A agressividade passiva e o ciúme: desgaste silencioso
O ciúme e a agressividade passiva geralmente andam de mãos dadas. Essas dimensões são, do ponto de vista psicológico, um tipo de emoção tão complexa quanto letal, na qual se misturam o medo do abandono, o sentimento de humilhação e, é claro, a raiva.
O fato de sentir ciúme é algo que, como sabemos, não tem idade, gênero ou cultura, e gera, por sua vez, situações tão perigosas quanto destrutivas.
Algo que chama a atenção nas obras de Shakespeare, quando nos aprofundamos nelas, é sua capacidade de retratar todo aquele caleidoscópio de emoções, traços e situações que definem o ser humano.
Assim, um de seus mais impressionantes legados ainda é Otelo, destacando acima de tudo o caráter de um dos vilões mais únicos e também mais maquiavélicos: Iago.
O servo habilidoso e malicioso de Otelo foi o responsável por levá-lo a perder a cabeça, fazendo-o acreditar que Desdêmona, sua esposa, era infiel. Iago passou a simbolizar aquela voz interior obsessiva e perniciosa que alimenta o fogo do ciúmes.
Representava perfeitamente nossa mente obsessiva e desconfiada, um eco mental que dá forma à raiz do ciúme que, aos poucos, avança persistentemente e cai no precipício da fatalidade.
William Shakespeare, de fato, considerou Iago como um de seus personagens mais decisivos: lhe dedicou cerca de 1097 linhas, quase tantas quanto Hamlet ou Ricardo III.
O ciúme é, como disse Michel de Montaigne, uma doença do espírito e o nosso pior inimigo.
O ciúme e a agressividade passiva: a voz interior que devora
O ciúme e a agressividade passiva são duas dimensões que orbitam juntas. Pessoas ciumentas não demonstram essa emoção de forma direta e aberta. Ou seja, a pessoa não se aproxima do parceiro e diz com total assertividade que se sente ofendida quando este fala com os outros, que sente raiva e humilhação quando sorri e passa tempo com outras pessoas.
Em vez disso, o que geralmente é feito é aplicar a agressividade passiva, com a qual, em vez de palavras, são utilizadas censuras, chantagens encobertas, ameaças misteriosas, desprezo contínuo, castigos indiretos nos quais se recorre ao silêncio, à indiferença…
É um tipo de agressividade que, a princípio, se mostra frio, mas às vezes pode amadurecer até se tornar uma agressividade mais ativa e, é claro, prejudicial.
Veremos mais dados a seguir.
Ciúme e o alter ego
Há um fato chamativo que o próprio William Shakespeare representou perfeitamente com os personagens de Iago e Otelo. O ciúme ressoa na pessoa como um alter ego, como uma voz exterior que se instala e nos sequestra.
Essa figura alimenta o medo de sermos abandonados e traídos. Nos injeta a desconfiança e nos alerta sobre perigos inexistentes, mentiras, coloca sinais em nossos olhos e tem certeza de ideias malucas que, de repente, se tornam razoáveis.
Um estudo realizado pelo Dr. David DeSteno, da Universidade da Califórnia indica que essa voz simboliza o “eu ameaçado”, aquela parte de nós que se sente violada e que, pouco a pouco, acaba exibindo comportamentos passivo-agressivos.
O ciúme e a agressividade passiva são um componente genético nos seres humanos?
Existem teorias que falam, de fato, de uma base genética nesse tipo de comportamento. O ciúme e a agressividade passiva compõem um tipo de lógica sombria que, de acordo com uma parte da psicologia e da antropologia, estaria em nossos genes.
De acordo com essa abordagem, o ser humano é o resultado da evolução baseada na sobrevivência e no acasalamento. A competitividade social, associada ao medo de sermos traídos e deixados sozinhos, é um tipo de alarme que ativa toda uma série de emoções e pensamentos.
A mente se torna hipervigilante, obsessiva, e dimensões como a raiva assumem o controle. Daí aparecem a agressividade comportamental e o risco evidente que esta implica.
Gerenciar e reduzir o ciúme é possível?
A chave para lidar com o ciúme passa pela compreensão de um fato muito claro: a fidelidade absoluta e duradoura não existe. Poderíamos dizer à pessoa ciumenta que amar é confiar, que querer não é possuir e que o afeto saudável deixa de lado a raiva, a necessidade de dominação e a hipervigilância.
No entanto, às vezes podemos estar diante de um comportamento baseado no ciúme patológico (CP), no qual surgem uma série de distúrbios ligados a delírios. Nessas situações, é essencial recorrer à terapia psicológica. Assim, para a questão de saber se o ciúme pode ser reduzido, cabe entender um aspecto simples: cada pessoa é única.
Podemos focar a terapia na redução de comportamentos de controle (como ver o telefone celular do parceiro), além de desativar pensamentos obsessivos e fortalecer a autoestima e a ansiedade derivadas do medo do abandono.
No entanto, é necessária, acima de tudo, a vontade clara do paciente em relação à mudança, em direção à clara conscientização de que o ciúme não é compatível com um relacionamento amoroso saudável. Tenhamos isso em mente.
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- DeSteno, D., Valdesolo, P., & Bartlett, M. Y. (2006). Jealousy and the threatened self: Getting to the heart of the green-eyed monster. Journal of Personality and Social Psychology, 91(4), 626–641. https://doi.org/10.1037/0022-3514.91.4.626
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