Como o cérebro reage diante da ausência de um ente querido?

Como o cérebro reage diante da ausência de um ente querido?
Sergio De Dios González

Escrito e verificado por o psicólogo Sergio De Dios González.

Última atualização: 02 abril, 2020

A ausência de um ente querido, de alguém amado, é uma fonte de sofrimento para qualquer pessoa. Embora amar e perder alguém amado seja uma constante da vida, nunca nos resignamos completamente a isso. É como se, mesmo sabendo que nada dura para sempre, nos recusássemos a aceitar que é assim. É uma espécie de rebeldia psicológica, já que, por enquanto, a ciência não permite a real.

Muitas vezes dizemos que há uma contradição entre a razão e o coração. A mente nos diz que devemos aceitar essa ausência, mas algo mais profundo se recusa a baixar a guarda por completo e se conformar com essa perda.

“Às vezes, quando perdemos uma pessoa, o mundo inteiro parece inabitado”.
-Lamartine-

Isso ocorre porque tanto a presença quanto a ausência de um ente querido provocam reações em áreas onde temos pouco controle. No amor e na dor existem processos fisiológicos envolvidos. Existem alterações que são físicas e que excedem o que podemos entender e gerenciar. Isso é o que explica a chamada “teoria do processo oponente”.

A teoria do processo oponente

A teoria do processo oponente foi desenvolvida por Solomon e Corbit em 1974. De acordo com essa abordagem, nosso cérebro tende a buscar o equilíbrio emocional. E o caminho que escolhe para fazer isso é tentando neutralizar as emoções. Para conseguir isso, ele realiza uma operação recorrente: quando surge uma emoção intensa, que nos tira a estabilidade usual, a resposta é dar lugar à emoção oposta ou “estímulo emocional corretivo”.

Cérebro colorido mostrando conexões

De acordo com essa teoria, o estímulo de resposta é fraco no início, mas pouco a pouco vai ganhando força. A partir desses princípios se pode explicar, em parte, tanto o que acontece em um vício quanto o que acontece no cérebro após uma perda emocional.

Quando aparece a emoção inicial, esta é muito intensa. Não tem oposição e, por isso, atinge um nível máximo. É o que acontece, por exemplo, na paixão. No entanto, pouco a pouco, o estímulo oposto aparece, embora no início não seja percebido. Gradualmente, vai ganhando força para neutralizar essa emoção inicial.

O processo oponente e a ausência de um ente querido

Em termos cerebrais, a ausência de um ente querido tem efeitos semelhantes aos da síndrome de abstinência, experimentados por aqueles que são viciados em alguma substância. Em ambos os casos, há um estímulo inicial e um “estímulo corretivo”.

Tomemos o exemplo da ingestão de álcool. Quem o bebe tem uma série de reações eufóricas. Se desinibe e se “anestesia” diante de qualquer desconforto que esteja vivendo. No dia seguinte, acontece tudo ao contrário. É provável que a pessoa esteja deprimida, insegura e queira recuperar o estímulo inicial bebendo mais.

Mulher com nuvens amarradas

No caso dos sentimentos, o estímulo inicial é o próprio afeto. Há apego, necessidade dessa pessoa. Alegria ao vê-la. Nos casais, especialmente, esse estímulo emocional inicial é muito intenso. Ao mesmo tempo, aparece o estímulo oposto. É por isso que ao longo do tempo a intensidade do começo dá lugar à uma certa “neutralidade” nos sentimentos.

No entanto, se ocorre uma ausência, seja porque essa pessoa se afasta ou porque morre, ocorre uma descompensação. O estímulo inicial desaparece e fica apenas o “estímulo corretivo” que, por sua vez, se intensifica. Esse é experimentado de uma maneira muito desagradável: com tristeza, irritabilidade e todas as emoções envolvidas em um luto.

Um problema químico

Todas as emoções também ocorrem organicamente. Isso significa que para cada emoção corresponde um processo fisiológico no corpo e mudanças químicas no cérebro. Quando amamos alguém, não fazemos apenas com a alma, mas também com os elementos da tabela periódica e com como estes se manifestam no organismo.

É por isso que a ausência de alguém amado não é apenas um vazio emocional. Há muita oxitocina, dopamina e serotonina que as pessoas amadas geram. Quando não estão lá, o corpo sofre uma desordem que, em princípio, não pode ser equilibrada. É necessário tempo para que um novo processo oponente ocorra: que diante da intensa emoção negativa, surja um “estímulo corretivo” para alcançar novamente o equilíbrio.

Mão segurando borboletas

Para que pode nos servir saber tudo isso? Simplesmente para compreender que a ausência de alguém amado tem implicações profundas na mente e no corpo. Que é inevitável que, após uma perda, siga um processo de rearranjo que demore um pouco. Muitas vezes se trata apenas de permitir que esses processos ocorram. Confiar no fato de que viemos projetados para recuperar o equilíbrio.


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