Amor e vício: características comportamentais
Todos nós estamos familiarizados com o amor, de uma forma ou de outra. O entendimento disso pode variar, dependendo da cultura. A neurologia do prazer está nas bases dessa experiência. Porém, ao contrário do que costumamos pensar, o amor está mais vinculado ao sistema motivacional do que às emoções (1). Sendo assim, o que o amor e o vício têm em comum?
Os comportamentos observados durante o amor e durante o vício podem ser explicados pela neuroquímica cerebral. Sendo assim, o amor está atrelado a determinadas funções do sistema nervoso central, com núcleos e neurotransmissores específicos. Eles têm como único propósito o apego aos parceiros para a reprodução e o cuidado da prole (2).
Amor e vício: comuns no cérebro
A química do amor romântico
Quando ficamos atraídos por outra pessoa, o que ocorre em nossos cérebros é um tipo de necessidade de gratificação sexual. Este processo é influenciado, obviamente, pelos hormônios (especificamente, os estrogênios e os androgênios).
Em seguida, vem o amor romântico. Ele pode ser definido como o processo de atenção por um par específico para o acasalamento. Somado a isso está a necessidade de união sentimental com o par (1). Nessa etapa, observa-se:
- Um aumento de dopamina e norepinefrina;
- Redução da serotonina.
Por último, há a etapa que relaciona o apego ao par com a finalidade de cuidar da prole. Nesta fase, ocorre uma importante união sentimental, bem como um sentimento de conforto. Essa atitude é influenciada pelos neuropeptídeos abaixo:
- Ocitocina;
- Vasopressina.
Comportamentos durante a paixão
Alguns dos comportamentos que podem ser observados durante a paixão são os seguintes:
- Dependência emocional;
- Medo de rejeição;
- Ansiedade de separação;
- Empatia;
- Reajuste de prioridades cotidianas para estar disponível para o par;
- Desejo sexual pelo par;
- Desejo de união emocional;
- Paixão;
Todos estes comportamentos podem ser explicados pela neuroquímica. Vejamos o que ocorre:
- Quando a dopamina aumenta, a atenção também o faz. Com isso, cresce a tendência de considerar a pessoa amada como única. Isso pode provocar:
- Euforia;
- Perda de sono e de apetite;
- Tremores;
- Aumento na frequência respiratória;
- Ansiedade;
- Pânico;
- Medo;
- Alterações de humor;
- Desespero caso a relação termine.
Aparentemente, todos esses comportamentos também podem ocorrer na dependência de drogas, como cocaína ou anfetaminas.
- Quando a norepinefrina aumenta, há uma fixação nas qualidades positivas da pessoa amada. Com isso, as qualidades negativas são subestimadas.
- A diminuição da serotonina gera pensamentos obsessivos com relação à pessoa que amamos. Isso também ocorre com frequência durante os transtornos obsessivos.
Comum no amor e no vício: síndrome de abstinência à cocaína e à paixão
A síndrome de abstinência ocorre por dois tipos de dependência (1):
- Dependência física: desencadeada por um estado de adaptação no organismo que causa alterações físicas, uma vez em que a administração de cocaína é interrompida;
- Dependência psíquica: causada pelos estados de satisfação e bem-estar ocorridos durante o uso de cocaína, que induz os indivíduos a repetirem o uso para manterem esses estados, ou evitar sintomas de abstinência.
Os autores Glawin & Kleber (1986) estabeleceram três fases na síndrome de abstinência por cocaína:
- Fase 1 – Crash: pode durar de nove horas a quatro dias. É um estado de grande abatimento que causa depressão, anedonia, insônia, irritabilidade, ansiedade e um desejo irresistível de usar novamente.
- Fase 2 – Abstinência: de uma a dez semanas. É iniciada a partir do 5º dia após o último consumo de cocaína. Causa anedonia, disforia, ansiedade, irritabilidade, intensas sensações de tédio e avidez.
- Fase 3 – Extinção: De duração indeterminada. O estado afetivo básico é recuperado com uma resposta anedônica normalizada.
Pode parecer estranho, mas o fato é que tanto o amor quanto o vício, ao menos em cocaína, compartilham a síndrome de abstinência . Quando terminamos um relacionamento, ocorre uma síndrome de abstinência em relação à pessoa amada.
Assim, pode-se dizer que as etapas do amor podem ser comparadas às etapas de um vício. Acontece que os nossos comportamentos durante os vícios e no amor são muito parecidos, chegando ao ponto de apresentarem as mesmas bases neuroquímicas e comportamentais. A síndrome de abstinência à cocaína é a que mais se assemelha à perda de uma pessoa amada . Sendo assim, temos embasamento científico para respaldar a hipótese de que o amor se assemelha a um vício.
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Maureira, F. (2009). Amor y adicción: comparación de las características neurales y conductuales. Revista Chilena de Neuropsicología, 4(2), 84-90.
- Fisher, H.; Aron, A.; Mashek, D.; Li, H. and Brown, L. (2002) The neural mechanisms of mate choice: a hypothesis. Neuroendocrinology Letters, 23: 92-97.
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Gawin, F. H., & Kleber, H. D. (1986). Abstinence symptomatology and psychiatric diagnosis in cocaine abusers: clinical observations. Archives of general psychiatry, 43(2), 107-113.