Beleza Oculta: enfrentando a perda de um ente querido

Beleza Oculta: enfrentando a perda de um ente querido
Leah Padalino

Escrito e verificado por Crítica de Cinema Leah Padalino.

Última atualização: 05 janeiro, 2023

Beleza Oculta  é um filme norte-americano de 2016 dirigido por David Frankel. O longa gerou muitas expectativas e contou com um elenco estrelado em que se destacam nomes como Edward Norton, Kate Winslet, Helen Mirren, Will Smith e Keira Knightley. No entanto, apesar das expectativas e da qualidade interpretativa de seus atores, as críticas foram, em geral, negativas.

De um ponto de vista cinematográfico, o filme cai no melodrama, no lamento simples e em overdose de diálogos e frases que buscam a emoção, mas que permanecem na superfície. B eleza Oculta nos traz um assunto interessante, mas cai em um sentimentalismo muito forçado que não é credível, hollywoodiano. O ambiente natalino nova-iorquino também não ajuda muito, transformando-o em um filme televisivo de final de natal para toda a família.

A proposta é atraente, influenciada, claramente, por Um Conto de Natal de Charles Dickens, e nos leva a um homem de sucesso que, após a trágica morte de sua filha de 6 anos, se vê mergulhado em uma profunda depressão. Seus colegas e amigos tentam ajudá-lo e contratam três atores para aparecer em sua vida como manifestações de três conceitos abstratos: Amor, Morte e Tempo. Uma representação da vida, uma exposição dos principais medos que enfrentamos que nos aproxima de um problema muito comum na sociedade: a depressão.

Deixando de lado a melancolia que é apresentada no filme, o enredo previsível e a falta de naturalidade evidente desde o início, a verdade é que Beleza Oculta faz de uma situação trágica uma espécie de fábula ou conto. Neste artigo, não nos concentraremos no aspecto cinematográfico, mas na própria proposta em si, nos ensinamentos que podemos retirar e na sua relação com a psicologia.

A perda em Beleza Oculta

O filme começa com um discurso motivacional feito pelo personagem de Will Smith, Howard Inlet, um empresário de grande sucesso no campo da publicidade. Em seu discurso, ele diz que há três coisas que conectam todos os seres humanos: amor, tempo e morte: “Ansiamos por amor, desejamos ter mais tempo e tememos a morte”. Momentos depois, testemunhamos um presente muito diferente, no qual Howard perdeu sua filha de seis anos e, como consequência, o amor por seu trabalho, por seus amigos e por viver. Howard já não fala, não demonstra nenhum interesse por nada e está no limite das lágrimas a todo momento.

Esta morte, além de mergulhá-lo em uma depressão que o impede de seguir com sua vida, fez com que ele se separasse de sua esposa, assim como acontece na maioria dos casamentos após a perda de um filho. Os motivos que levam um casal a se separar após a morte do filho podem ser muito diversos, mas a verdade é que é muito comum que surjam vários tipos de conflitos: que um dos membros do casal lide “melhor” do que o outro, que se culpem mutuamente, que um dos dois não consiga superar…

Cena do filme 'Beleza Oculta'

O processo de luto é uma etapa complicada e difícil para todos, especialmente se o luto é pela morte de um filho. Em algumas pessoas, este luto vai se resolvendo ao longo do tempo e de forma natural, passando por diversas fases até chegar à aceitação da situação; no entanto, para outros, pode se tornar uma estagnação, um fracasso em avançar, que resulta em algum tipo de transtorno. No caso de Howard, vemos que ele sofre de uma profunda depressão ligada a um estado de negação que o impede de falar sobre o assunto e se relacionar com os outros.

Seus amigos e colegas de trabalho estão preocupados com sua situação emocional. Não é fácil aceitar que uma pessoa que você ama e sempre viu tão cheia de vida se afunda e é incapaz de seguir em frente; mesmo assim, decidem ajudá-lo, motivados também pela situação da empresa que os afeta diretamente. Para isso, contratam um detetive que descobre que Howard está escrevendo cartas para o Amor, a Morte e o Tempo, para os conceitos de que falava positivamente no início do filme.

Como resultado, decidem contratar três atores para que apareçam diante dele como a encarnação desses conceitos. Assim, será demonstrado que sua saúde mental não é a adequada para o trabalho e, por sua vez, ele será capaz de se dar conta da situação em que está envolvido.

O contexto natalino em que se passa o filme também é importante, porque são datas em que as emoções estão à flor da pele, datas de reflexão, de fantasmas do passado como na obra de Dickens, e de lembranças daqueles que não estão mais conosco.

Cena do filme 'Beleza Oculta'

As representações e o significado da morte

Os amigos de Howard também vivenciam seu luto particular e desafio pessoal: todos eles veem seu trabalho em perigo, que é a única coisa que lhes resta. Whit acaba de se divorciar e sua filha o odeia. De alguma forma, ele também perdeu algo importante em sua vida; Claire dedicou toda a sua vida ao seu trabalho, nunca formou uma família e a preocupa em ser muito velha, que o tempo dela tenha passado; Simon descobre que tem uma doença que vai acabar matando-o, acaba de se tornar pai e não quer contar à sua família o que se passa.

Os atores que interpretam os personagens representativos (amor, tempo e morte) se conectarão profundamente com cada um desses personagens. A morte se conectará com Simon e o ajudará a aceitar seu destino; o amor o fará com Whit, que tentará voltar para sua filha, e o Tempo com Claire. Essas três histórias irão se intercalando com o enredo de Howard e seu caminho para a aceitação, que será complementada com uma terapia em grupo com pessoas na sua mesma situação.

Cena do filme 'Beleza Oculta'

A morte é o destino ao qual todos os seres vivos estão condenados, não importa quem seja na vida, não importa o quanto tenha, porque, no final, todos nós vamos morrer. Um quadro que ilustra muito bem essa idéia é Finis gloriae mundi de Juan de Valdés Leal, uma obra em que o pintor retratou vários corpos se decompondo, onde o caixão luxuoso do bispo contrasta com os caixões muito pobres no fundo, enquanto uma mão divina segura uma balança em alusão ao julgamento das almas.

Assim, Beleza Oculta nos apresenta um homem totalmente bem-sucedido que sofre a morte de sua filha. Deste modo, já de início a história nos lembra que a morte é igual para todos. Como curiosidade, o próprio Will Smith descobriu durante as filmagens que seu pai tinha pouco tempo de vida. Mais uma vez, a morte aparece para qualquer um de nós.

Para o protagonista de Beleza Oculta é impossível conceber que sua filha tenha morrido antes dele, sem ter vivido o suficiente. Mas como o filme nos propõe, o tempo é apenas uma percepção; embora possamos medi-lo, somos nós que o usamos com liberdade. Por outro lado, o amor é a força que está presente em tudo que nos rodeia, inclusive na dor.

“Muito sentida é a morte quando o pai está vivo.”
-Séneca-


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