Depressão existencial: muito comum em pessoas inteligentes

A depressão existencial costuma afetar pessoas muito inteligentes. São aqueles perfis que sofrem o peso da injustiça, que não encontram sentido na vida e que sofrem o isolamento porque veem e sentem o mundo de maneira diferente dos demais.
Depressão existencial: muito comum em pessoas inteligentes
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 16 fevereiro, 2022

Qual é o sentido da vida? Por que existem tantas injustiças e desigualdades? Família, trabalho, amigos… não há mais nada nesta vida, algo mais transcendente? Esses tipos de perguntas dão forma ao que é conhecido como depressão existencial. É um tipo de condição que aparece em pessoas muito reflexivas ou caracterizadas por um alto nível de inteligência.

A depressão tem muitas formas, é condicionada por infinitas variáveis ​​e cada paciente a vivencia de uma maneira particular e distinta. Assim, embora todos nós já tenhamos ouvido falar de crises existenciais, deve-se notar que essa realidade é um pouco mais complexa. Uma crise pode surgir como efeito de uma experiência adversa, inclusive ao entrar em uma nova etapa do nosso ciclo de vida.

No entanto, a depressão existencial, descrita pela primeira vez na década de 1950 pelo psiquiatra Heinz Häfner, fala de um tipo de transtorno que, embora não descrito no DSM-V (manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais), ocorre com particular frequência entre a população mais talentosa.

São aquelas pessoas que parecem não encontrar um sentido na vida. São perfis que mergulham em dimensões como a morte, a falta de liberdade, as injustiças sociais, e naquele abismo onde a existência se torna solitária e a pessoa se sente desligada de tudo que a rodeia.

Nesses estados, o próprio pensamento e as ideias obsessivas minam o equilíbrio até que o tecido emocional da pessoa se enfraqueça.

“Você é livre, e é por isso que está perdido”.
– Franz Kafka –

Depressão existencial

Depressão existencial: origem e características

Jean Paul-Sartre dizia que as pessoas não sabem o que querem e, mesmo assim, somos responsáveis ​​pelo que somos. A filosofia existencialista é sempre uma grande referência para desenrolar muitos daqueles processos mentais, reflexões e ideias pessoais nas quais navegam os pacientes que sofrem de depressão existencial.

Kazimierz Dabrowski, psiquiatra polonês do início do século 20, foi um dos que estudou os problemas que as pessoas muito inteligentes mais enfrentavam. Este especialista falou sobre o que é conhecido como “desintegração positiva”, e disse que isso explicaria, de certa forma, uma das origens dessa condição.

O problema de confrontar o que somos com o que nos rodeia

Kazimierz Dabrowski estabeleceu que as pessoas podem passar por 5 estágios de desenvolvimento pessoal. Entretanto, boa parte da população (entre 60 e 70% segundo o próprio autor) permanece na fase inicial; ou seja, no estágio de integração primária. Nessa fase, as pessoas se limitam, aos poucos, a se ajustar aos “moldes” da própria sociedade. Disciplinamo-nos, por assim dizer, e integramos as suas falhas, adaptando-nos a tudo de bom e não tão bom que o nosso meio nos proporciona.

Agora, existem pessoas q ue ficam estacionadas no terceiro nível da teoria de Dabrowski. É o que se refere à desintegração espontânea. A pessoa nota grandes discrepâncias entre os próprios valores e o que define a sociedade. O olhar da pessoa reflexiva ou com altas capacidades sente excessivamente o peso da injustiça, da falsidade, do materialismo…

Se essas dimensões têm um impacto profundo na pessoa, ela estará, portanto, na quarta fase, que Dabrowski chamou de desintegração multinível. Nela, o ser humano não encontra um significado para a vida. Aos poucos, ele se torna um mero observador que só aprecia os fracassos, as bobagens e um vazio que mais cedo ou mais tarde acaba sufocando-o.

Homem pensando na vida

As quatro dimensões que descrevem a depressão existencial

Irvin David Yalom, professor de psiquiatria da Universidade de Stanford e psicoterapeuta, é outro especialista que estudou a depressão existencial. Em seu livro Psicoterapia Existencial, ele explica os quatro fatores que costumam determinar essa realidade:

  • Perder alguém e refletir sobre o significado da morte. Isso certamente pode ser um gatilho; no entanto, por si só, não é suficiente para o diagnóstico de depressão existencial. Sofrer uma perda próxima quase sempre faz com que a pessoa muito inteligente inicie um processo de dúvida e reflexão sobre o significado da morte.
  • Falta de liberdade: este é outro elemento de grande importância. É comum que esse perfil questione por que o ser humano não possui um maior poder criativo, um maior impulso de criação e realização. Além disso, a própria sociedade sempre atua como um veto, como uma entidade controladora que corta nossas asas.
  • A falta de sentido: essa é uma dimensão da qual Viktor Frankl falou em seu livro ‘O Homem em Busca de Sentido’. Se o ser humano não encontra sentido em sua vida, aparece o vazio, a angústia e a depressão.
  • Isolamento e solidão. Não se sentir compreendido, perceber que você vê o mundo de uma forma muito diferente dos demais cria um isolamento e um grande vazio.

Que tratamento existe para a depressão existencial?

A terapia cognitivo-comportamental é, sem dúvida, uma das melhores abordagens para o tratamento da depressão existencial. No entanto, é importante não perder de vista a teoria do psiquiatra Kazimierz Dabrowski. O último estágio da sua abordagem do desenvolvimento humano é a integração positiva ou secundária.

Portanto, seria essencial que trabalhássemos essa fase que se segue ao estágio de desintegração multinível. Os aspectos que a compõem são os seguintes:

  • Trabalhar a nossa autoconsciência: esclarecer nossos objetivos, desejos, necessidades, valores…
  • Definir e trabalhar o nosso sentido de vida: colocar um propósito em nosso horizonte e trabalhar com ele nos dá impulso, nos ajuda a encontrar motivação, encorajamento e entusiasmo.
Mulher observando luzes

Por último, mas não menos importante, é recomendável que aprendamos a fazer uso de uma autoeducação emocional adequada.

Dabrowski, já no início do século XX, dizia que um bom entendimento e gerenciamento emocional é fundamental para a realização do ser humano. Não só garante o nosso bem-estar, mas nos ajuda a evoluir em todos os sentidos. Então, vamos pensar nisso; não devemos hesitar em pedir ajuda especializada caso estejamos passando pela mesma situação.


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  • Dabrowski, K. (1966). The Theory of Positive Disintegration. International Journal of Psychiatry, 2(2), 229-244.
  • Webb, J. T., Meckstroth, E. A. and Tolan, S. S. (1982). Guiding the Gifted Child: A Practical Source for Parents and Teachers. Scottsdale, AZ: Gifted Psychology Press, Inc. (formerly Ohio Psychology Press).
  • Yalom, I. D. (1980). Existential Psychotherapy. New York: Basic Books.

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