Sêneca e seus conselhos para lidar com a ansiedade

Sêneca e seus conselhos para lidar com a ansiedade
Sergio De Dios González

Escrito e verificado por o psicólogo Sergio De Dios González.

Última atualização: 17 fevereiro, 2020

Ainda que pareça mentira, desde os tempos de Sêneca, um intelectual do Império Romano no começo da era cristã, já se falava de ansiedade. Claro que o sentimento não tinha esse nome, nem existia uma ciência para investigá-lo, como a psicologia faz hoje. Os filósofos daquele tempo, no entanto, costumavam ocupar seu tempo refletindo sobre os comportamentos dos seres humanos. Nesse processo, eles conseguiram criar muitas estratégias para intervir da melhor maneira possível nas situações do dia a dia, dentre elas as maneiras de lidar com a ansiedade.

Sêneca viveu em um tempo bastante difícil. Ele foi Senador da República durante um período de conflitos e decadência dentro do Império Romano. Ele presenciou os governos de Tibério, Calígula, Cláudio e Nero. Ele foi até mesmo tutor e conselheiro deste último, que é sem dúvida um dos mais odiados imperadores romanos.

Além disso, Sêneca foi também um dos principais representantes da escola filosófica dos estoicos. Os membros dessa corrente tinham um interesse especial em refletir sobre a moral e os costumes. Isso faz bastante sentido se lembrarmos que aqueles tempos foram caracterizados por uma enorme degradação ética que eventualmente acarretou na destruição do Império.

“Existe o destino, a fatalidade e o azar; o imprevisível e, por outro lado, o que já está determinado. Então, como há azar e como há destino, filosofemos.”
-Sêneca-

Sêneca e os estoicos

O estoicismo nasceu na Grécia, a partir do pensador e filósofo Zenão de Cítio. Essa corrente alcançou uma enorme popularidade e é por isso que, na época, seus princípios impactaram o cristianismo, então nascente. Os estoicos propunham sobretudo uma vida marcada pela moderação. “Nada é suficiente para quem muito é pouco”, diziam.

Pintura antiga

Os pensadores se ocuparam de uma infinidade de temas, mas seus contemporâneos se interessaram principalmente por suas apreciações sobre a ética. Eles promoveram a ideia que é possível alcançar a paz interior quando construímos uma vida longe do excesso das comodidades materiais. Sustentavam que uma vida razoável e virtuosa já era uma vida feliz.

Os estoicos rejeitavam a ideia de o homem se deixar levar pelas paixões para se feliz. Eles consideravam essa posição uma fonte de degradação e sofrimento. Propunham o desenvolvimento do autocontrole, pois consideravam que um ser humano que vive em função da razão é mais feliz. Também diziam que não há nada que seja, por si só, bom ou ruim, mas que tudo se torna nocivo quando esbarra no excesso.

E o que Sêneca disse sobre como lidar com a ansiedade?

Sêneca, como todo bom estoico, buscou viver uma vida virtuosa. Foi um homem inteligente, que sempre foi reconhecido como uma mente privilegiada por seus contemporâneos. Sua principal obra foi Cartas a Lucilio. Ele a escreveu quando havia saído do governo de Nero e estava sendo perseguido por ele.

Esse grande filósofo via como muitas pessoas viviam imersas em preocupações. É o que hoje damos o nome de ansiedade. Diante dessa observação, ele disse: “O que eu aconselho é que não seja infeliz antes da crise chegar, já que pode ser que os perigos que tanto teme nunca o alcancem, e certamente até então ainda não o alcançaram”.

Desse modo, Sêneca já dizia o que algumas correntes da psicologia certificaram tanto tempo depois: a ansiedade é o sentimento de esperar o pior sem que isso tenha acontecido. Em outras palavras, trata-se de uma percepção subjetiva que nos leva a esperar o pior. A viver em função de algo ruim que ainda não aconteceu.

Mulher sentindo ansiedade

O que podemos aprender com Sêneca

Sêneca ainda agregou outro pensamento à reflexão anterior: “Temos o hábito de exagerar, ou de imaginar ou de antecipar a dor”. Em outras palavras, começamos a sofrer antes mesmo de existir qualquer motivo para tanto. O simples fato de antecipar uma dor já nos faz ficar em companhia da mesma, ainda que ela esteja bem longe de chegar ou que nunca efetivamente chegue.

Assim é a ansiedade. Um estado de antecipação que espera, sofrendo, que um dia o sofrimento chegue. Dizem que é estar “doente do futuro”. A pessoa olha para frente e só consegue ver o pior. O ansioso teme ser roubado, ainda que ninguém esteja tentando fazer isso. Pensa que um terremoto derrubará sua casa a qualquer momento ou que o ser amado cedo ou tarde o abandonará.

Sabemos que, pelo menos com alguma frequência, conseguimos tornar realidade aquilo que tanto pensamos – são as profecias autorrealizáveis. Algumas coisas nem aconteceriam, mas com nossos comportamentos e bloqueios acabamos direcionando os fatos para uma direção, tendo influência direta nos acontecimentos. Quando isso acontece, pensamos que é uma confirmação do que acreditávamos desde o começo, mas é na verdade uma consequência das nossas ações.

Imaginemos, por exemplo, que tenhamos referências de uma pessoa, e estas não são muito boas. Se chegarmos a conhecer essa pessoa, não seria estranho se não fôssemos muito simpáticos nem receptíveis com ela. Desse modo, ao se ver tratada dessa maneira, a pessoa acaba não nos tratando muito bem como um reflexo de como nós mesmos estamos tratando-a. Assim, confirmamos nossa suspeita quando na verdade fomos nós mesmos que criamos a situação.

Talvez, como Sêneca propõe, devêssemos simplesmente viver o presente onde estamos, sem estar o tempo todo nos preparando com o que pode vir. Deixar fluir, deixar o tempo vir. Deixar os acontecimentos tomarem seu rumo. Estar no presente e não viver em função de tudo que poderá ser no futuro.


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