Por que preferimos a medicação em vez da terapia psicológica?

Qual o papel da medicação na intervenção psicológica? Que riscos assumimos quando a usamos? Neste artigo, vamos aprofundar nesse debate.
Por que preferimos a medicação em vez da terapia psicológica?

Última atualização: 15 julho, 2022

É inegável a necessidade de atender às demandas de saúde mental da população. Os diagnósticos e a medicação nesta área são cada vez mais importantes, e as ferramentas utilizadas para abordar a pessoa da forma mais completa e humana são importantes.

A medicação e a terapia psicológica são ferramentas básicas para os profissionais deste setor. No entanto, se não forem utilizados adequadamente, a atenção às demandas da população pode se tornar uma “solução paliativa” contra o sintoma, ao invés de realizar uma intervenção realmente eficaz contra os fatores que originaram e mantêm o problema.

A psicologia medicalizada

O medicamento atua de forma visível nos sintomas que afligem as pessoas. A medicação pode ter uma ação imediata no corpo e diminuir (ou acabar) com o desconforto.

O desconforto pode ser fonte de sofrimento nas pessoas, e isso também é transferido para a esfera da saúde mental. Transferir os fundamentos da medicina para a psicologia pode patologizar problemas psicológicos e transformá-los em entidades diagnósticas. Algo que está acontecendo atualmente com a criação de rótulos diagnósticos que transformam “os problemas da vida” em “transtornos psicológicos”.

Em outras palavras, o normal corre o risco de ser considerado patológico. Encontramos exemplos claros disso em rótulos como: “transtorno disfórico pré-menstrual”, “síndrome pós-férias”, etc. Assim, o normal é facilmente convertido em anormal e, portanto, de necessidade obrigatória de eliminação.

Lorazepam

Indivíduos com necessidades individuais

Uma intervenção ótima é aquela estabelecida com base no conhecimento clínico com outros pacientes, mas também com base nas circunstâncias pessoais da pessoa afetada. Nesse sentido, é de vital importância adequar os protocolos de atuação de acordo com cada caso, algo que a medicação no campo da saúde mental não consegue resolver sozinha. Um fenômeno que pode se refletir nas diferentes necessidades de pessoas que compartilham o mesmo diagnóstico, com o mesmo protocolo de medicação.

Com isso não queremos desprezar as contribuições da medicação na saúde mental. Em alguns casos, a farmacologia é a porta de entrada, a janela de oportunidade, para realizar intervenções que de outra forma seriam impossíveis.

No entanto, aplicar a medicação sem entender que ela, em muitos casos, só gera um estado artificial de melhora e ignorar as necessidades da pessoa traz o risco de invalidar sua experiência, podendo causar ainda mais danos do que o próprio problema.

O medicamento tem o risco de ser usado de forma genérica, dependendo do diagnóstico dado. Dessa forma, o contexto da pessoa não é considerado nem ela é dotada dos recursos necessários para enfrentar situações extremas.

Categorizar as pessoas de acordo com seus rótulos de diagnósticos em saúde mental

Existem vários fatores para os quais a medicação de certos problemas psicológicos pode ser preferida em vez de iniciar um processo psicoterapêutico. Na sociedade atual, o uso de rótulos de diagnósticos tornou-se uma tradição como se fossem categorias em que as pessoas são catalogadas e classificadas de acordo com seu problema.

O problema disso está em esquecer a pessoa como uma pessoa que sofre, dando mais atenção aos rótulos e suas características. Portanto, os sintomas tornam-se alvos a serem eliminados, avaliando a diminuição ou eliminação desses sintomas ao invés de avaliar e observar a vida e as circunstâncias da pessoa.

Homem fazendo terapia
Na terapia psicológica, o contexto da pessoa é considerado, algo que geralmente é ignorado quando a medicação é prescrita.

Quais são os fatores pelos quais a medicação é preferida na saúde mental, em vez do tratamento psicológico?

Alguns dos fatores para os quais a medicação pode ser preferida à terapia psicológica podem ser os seguintes:

  • O papel da pessoa em seu próprio processo de tratamento: a medicação proporciona à pessoa um ambiente no qual ela não precisa assumir a responsabilidade por seu processo. Ou seja, a pessoa é vista como um agente passivo no qual seguirá as recomendações a fim de eliminar seu desconforto. Ao contrário, na terapia psicológica, a pessoa deve assumir a responsabilidade por seu próprio processo e trabalhar fora das sessões para conseguir mudanças.
  • Mudanças de curto/longo prazo: Com a medicação, melhorias perceptíveis podem ser observadas em pouco tempo, ao contrário da terapia psicológica. Neste último, você precisa trabalhar constantemente. Em muitas ocasiões, as pessoas devem ser expostas a situações que geram desconforto para obter os recursos necessários para enfrentar os problemas da vida.
  • Acessibilidade aos recursos de saúde mental: em uma sociedade medicalizada, o acesso à medicação costuma ser mais fácil do que o acesso à terapia psicológica.
  • Implicações econômicas: a terapia psicológica costuma ser mais cara que a medicação. Deve-se, em grande medida, à falta de recursos e às limitações do seu acesso, já referidas no ponto anterior.

Em suma, o modelo médico em saúde mental é necessário. No entanto, se outras esferas da vida da pessoa não forem consideradas, pode-se correr o risco de negligenciar determinadas circunstâncias que não necessariamente podem ser resolvidas com medicamentos, mas sim com o fornecimento de ferramentas que auxiliem a pessoa a enfrentar as áreas de preocupação.


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