Sexting e grooming online: riscos da sociedade digital
Estamos em um momento de transformação digital que, por sua vez, está mudando a nossa sociedade. As chamadas tecnologias da informação e da comunicação oferecem muitos benefícios. Elas facilitam, entre outros aspectos, a difusão do conhecimento e da cultura, propiciam o desenvolvimento econômico, fomentam a criatividade, favorecem os relacionamentos sociais e geram espaços de lazer.
A rede tem sido um novo campo em que podemos explorar nossa sexualidade. Adultos, jovens e adolescentes experimentam com seu corpo e brincam com conteúdos eróticos que são enviados através das redes. A Internet permite estabelecer uma comunicação constante, disponível 24 horas por dia e praticamente a partir de qualquer lugar do mundo. Estes fatores, embora facilitem os relacionamentos, também implicam grandes riscos, especialmente para os menores. Algumas das práticas de risco mais conhecidas são o sexting e o grooming online.
A adolescência é uma etapa evolutiva em que se intensifica a busca da identidade. É um momento de experimentação com o próprio corpo e a orientação sexual. A percepção de risco normalmente é baixa, acompanhada de uma tendência para a desinibição, já que de maneira biológica, a autorregulação das emoções e a capacidade de controle de nossos atos se encontram em desenvolvimento.
A Internet é uma forma de expressão e experimentação aparentemente inofensiva para os jovens. Esta combinação de fatores pode levar a condutas de risco, especialmente se não existir uma educação sexual e afetiva que lhes permita se proteger. Trocar mensagens sexuais e explorar o próprio corpo não tem nada de negativo em si, mas se não forem tomadas as medidas adequadas, isso pode desencadear sérios problemas relacionados com a nossa intimidade, segurança ou integridade física e mental.
“Não diga na rede o que você não queria que fosse exposto em um anúncio panorâmico com o seu rosto nele”.-Erin Bury-
Riscos digitais: o que são o sexting e o grooming online?
O sexting consiste em enviar fotos, vídeos ou mensagens de conteúdo sexual através da Internet ou por meio de dispositivos móveis. Esta prática é motivada por diferentes aspectos, como por exemplo, explorar a própria identidade ou orientação sexual, participar de jogos eróticos com seu parceiro ou com pessoas diferentes ao mesmo tempo, para aumentar a autoestima ou como um meio para ousar fazer e dizer aquilo que pessoalmente não se faz por vergonha, medo ou outras limitações.
É claro, o sexting não é praticado exclusivamente entre adolescentes. A Internet é uma porta aberta a milhões de jovens e adultos que utilizam a rede para compartilhar conteúdos sexuais. Às vezes não temos consciência dos possíveis riscos. É importante estar ciente disso por dois motivos fundamentais:
- Para educar sexualmente os jovens e ensinar-lhes como usar as redes de forma segura.
- Para nós mesmos escolhermos o que queremos fazer com o nosso corpo e nossa privacidade na Internet.
Enviar fotos, vídeos ou mensagens de conteúdo sexual através da Internet ou de um dispositivo móvel é conhecido como sexting.
Por outro lado, denomina-se grooming online o processo mediante o qual um adulto realiza abusos sexuais a menores através da rede. A Internet oferece a possibilidade de ocultar a identidade pessoal, gerando perfis diferentes que não precisam coincidir com a realidade.
Uma pessoa pode se mostrar com um perfil falso e se comunicar através dele de forma simultânea com várias pessoas ao mesmo tempo. Isto é um grande risco, já que os adultos têm fácil acesso a contas de menores com quem podem ter contato sem nenhum controle. Os abusos podem ocorrer de maneira direta pessoalmente ou por vias indiretas como a Internet, solicitando conteúdos sexuais explícitos aos menores, como por exemplo fotos ou vídeos pessoais.
De acordo com um estudo mencionado em 2018 por Manuel Gámez-Guadix e Patricia de Santisteban, a probabilidade de praticar sexting aumenta progressivamente com a idade. Aos 12 anos, cerca de 3% dos menores já participaram de sexting. Aos 17 anos, a porcentagem aumenta até superar os 35%.
“No passado você era o que tinha, agora você é o que compartilha”.
-Godfried Boogaard-
Características da Internet que facilitam os abusos através da rede
Existem certos fatores que facilitam a perpetuação dos abusos sexuais através da rede. Como já comentamos, a Internet faz com que seja mais fácil se esconder da realidade e ficar por trás de uma máscara. Este anonimato permite que os adultos realizem condutas que não poderiam realizar pessoalmente em seu próprio ambiente.
Da mesma forma, a Internet tem uma magnitude incontrolável que permite múltiplas interações com várias pessoas ao mesmo tempo, ou seja, existe uma grande facilidade para ter acesso a diferentes contatos e a diversos perfis sem a necessidade de aderir às normas sociais. A rede submerge em um mundo paralelo, o mundo digital, onde a ausência de um cara a cara faz com que as regras do jogo e os limites se espalhem.
Neste sentido, a percepção do risco é reduzida e os usuários das redes cometem imprudências na hora de se relacionar, principalmente quando falamos de adolescentes. As relações começam de maneira muito mais frenética, desinibida e rápida.
Os perfis parecem não representar pessoas de carne e osso. Terminar e começar uma relação torna-se superficial, quase como uma mera transação comercial em que se troca uma ganância afetiva ou sexual. Quando os benefícios desaparecem, aparece o tédio e troca-se para o próximo perfil. A falta de contato direto parece incitar a experimentação sem medir as consequências.
Tudo isso afeta a capacidade de empatia dos abusadores. O abismo entre a rede e a realidade impede a pessoa de se colocar no lugar do outro e faz com que ela ignore o sofrimento ou a possibilidade de prejudicar os outros. Para as vítimas, ocorre uma ausência de segurança. Não há um espaço específico onde ficar, já que a rede não entende os limites de espaço-tempo, o que é compartilhado nela é gravado para sempre.
Um dos principais erros é não considerar relevantes as nossas atitudes na Internet em comparação com aquilo que fazemos pessoalmente. É muito importante tomar consciência do impacto das redes e de seus riscos, perguntarmos quem está por trás da tela, com quem estamos conversando do outro lado e que conteúdo estamos compartilhando com essa pessoa.
“A Internet se transformou no sistema nervoso das nossas sociedades, e é preciso aprender a utilizá-lo”.
-José Luis Orihuela-
Como prevenir abusos pela Internet?
No caso dos menores de idade, é muito importante que exista controle parental sobre as interações na rede e psicoeducação para um uso correto da mesma. O progresso das tecnologias é uma realidade tangível, vivemos em um mundo onde a falta de acesso à Internet não existe. Evitar essa realidade não ajudará.
É necessário aceitar que a Internet faz parte do nosso dia a dia, por isso é preciso aprender a utilizá-la de forma segura. Não adianta proibir o uso de celulares ou restringir o acesso às redes sociais se não educarmos os jovens em um uso adequado destas e transmitir valores como o respeito ou a escuta.
A educação baseada no respeito e no consentimento é o pilar fundamental de toda relação saudável. Os adolescentes devem aprender como colocar limites, como explorar sua sexualidade de forma segura, saber dizer não, respeitar os outros quando recusam uma proposta ou contato sexual. Devemos dotar-lhes de habilidades de comunicação para que possam expressar suas emoções e desejos sem prejudicar o outro, dar-lhes um espaço seguro no qual possam expressar seus medos e preocupações, além de avisá-los da realidade virtual.
Não se trata de lhes gerar medo ou inibir suas preocupações, mas de informá-los sobre os perigos da rede para que eles saibam como reconhecer uma situação de risco e como agir a respeito disso.
Se um menor nos comunica uma situação de abuso, é importante escutarmos e protegê-lo. Jamais devemos culpar a vítima pelo ocorrido, já que em uma situação de abuso houve uma pessoa exercendo seu poder e superioridade para manipular e perpetuar o processo de coerção. Devemos oferecer apoio emocional e entrar em contato com profissionais.
“Quer você decida praticar sexo sozinho ou com outra pessoa, e independentemente do tipo de prática sexual escolhida, o respeito por você e seu parceiro sexual é sempre fundamental”.
-Lara Castro-