Terapia somática: liberar e entender emoções presas em nosso corpo
A terapia somática nos ajuda a compreender e a favorecer uma harmonia correta entre corpo, mente e emoções. É uma abordagem holística que faz uso de várias estratégias terapêuticas. Assim, sua finalidade é nos ajudar a nos tornar conscientes de várias experiências somáticas, aquelas associadas a eventos traumáticos ou emoções presas.
Às vezes sentimos falta daquela íntima conjunção entre mente, corpo e emoções. Um fato notável que deve nos fazer refletir é, por exemplo, o que foi documentado pelo Dr. Bruce Perry, diretor do hospital de saúde mental infantil de Alberta, no Canadá. Esse psiquiatra, também especialista em pediatria comportamental, notou um aspecto positivo e curioso.
Todas as crianças que foram rotuladas como muito nervosas por seus professores, com mau comportamento e desempenho ruim nas aulas, mostraram um enorme progresso praticando uma série de atividades físicas pouco antes de entrarem na sala de aula. Após esses exercícios, ficaram mais relaxadas e focadas academicamente, a ponto de melhorar notavelmente no processo literário e matemático.
A verdade é que ainda não compreendemos completamente esse vínculo especial estabelecido entre o corpo, nossas emoções e até mesmo o desempenho cognitivo. Uma das figuras mais relevantes neste campo é Antonio Damásio. Assim, uma de suas teorias mais conhecidas é, sem dúvida, a do marcador somático.
Este termo vem para definir como as emoções criam o que se conhece como sensações somestésicas, um tipo de padrão fisiológico capaz de mediar nossos processos de tomada de decisão e raciocínio. É um assunto apaixonante que também integrou em suas bases abordagens como a terapia somática. Vamos ver mais dados a seguir.
“Os sentimentos são mais perigosos do que as ideias, porque não são suscetíveis à avaliação racional. Crescem em voz baixa, espalhando-se por debaixo da terra, e de repente, explodem por toda parte”.
-Brian Eno-
Objetivos da terapia somática
A terapia somática é uma abordagem psicobiológica orientada, na maioria das vezes, para tratar um trauma. Uma das premissas que alimentam as raízes dessa abordagem é que, se o corpo e a mente não forem tratados como uma unidade, é praticamente impossível facilitar uma cura completa da pessoa.
Essa técnica foi desenvolvida pelo professor Standley Keleman, de Berkeley, em 1971. Seu objetivo era “curar os nós físicos, emocionais e psicológicos derivados de conflitos, vivências e experiências não resolvidas“.
Da mesma forma, é aplicada efetivamente em problemas de ansiedade, estresse, depressão, vícios e até mesmo para favorecer uma melhor qualidade de vida em pessoas com dor crônica. Se perguntarmos agora sobre a eficácia da terapia somática, podemos dizer que temos muita documentação científica.
Estudos conduzidos pela Universidade de Jerusalém e pelo Instituto de Trauma de Los Angeles explicam que a terapia somática é uma estratégia útil no tratamento do estresse pós-traumático. Observou-se um bom progresso nos casos de pacientes que sofreram abusos na infância, e até mesmo em pessoas que foram imersas em eventos relacionados a catástrofes naturais.
Objetivos da terapia somática
Estamos diante de um tipo de abordagem psicobiológica que integra a consciência corporal ao processo psicoterapêutico.
- Baseia-se na ideia de que todo trauma, todo evento complexo, problema ou preocupação gera um impacto no sistema nervoso autônomo.
- Essas emoções complexas, longe de se dissolverem com o tempo, tornam-se somatizadas em nosso organismo. E fazem isso na forma de problemas digestivos, desequilíbrios hormonais, no sistema imunológico, em dores musculares, dores de cabeça, alergias…
- O objetivo do terapeuta é facilitar uma homeostase. Ou seja, para conseguir isso existe uma harmonia entre mente e corpo, na qual nada dói, nada obscurece nossa capacidade de nos desenvolvermos no presente sem o peso do passado.
- Nas sessões de terapia somática, são oferecidas ferramentas para que o paciente possa detectar todas as sensações que ocorrem em seu corpo.
- Além disso, a terapia somática difere da terapia cognitiva em que a intervenção vai do corpo para a mente. Descobrir e entender essas sensações internas, tanto visceral (interocepção) como musculoesqueléticas (propriocepção e cinestésica) permite ao terapeuta ir além, até as realidades emocionais.
Também cabe dizer que, nos últimos anos, a terapia somática está encontrando maior apoio científico graças aos avanços da neurociência. Estudos como o do Dr. Lauri Nummenmaa, professor de neurociência cognitiva na Universidade de Aalto, na Finlândia, estão entre os mais marcantes e reveladores.
Neste trabalho, publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America (PNAS), foi mostrado o primeiro mapa corporal das emoções humanas. Realidades internas como raiva, medo, decepção, surpresa ou inveja mostraram uma maior atividade fisiológica em uma determinada área do nosso corpo.
Como liberar e compreender as emoções presas em nosso corpo
O Dr. Peter Levine, médico biofísico e psicólogo da Universidade da Califórnia em Berkeley, é um dos expoentes da chamada terapia de experimentação somática. Sua abordagem para mediar essa liberação emocional é ser capaz de “tirá-la” primeiro do nosso corpo. Para isso, é necessário que nós mesmos sejamos conscientes dessa marca patológica contida em nosso organismo.
Os meios para conseguir isso são os seguintes:
- Técnicas de relaxamento e respiração profunda.
- Exercícios físicos como danças, movimentos, alongamentos, etc.
- Exercícios com a voz.
Cada pessoa funcionará melhor com um tipo de técnica ou outra. No entanto, o objetivo é que a pessoa se torne consciente das experiências somáticas. Cada sensação deve evocar imagens e emoções, aquelas que ajudarão o terapeuta a entender o que está acontecendo.
Para concluir, deve-se notar que este tipo de terapia não está isenta de críticas. A principal delas é de que muitas pessoas cometem o erro de adotar essa estratégia sem antes ter um diagnóstico claro. É necessário sempre descartar problemas orgânicos, doenças e alterações hormonais, como problemas de tireoide.
A terapia somática, embora útil e interessante, não apresenta a taxa de eficácia de outras com maior relevância, como a terapia cognitivo-comportamental. No entanto, não podemos ignorar seu crescimento na atualidade.
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- Brom, D., Stokar, Y., Lawi, C., Nuriel‐Porat, V., Ziv, Y., Lerner, K., & Ross, G. (2017). Somatic experiencing for posttraumatic stress disorder: a randomized controlled outcome study. Journal of traumatic stress, 30(3), 304-312.
- Nummenmaa, L., Glerean, E., Hari, R., & Hietanen, J. K. (2014). Bodily maps of emotions. Proceedings of the National Academy of Sciences, 111(2), 646-651.