Pensamento reversível: a luta contra a preguiça cognitiva

Pensamento reversível: a luta contra a preguiça cognitiva
Sara Clemente

Escrito e verificado por psicóloga e jornalista Sara Clemente.

Última atualização: 29 dezembro, 2022

Quando acreditamos veementemente em alguma coisa e nos apresentam uma prova que coloca em xeque essa crença, temos duas possibilidades. A primeira, perceber que podemos estar errados, assumir que nossa opinião está errada e repensar nosso ponto de vista. Isso seria fazer uso do pensamento reversível.

Ou, a outra possibilidade existente e a qual os seres humanos costumam preferir: fazer exatamente o oposto. Apegar-nos às nossas crenças e torná-las irreversíveis. Ficar cegos frente à existência de outra realidade e manter firmemente a nossa posição. Assim é a maravilhosa complexidade e imperfeição do cérebro humano.

Por que é tão importante?

O pensamento reversível é a capacidade que as pessoas têm de raciocinar de forma bidirecional, ou seja, em um sentido e no seu oposto. Ele nos confere a capacidade de conseguir resolver problemas complexos e nos permite ver todas as posições intermediárias entre duas opiniões opostas.

É uma forma de pensar que amplia o nosso olhar e torna mais fácil vencer as dificuldades, tanto profissionais quanto pessoais. Graças a essa reversibilidade, podemos observar nossos conflitos ou nossos problemas a partir de um prisma mais amplo e tratá-los de maneira mais direta e lógica.

Na face oposta está o pensamento polarizado, que é taxativo. Ou seja, uma coisa é uma coisa ou outra. Não há meio-termo nem discussões possíveis em relação ao tema. Essa polaridade nos deixa estagnados, imóveis e paralisados.

Se conseguirmos nos situar em um dos pontos intermediários desse contínuo, vamos conseguir aproveitar o potencial do nosso pensamento reversível. Esse é o pensamento que verdadeiramente nos coloca em movimento.

Homem em dúvida

Cegos frente à evidência

Pense que você está caminhando em uma floresta, você já está andando há horas e está com muita fome. No alto de uma montanha, ao longe, você vê uma macieira. Você vai correndo até ela. O seu olhar está concentrado nas maravilhosas maçãs. Mas quando você chega lá em cima, percebe que as maçãs estão podres. Você não pode comê-las. No entanto, ao longo de todo o caminho que você percorreu havia árvores frutíferas de todos os tipos. Se você tivesse olhado ao seu redor…!

É assim que, às vezes, o cérebro humano funciona. Muitas vezes nos comportamos como burros. Olhamos apenas para frente, sem nos preocupar em virar a cabeça e olhar o que está acontecendo ao nosso redor. Nós vagamos incapazes de assimilar a contradição e de nos desprendermos das nossas crenças. Não é teimosia, algo mais voltado ao estudo dos traços de personalidade. É a submissão à irreversibilidade.

8 reações frente a evidências contrárias

Em particular, as reações possíveis quando estamos frente a uma evidência contrária às nossas crenças são 8 (Chinn y Brewer, 1933). As 3 primeiras são mais próprias do pensamento irreversível: ignorar, negar e excluir os dados. As 5 últimas são do pensamento reversível: suspender o julgamento, reinterpretar os dados, aceitá-los, fazer mudanças periféricas na teoria; e aceitar os dados e mudar as teorias.

Pensamento reversível

Por que não usamos nosso pensamento reversível?

Nosso cérebro não é tão perfeito quanto acreditamos, apesar de ser considerado um órgão minucioso, que se dedica a executar precisas análises racionais. Mas quando levantamos essa questão da reversibilidade do pensamento, nos damos conta de que não é assim.

Costumamos voltar nossos esforços a encontrar dados, evidências, hipóteses que confirmem nossas crenças. Raramente escolhemos o contrário. Se tentássemos buscar provas que colocam em xeque as nossas tendências, o cérebro as interpretaria como uma autossabotagem e tentaria tirar a ideia da nossa cabeça.

“A reversibilidade é a característica mais definida da inteligência.”
-Jean Piaget-

Basta encontrar algum indício de que temos razão para reafirmar nosso pensamento e nos conformar. Por exemplo, alguém que esteja convencido de que o tabaco não prejudica a saúde vai buscar nas duas milhões de páginas que existem na Internet a única que afirma que “fumar prolonga a vida”.

Apesar de ser uma falácia, se não tivermos pensamento reversível, nos deixaremos levar por essa frase. Das milhões de páginas que indicam o contrário e dos vários estudos que confirmam os males provocados pelo tabaco, ficaríamos com aquela que reforça a nossa crença.

Pensamento reversível

Preguiça cognitiva

Você já ouviu falar dos heurísticos? São um tipo de atalho mental que nosso cérebro utiliza para poupar energia. Ou seja, se por meio de dois caminhos se consegue o mesmo resultado, o cérebro tentará usar aquele no qual tiver que empregar o menor número de recursos.

Isso quer dizer que somos governados por um princípio de economia mental. É uma coisa incontrolável, intangível, que escapa à nossa consciência. E é uma explicação de por que nosso cérebro prefere buscar dados que validem as nossas hipóteses do que aqueles que a contradizem.

Para que o pensamento reversível ocorra, é preciso outro formal, lógico e racional. Envolve um esforço que nosso cérebro nem sempre está disposto a assumir. É mais fácil se acomodar e se conformar com uma opinião… Nosso cérebro sofre de preguiça cognitiva! É preciso desmistificar seu funcionamento e saber que ele costuma usar qualquer método para se livrar de trabalho.

Isso acontece constantemente no nosso dia a dia. Pode parecer estranho, mas ninguém está isento. Frente a um mesmo acontecimento podemos nos apegar a nossa opinião sem nos importar com o resto ou ampliar nosso olhar e prestar atenção nas controvérsias.


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