O papel dos pais nos transtornos alimentares

O papel dos pais nos transtornos alimentares
Gema Sánchez Cuevas

Revisado e aprovado por a psicóloga Gema Sánchez Cuevas.

Última atualização: 05 janeiro, 2023

Forçar a criança a comer, castigar porque ela não faz o que você manda, ficar chateado com isso… Definitivamente, essas atitudes não ajudam a entender e resolver o que está acontecendo com os seus filhos. Muitos pais não sabem como agir quando suspeitam que algum de seus filhos possa sofrer dos chamados  transtornos alimentares. Em primeiro lugar, muitos preferem ignorar, não acreditando que isso esteja acontecendo. Na verdade o papel dos pais nos transtornos alimentares é bastante complicado.

Eles pensam que esse tipo de coisa “não acontece com seus filhos”, “impossível que possam sofrer de bulimia ou anorexia”. Esse tipo de atitude não é prudente quando já existe uma suspeita fundada, já que a negação pode atrasar o diagnóstico e complicar a intervenção. Tampouco devemos culpá-los: o medo é uma emoção normal e influencia a todos de um modo ou de outro. O fato de procurarem o médico tardiamente não significa que não desejam o melhor para seus filhos.

Por outro lado, a adolescência é uma fase da vida que pode ser bastante complicada. As mudanças pelas quais os jovens passam podem originar conflitos tanto internos quanto externos, se misturando em várias ocasiões e projetando essa sensação de falta de sentido e tempo tão comuns nessa idade. Gritos, brigas, falta de entendimento, frases como “isso é besteira de adolescente” e cansaço pela instabilidade, juntamente com a pressão social que em muitos casos está presente, faz com que muitos transtornos de alimentação sejam diagnosticados tardiamente.

A dinâmica familiar e o papel dos pais nos transtornos alimentares

Existem vários estudos que analisaram a influência da dinâmica familiar – não só o papel dos pais – nos transtornos alimentares. Salvador Minuchin, por exemplo, em sua publicação “Psychosomatic families: Anorexia nervosa in context” procurou encontrar padrões comuns naquelas famílias onde se havia registrado ao menos um caso de anorexia nervosa.

Os resultados lançaram uma luz sobre as dinâmicas familiares predominantes. Alguns deles eram padrões de apego inseguro, a superproteção, a rigidez, a falta de comunicação e o envolvimento dos filhos nos conflitos familiares.

Adolescente que não escuta a sua mãe

Do mesmo modo, outro estudo realizado por Selvini, “Self-Starvation” descobriu que as famílias que tinham uma filha anoréxica apresentavam as seguintes características:

  • Problemas de comunicação, não escutando e inclusive rejeitando o que a jovem pretendia dizer.
  • Os pais não assumiam a liderança no lar e muito menos as responsabilidades.
  • Existiam carências importantes na relação entre pais e filhos.
  • A desilusão e a infelicidade da relação dos pais se escondia sob uma fachada, mas de uma maneira que as crianças percebiam e acabavam tomando parte nos problemas do casal.

Esses estudos se concentraram nos casos de anorexia; entretanto, quem sabe a informação que colocaram sobre a mesa poderia ser aplicada a outros tipos de transtornos, como a bulimia. Assim, a dinâmica familiar e o papel dos pais nos transtornos alimentares se apresentam como fatores muito importantes.

Por que os transtornos alimentares ocorrem?

Seria um erro culpar somente a família pelos transtornos alimentares que os jovens sofrem. Ainda que, como vimos, a dinâmica familiar e o papel dos pais seja bastante importante, não deixa de ser possível que os jovens também possam sofrer de algum transtorno alimentar em uma família em que não existam os condicionantes anteriormente citados.

Outro dos fatores de risco, muito comum nos jovens, é a falta de autoestima. E mais, a baixa autoestima, especialmente quando relacionada com sua a aparência corporal, pode vir a ser o fator que mais pesa no desenvolvimento do transtorno.

“Desde quando buscar a perfeição se converteu em algo que nos traz tanto sofrimento?”
-Anônimo-

Transtornos como a depressão ou transtorno bipolar podem fazer com que o adolescente utilize a alimentação como prêmio ou castigo de maneira sistêmica; compondo uma dieta muito prejudicial para seu corpo, baseada em períodos alternados de compulsão por comer e depois fortes restrições.

Adolescente solitário sentado

O papel dos pais nos transtornos alimentares pode se tornar bastante difícil, porque os adolescentes costumam se fechar em si mesmos e não se comunicar. Entretanto, repreender, castigar e não entender o que acontece com eles pode piorar ainda mais a situação. Por isso, é muito importante saber como agir nesses casos.

O grande apoio dos pais nos transtornos alimentares

Os pais podem ser um grande apoio para qualquer jovem que esteja passando por um transtorno alimentar, ainda que também possam ser o peso que complica a situação, caso não ajam da maneira correta. Os pais são  os que mais possibilidades têm de ajudar, porque são os que melhor conhecem os padrões de comportamento de seus filhos, de modo que são os mais próximos para detectar qualquer alteração que ocorra, neste caso especificamente, na alimentação. De um modo ou de outro, diante da dúvida, o melhor a fazer é procurar um profissional.

Uma vez feita a avaliação e estabelecido o diagnóstico, no caso de estarmos diante de um transtorno alimentar, os sentimentos de frustração e impotência são normais. Os pais podem sentir que não estão vendo grandes avanços, que eles são muito lentos ou que inclusive existem retrocessos. Podem até culpar seu filho, sem compreender que provavelmente quem está passando pelo pior é ele.

Por outro lado, não é raro que os pais tenham que suportar rejeições e desaforos constantemente, já que seu filho em muitas ocasiões não é receptivo às medidas tomadas para seu próprio bem-estar. Daí a importância de não só tratar juntamente com o profissional, mas também de explicar; evitar cair na tentação de tratar alguém como uma criança quando ela já não é.

Pai com filha adolescente

É de suma importância que os pais se mantenham unidos, que se apoiem mutuamente e que  expressem suas emoções . Também é importante que sigam as orientações estabelecidas pelo profissional ou então troquem de profissional caso não tenham confiança no mesmo. O proibido em qualquer caso é tentar sair da situação de maneira autônoma, já que na maioria dos casos os pais não têm o conhecimento ou os recursos necessários para fazê-lo, por mais que não lhes falte vontade e boas intenções.

Outra das pautas importantes para os pais que tenham que ajudar um filho com um transtorno alimentar é não fazer desse problema o ponto central da vida da família. É algo importante, mas não é tudo. O jovem que tem o problema é muito mais que o problema propriamente dito. É alguém com sonhos, com esperanças, com sentimentos… Não minimizar o “resto da vida” é muitas vezes o empurrão para sair dessa situação.

Uma postura contrária tampouco está nas orientações para os pais. Quando o jovem não cumpre com um dos objetivos estabelecidos, devemos abrir um diálogo e depois encerrar a situação, de maneira que não volte a se repetir. Caso seja necessário, essa conversa deve ser corretiva, mas também motivadora. Os objetivos são dois: conseguir o compromisso do adolescente e fazer com que ele saia dessa conversa motivado o suficiente para cumprir os objetivos. Não podemos permitir que ele se renda. Não existe essa opção.

Como vimos, o papel dos pais nos transtornos alimentares é de grande importância. São como uma pedra angular para o futuro de seu filho e são obrigados, pelo complicado objetivo que têm à frente, a pedir ajuda a um profissional. Primeiramente para uma avaliação, e se as suspeitas se confirmarem, para uma intervenção. Mesmo com a ajuda de um profissional este é um longo processo que requer tanto paciência quanto inteligência, amor e vontade. Dito isso, desejamos a aquelas pessoas que estejam passando por esses difíceis momentos muita força e ânimo para enfrentar essa situação.


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  • Rosman, B.L., Baker, L., Minuchin S., Psychosomatic Families: Anorexia Nervosa in Context, Harvard University Press, 1978.
  • Palazzoli, M.S., Self-starvation: From Individual to Family Therapy in the Treatment of Anorexia Nervosa, J. Aronson, 1996.

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