Quando acreditamos que a preocupação é positiva

A preocupação é uma estratégia disfuncional de enfrentamento que se baseia na emoção. Ela não apenas falha em resolver os problemas, mas também limita as soluções realistas. Neste artigo, vamos analisar o porquê de nos preocuparmos.
Quando acreditamos que a preocupação é positiva
Alicia Escaño Hidalgo

Escrito e verificado por a psicóloga Alicia Escaño Hidalgo.

Última atualização: 18 maio, 2023

A preocupação faz parte do nosso dia a dia por conta do ritmo frenético com que levamos nossas vidas. Internamente, sentimos uma necessidade imperativa de “dar conta de tudo”. E mais: temos que fazer isso de modo perfeito.

Essa crença, de que temos que fingir ser super-homens e supermulheres, nos leva, inevitavelmente, a nos preocuparmos com o que acontece ao nosso redor. No cerne de nossas preocupações está o objetivo de ter tudo sob controle, como se isso fosse possível.

O fato de nos preocuparmos, que nada mais é do que uma fabricação mental, dificilmente exerce alguma influência no mundo real.

Quando nos preocupamos excessivamente, nos sentimos ansiosos. Essa ansiedade nasce da nossa crença de que o controle é realmente possível. Agimos assim não apenas com as coisas que, de fato, podem ser solucionadas, mas também com ideias irreais e com coisas que fogem do nosso controle. Sendo assim, a preocupação se torna uma ferramenta que, a curto prazo, pode até amenizar nossos medos, mas que a longo prazo acaba se tornando um hábito improdutivo.

Homem chateado

Pense em todas as vezes que você já se preocupou com algum fato específico em sua vida. Ao se preocupar, você conseguiu fazer com que aquilo que te preocupava parasse de te preocupar? Será que a preocupação, de fato, ajuda a controlar a vida, os outros e até você mesmo?

Quando refletimos sobre essas questões, rapidamente nos damos conta de que a preocupação não ajuda e de que, além disso, nos coloca em um ciclo mental que não traz qualquer solução para os problemas. Entretanto, quando nos ocupamos, o que não é a mesma coisa que se preocupar, começamos a ficar centrados no problema e a pensar no que fazer com ele, e quais saídas e decisões podemos tomar a seu respeito.

A preocupação que transborda

Ainda que se preocupar seja algo natural, mais certo ainda é que muitas pessoas usam e abusam da “naturalidade” desse hábito. A psicologia apresenta, nos critérios de diagnóstico do transtorno de ansiedade generalizada (TAG), uma descrição assertiva de pessoas desse tipo.

As pessoas com TAG carregam preocupações que, no seu cerne, são iguais às das outras pessoas, porém que, na intensidade, frequência e duração, são desproporcionais.

Qualquer um de nós é capaz de ficar preocupado com a forma como nossos filhos lidam com um novo emprego, por exemplo. As pessoas com TAG, porém, fazem da preocupação uma realidade na qual vivem de acordo com ela, o que compromete as relações e a vida cotidiana.

Quando nos preocupamos se nossos filhos estão indo bem ou mal no trabalho, é provável que liguemos para eles várias vezes, na tentativa vã de termos algum controle. Isso é funcional? É certo ligar para uma pessoa que acabou de começar a trabalhar? Será que isso nos traz algum controle sobre a situação?

Ocupar-se, por outro lado, é bem diferente. É sempre possível oferecer algum conselho aos filhos sobre novos empregos, perguntar a eles, no final do dia, como se saíram e demonstrar que estamos aqui para ajudar em questões pontuais.

Repensar isso é o primeiro passo para nos tornarmos conscientes de que a preocupação não apenas não possui efeitos no mundo real, mas também compromete o fluxo normal da vida.

Por que nos preocupamos?

Nós nos preocupamos excessivamente porque nos ensinaram, desde crianças, que a preocupação é positiva. Quando não nos preocupamos, passamos a imagem de “largados, relapsos ou arrogantes”, e ninguém gosta de ser julgado dessa forma. Portanto, elegemos a preocupação como uma aliada na hora de demonstrarmos que somos “pessoas boas e, além disso, responsáveis”.

As pessoas preocupadas recorrem a esse modo de enfrentamento por pensarem das seguintes formas:

  • Que a preocupação resolve os problemas. Na verdade, como já dissemos, a preocupação compromete muito a descoberta de soluções eficazes, visto que ela nos coloca em ruminação e nos mantém assim até ficarmos completamente esgotados.
  • Que a preocupação ajuda a encontrar formas de evitar o que tememos. Na realidade, mais do que evitar o que tememos, nossos temores raramente ocorrem pois geralmente são improváveis, e não porque agimos com preocupação.
  • Que a preocupação nos motiva a realizar o que deve ser feito. Isso não é verdade, já que a preocupação nos desgasta e não nos deixa forças para dedicar à ocupação, atitude que, de fato, nos leva às soluções.
  • Que a preocupação nos prepara para o pior. Sendo que esse “pior” talvez nunca ocorra e, caso ocorra, a preocupação não é o que vai nos preparar. Na verdade, ela nos deixa ruminando sobre problemas que ainda nem existem.
  • Que a preocupação é suficiente para evitar acontecimentos negativos. A preocupação é um estado mental que, por natureza, não pode controlar a realidade. Esse tipo de raciocínio pode ser chamado de “pensamento mágico”.
  • Que a preocupação ajuda a não pensarmos sobre um assunto. Pode até ser que ela ajude a não pensar sobre certas questões, visto que não podemos pensar sobre várias coisas de uma só vez. Porém, quando nos preocupamos, continuamos pensando, de maneira disfuncional, sobre alguma coisa.
  • Que a preocupação é um traço positivo da personalidade. Aqueles que “se preocupam” se imaginam como pessoas responsáveis, bem-intencionadas ou bondosas. Quando não se preocupam, são invadidos pelo sentimento de culpa e, dessa forma, trocam uma emoção negativa por outra. Diante dessa troca, geralmente escolhem a preocupação. Porém, nenhuma dessas emoções nos ajuda a resolver qualquer coisa: a preocupação não evita o futuro negativo que imaginamos e a culpa não resolve os problemas do passado.
Mulher preocupada

Definitivamente, as pessoas que possuem preocupações que não são de risco clínico são capazes de acabar com o mal-estar uma vez que reavaliam as ameaças, sendo mais realistas ou formulando planos de ação para resolver tais problemas.

Por outro lado, pessoas que possuem TAG não conseguem parar de se preocupar e, inclusive, são capazes de se preocuparem por estar preocupadas (metapreocupação).

O tratamento psicológico, mesmo sem entrarmos em detalhes, é conduzido cognitivamente de forma a começarmos a perceber que a preocupação não tem a relevância que acreditamos que ela tenha. Em termos comportamentais, de maneira complementar, a terapia possui como objetivos: dar espaço e tempo-limite para a preocupação, deixá-la em paz sem valorizá-la excessivamente e cultivar ações que redirecionem a nossa atenção.


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  • Vallejo, P, M.A. (2016). Manual de Terapia de Conducta. Editorial Dykinson-Psicología. Tomo I.

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