Como a personalidade de um agressor é construída?
São muitos os danos e as mortes provocadas como consequência de uma agressão. Por isso é tão importante continuar pesquisando sobre esse tema. Assim, compreender como se chega ao ponto de usar a violência em um relacionamento – ou em outros âmbitos – implica saber como a personalidade de um agressor é construída e qual pode ser sua experiência nessa relação.
Dados de pesquisas mostram que ser objeto ou testemunha de violência não faz com que necessariamente essa pessoa se torne alguém violento no futuro. No entanto, os estudos também nos dizem que grande parte dos agressores tem, sim, antecedentes de violência familiar (54%), o que justifica a intervenção psicológica.
A personalidade de um agressor começa a ser construída na infância e na adolescência
O apego remete à forma como nos vinculamos ao mundo, especialmente com as figuras afetivas. Desde pequenos, frente a qualquer ameaça, nosso sistema de apego é ativado. Ou seja, frente ao medo, buscamos a sensação de segurança que a companhia das nossas figuras de referência proporciona.
Por outro lado, se perante uma ameaça o corpo mantiver a ativação por um longo período, é provável que essa energia termine se transformando em agressividade. Aqui a violência tem a função de chamar a atenção da figura de referência para que preste assistência.
Parece que especialmente os agressores tipo borderline e os antissociais têm um apego inseguro que caracteriza sua forma de se vincular, especialmente com as figuras afetivas. Quando esse tipo de apego inseguro está unido à exposição à violência, humilhação e desapego, gera o desenvolvimento de um transtorno de personalidade e de condutas violentas.
Segundo Dutton (2003, 2007), o resultado desse conglomerado é uma “identidade difusa”. Nesses casos, a violência e o distanciamento emocional se retroalimentam em um círculo vicioso que destrói a relação.
Quais são os antecedentes dos agressores?
Como bem sabemos, as experiências com nossas figuras de referência são determinantes para a nossa personalidade. De acordo com Dutton (2003), há diferentes antecedentes em relação às experiências familiares dos agressores e às sequelas psicológicas e físicas que foram produzidas neles:
- Rejeição e humilhação: baixa autoestima, ira/raiva, culpa direcionada a fatores externos, falta de regulação afetiva… Tendem a ser violentos frequentemente e maltratar emocionalmente.
- Apego inseguro: sentem muito ciúmes, a raiva se torna profunda e querem estar no controle.
- Vítima e/ou testemunha de maus-tratos físicos: têm lembranças de padrões de violência, não têm estratégias positivas para solucionar problemas, baixa empatia por vítimas de violência… Tendem aos maus-tratos.
- Rejeição, humilhação; apego inseguro: a violência se centra nas relações íntimas.
- Rejeição, humilhação; apego inseguro; vítima e/ou testemunha de maus-tratos físicos: a integridade do ego depende da relação. Por serem controladores, maltratam e perseguem.
O medo do agressor de ser abandonado é o que provoca sua necessidade de controlar e ferir a vítima. Quando a pessoa agressora apresenta comportamentos agressivos e comportamentos de cuidado, de alguma maneira esse último traço reforça a aproximação com a vítima, criando um tipo de relação conhecida como “vínculo traumático” ou “síndrome de Estocolmo” (Graham et al., 2001; Loue, 2002).
O papel dos valores na violência
O jovem com apego inseguro desenvolve um sistema de valores correspondentes que justifica sua visão de mundo e, portanto, os seus tipos de relacionamento. Esses valores são transmitidos pela socialização, a partir da família, grupos de iguais, escolas, filmes, etc. Vivemos valores não só na microcultura em que nascemos, mas também na cultura global. Os principais valores relacionados com a violência de gênero seriam os seguintes (desenvolvidos a partir de Pence e Paymar, 1993; Paymar, 2000; Loue, 2002):
- Superioridade do homem. O mito do super-homem, o homem como provedor, tolerância com a promiscuidade do homem e o controle sobre a parceira, direito de exigir serviços domésticos por parte da parceira, etc.
- Modo de entender a violência. O mau-humor causa violência, os homens são ciumentos por natureza, quebrar coisas não é agressão, às vezes não há outras alternativas, o homem não pode mudar sua parceira se sua parceira não mudar, etc.
- Concepção da mulher. As mulheres são manipuladoras, enxergam os homens como fonte de dinheiro, as feministas odeiam os homens, gostam de ser dominadas, são tão violentas quanto os homens, etc.
6 explicações que os agressores dão para recorrer à violência doméstica
De acordo com Holma et al. (2006), há seis justificativas recorrentes que os agressores utilizam para justificar a violência. São as seguintes:
- A violência é natural.
- A violência está relacionada com certas insuficiências do agressor para lidar com situações difíceis.
- Achar que está encurralado.
- A parceira os tirou do sério.
- Perderam o controle temporariamente.
- Justificar-se por meio do seu passado traumático, acumulação de estresse, etc.
É importante ter consciência de que não se trata de ganhar uma batalha contra o agressor, mas de proteger a si mesmo. Qualquer tipo de violência diminui e deteriora. Por isso, grande parte do trabalho com vítimas de violência se concentra em somar e recuperar. Ou seja, acumular evidências e experiências que reforcem a recuperação da autoestima e da confiança no critério próprio, até alcançar a liberdade proporcionada pela sensação de controle.
Referências bibliográficas
- Navarro Góngora, J. (2015). Violencia en las relaciones intimas. Una perspectiva clínica. Barcelona: Ed. Herder.