The White Lotus: a que se deve o sucesso dessa série?

Sarcástica, inteligente e até operística. "The White Lotus" é uma série que não deixa ninguém indiferente, até o ponto de que é muito fácil odiar mais de um personagem. Apesar de que todos são o reflexo desses recantos mais sujos e escuros do ser humano.
The White Lotus: a que se deve o sucesso dessa série?
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 17 fevereiro, 2023

Se Agatha Christie fosse agora uma millenial viciada em séries, ela teria gostado do último sucesso da HBO. Esse em que alguns ricaços passam as férias em resorts idílicos. Muitas dessas pinceladas que a famosa escritora nos deu se juntam nessa produção televisiva. É um reflexo da própria sociedade e, claro, alguma morte trágica e inesperada sempre acontece.

É verdade, The White Lotus tem muito a ver com ópera, é uma produção que muitos adoram e que poucos não suportam devido aos seus personagens muitas vezes levados ao limite da superficialidade. No entanto, é disso que se trata a sátira, sendo um reflexo muitas vezes exagerado e desconfortável de tropos reais que todos sabemos reconhecer.

Seu roteirista, Mark White, tem uma escrita impecável e raramente dá um ponto sem linha. Ele sabe nos fazer rir e causar repulsa, fascinar e até desprezar. Pode ir de poético a hilário em apenas alguns segundos. Estamos perante uma série com inúmeros prémios Emmy e que tanto o público como a própria crítica têm exaltado.

Porém… A que se deve esse fascínio?

“Todos nós nos divertimos enquanto o mundo queima.”

-The White Lotus, segunda temporada-

cena do Lótus Branco
Em The White Lotus não há heróis nem vilões, são personagens que unem luz e sombra, daí o nosso interesse.

The White Lotus: todos nós gostamos de olhar

The White Lotus tem duas temporadas e o argumento é quase sempre o mesmo: as férias de um grupo de milionários. A primeira aconteceu em um resort havaiano. Nela, presenciamos a marca da alta sociedade branca dominada inconscientemente pelo classismo e até pelo imperialismo. Tudo isso traçou uma série de micro-histórias que terminaram em drama.

Nesta segunda temporada viajamos para a exuberante Sicília, onde a rede hoteleira também possui outro hotel de destaque. Nesta ocasião, o foco da trama está na anatomia da sexualidade e das relações afetivas em todas as suas formas. A forma como o claro-escuro dos laços humanos é abordado é tão chocante quanto engraçada ao mesmo tempo. Embora o desconforto seja o leivmotiv eterno, que nos acompanha em cada personagem, em cada história e situação.

Vidas mimadas que observamos com morbidez

The White Lotus alimenta um dos impulsos humanos mais poderosos: a curiosidade. A maioria das pessoas adora olhar para dentro da fechadura para ver como vivem os ricos. O dinheiro não apenas lhes dá poder, mas também permite que ocupem espaços inacessíveis para a maioria. Como espectadores, de repente nos tornamos espectadores de suas intimidades e dramas.

No momento em que a cortina é fechada para nós, somos testemunhas das situações e experiências mais cruas. Uma das personagens mais notáveis e paradoxais é Tanya McQuoid. Ela é uma mulher de meia-idade que herdou a fortuna do pai e carrega consigo tantos traumas quanto zeros em sua conta corrente.

Bizarra, sem noção, mimada, manipulável e trágica, ela parece ter apenas uma necessidade na vida: ser amada. Ao longo das duas temporadas a vemos cometer atos desprezíveis, tomar más decisões e ser o exemplo mais vívido de superficialidade. E apesar disso, ela se torna, de longe, um dos personagens preferidos do público.

Os ricos também choram e são infelizes

A série de Mark White responde a uma daquelas perguntas que sempre nos fazemos: como seria a vida se o dinheiro não fosse um problema? A primeira coisa que descobrimos com The White Lotus é que o dinheiro não traz felicidade, mas nos deixa com parte dos problemas habituais.

Um exemplo disso é o campo do amor. Se há uma coisa que sabemos sobre as férias, é que são um momento clássico para que surjam os problemas de relacionamento. Nesta segunda temporada, conhecemos dois jovens casais que decidiram (com relutância) compartilhar esses dias juntos no resort na Sicília.

Com esses quatro personagens revela-se, camada por camada, o peso das infelicidades, a sexualidade, a desconfiança e a complexidade moral. É importante ressaltar que nessa série todos os personagens são heróis e vilões ao mesmo tempo. Nenhum é um exemplo de virtude, mas apesar desses recantos sombrios, é fácil simpatizar (ou pelo menos entender) cada um deles.

The White Lotus nos convida à comparação social. Observamos a vida dos milionários para descobrir que compartilhamos os mesmos dramas e necessidades com eles.

cena do Lótus Branco
Embora todos os personagens de The White Lotus sejam questionáveis, todas as suas histórias nos tocam.

Personagens que, apesar de tudo, sobrevivem

Em The White Lotus, o desastre e o caos são percebidos a cada momento. Muitas vezes antecipamos términos de relacionamento que, no final, não acontecem. Vislumbramos desastres e possíveis mortes que não se concretizam. Quando a maioria dos protagonistas sai do resort, o fazem um pouco melhor do que quando chegaram. Há aprendizados e descobertas que levam em suas malas.

Além desses personagens riquíssimos, estão também os menos sortudos que tentam obter benefícios dos primeiros. Nessa segunda temporada também conhecemos duas jovens scorts, Lucía e Mia, que saem vitoriosas depois de realizarem uma sutil, mas habilidosa mentira. No entanto, aqueles que tentaram enganar Tanya McQuoid não se saíram tão bem.

Porque, como indicamos no início, Agatha Christie ficaria fascinada por essa série. Embora a maioria dos protagonistas sobrevivam e retornem às suas existências grandiosas, mas vazias, sempre há uma morte.

O drama é aquela mancha que, como na vida, turva a beleza de cada cenário idílico, lembrando-nos não apenas como as pessoas são fúteis. A própria morte também é produto do mais irônico dos acasos…


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