção pelo poder e o desejo de possuir tudo. Ele não se importa que os outros animais do reino morram de fome, que as plantas não brotem mais da terra… Desta maneira, vemos como Scar contribui para a destruição do seu próprio mundo.

Esta mensagem estabelece um paralelismo claro com o nosso planeta, com a emergência climática diante da qual nos encontramos, e com os problemas que derivam de uma distribuição desigual e abusiva dos recursos.

Sem se afastar do original, recupera uma mensagem e a transporta para a nossa atualidade mais próxima, fazendo com que o público se identifique com o que vê na tela.

O Rei Leão sempre será o clássico dos clássicos da Disney e provavelmente, em alguns anos, não vamos nem nos lembrar dessa nova adaptação. Certamente não a veremos centenas de vezes, como fizemos com a primeira.

Isso não impede que a nostalgia se apodere de nós durante a exibição, fazendo-nos relembrar a nossa infância, querendo ver o original novamente e obrigando-nos a cantar as canções que, para muitos, fazem parte da trilha sonora de nossas vidas.


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