Transtornos fictícios: o paciente imaginário

Transtornos fictícios: o paciente imaginário
Gema Sánchez Cuevas

Escrito e verificado por a psicóloga Gema Sánchez Cuevas.

Última atualização: 05 fevereiro, 2018

A principal característica dos transtornos fictícios é a presença de sintomas físicos ou psicológicos fingidos ou produzidos intencionalmente. Esse diagnóstico pode ser alcançado por simples observação direta ou pela exclusão de outras causas, embora em muitos casos ainda seja controverso porque nunca é possível excluir 100% que o paciente não tenha realmente os sintomas.

A pessoa finge esses sintomas para assumir o papel de paciente. No entanto, não procura obter nenhum benefício. Isso o diferencia de atos de simulação. Na simulação o paciente também produz os sintomas intencionalmente, mas seu objetivo é facilmente reconhecido quando suas circunstâncias são conhecidas.

Por exemplo, a produção de sintomas intencionalmente para evitar uma audiência judicial ou, no passado, quando a apresentação era obrigatória para prestar serviço militar. Da mesma forma, um paciente hospitalizado por transtorno mental pode simular um agravamento de sua doença para evitar sua transferência para outra instituição menos desejável. Isso também seria um ato de simulação.

Por outro lado, no transtorno fictício, há uma necessidade psicológica de assumir o papel do paciente, como evidenciado pela ausência de incentivos externos.

Por definição, o diagnóstico de distúrbio fictício envolve sempre um certo grau de psicopatologia (algo não está bem na mente dessa pessoa, em outras palavras). Deve-se notar que a presença de sintomas fictícios não exclui a existência de outros sintomas físicos ou psicológicos. Como já vimos antes, em muitos casos a questão é complicada.

Mulher sentindo dores físicas

Critérios clínicos para diagnosticar um transtorno fictício

Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV) inclui os seguintes critérios para o  psicólogo  ou psiquiatra fazer o diagnóstico do transtorno fictício:

  1. Fingimento ou produção intencional de sinais ou sintomas físicos ou psicológicos.
  2. O sujeito procura assumir o papel do doente.
  3. Ausência de incentivos externos para o comportamento (por exemplo, um ganho financeiro, evitar uma responsabilidade legal ou melhorar o bem-estar físico, como no caso da simulação).

O DSM-IV também realiza a seguinte classificação de transtornos fictícios:

  • Transtornos fictícios com predominância de sinais e sintomas psicológicos. Os sintomas e os sinais que predominam no quadro clínico são psicológicos.
  • Transtornos fictícios com predominância de sinais e sintomas físicos. Os sinais e sintomas que predominam no quadro clínico são os físicos.
  • Transtornos fictícios com sinais e sintomas psicológicos e físicos. Existe uma combinação de sinais e sintomas psicológicos e físicos que não prevalecem um sobre o outro no quadro clínico.

Transtorno fictício

Como dissemos, a característica essencial desse transtorno é a produção intencional de sinais ou sintomas físicos ou psicológicos. Estes sintomas podem ser inventados (por exemplo, quando o paciente se queixa de dor no abdômen sem estar sofrendo desse mal de verdade) ou falsificados (por exemplo, no caso de abcessos produzidas por injeção de saliva sob a pele).

A sintomatologia também pode ser um exagero ou exacerbação de um distúrbio físico pré-existente (por exemplo, a simulação de delírios quando há histórico de transtorno psicótico). Além disso, a sintomatologia pode ser uma combinação ou variação de todas as anteriores.

Mulher se consultando com médica

Quais são as características das pessoas com transtorno fictício?

As pessoas com esse transtorno geralmente explicam sua história com encenação e um ar excessivamente dramático. No entanto, se forem solicitados mais detalhes, suas respostas serão vagas e inconsistentes. Essas pessoas tendem a se deixar levar por uma tendência a mentir que escapa ao seu controle. Suas mentiras são patológicas. Essas mentiras chamam a atenção do entrevistador e se referem a qualquer aspecto de sua história ou sintomas.

Muitas vezes essas pessoas têm um amplo conhecimento sobre terminologia médica e o trabalho realizado em hospitais. Suas queixas geralmente incluem problemas como a  dor  e a exigência de analgésicos. Quando o médico explora seu desconforto físico e o resultado é negativo, eles começam a reclamar sobre outros problemas físicos e criam mais sintomas fictícios.

As pessoas com transtorno fictício estão muitas vezes sujeitas a múltiplas explorações e intervenções cirúrgicas. Por outro lado, quando elas estão no hospital, geralmente não recebem muitas visitas.

Às vezes, é possível surpreender a pessoa no momento em que seus sintomas fictícios ocorrem. Quando elas percebem que foram pegas mentindo, negam ou saem rapidamente do hospital, mesmo contra a recomendação médica. Frequentemente, são admitidas em outro hospital nesse mesmo dia.

Homem durante consulta médica

Transtornos fictícios com predominância de sinais e sintomas psicológicos

Este subtipo de transtorno fictício é um quadro clínico em que os sinais e sintomas psicológicos predominam. Os principais sintomas consistem na produção intencional ou fingimento de sintomas psicológicos, sugestivos de doença mental. O objetivo aparente do indivíduo é assumir o papel de “paciente”. Por outro lado, não é algo compreensível à luz de suas circunstâncias ambientais (ao contrário do que acontece na simulação).

O transtorno é muitas vezes reconhecido por uma ampla gama de sintomas que muitas vezes não correspondem a um padrão sintomático típico. Estes sintomas têm um curso clínico e uma resposta terapêutica incomum. Eles pioram quando a pessoa está ciente de que é observada. Este tipo de paciente geralmente se queixa de depressão e ideias suicidas devido à morte do cônjuge (que não é confirmada por familiares), perda de memória, alucinações ou delírios, sintomas de transtorno de estresse pós-traumático e sintomas dissociativos.

Pelo contrário, também pode ser que sejam pessoas extremamente negativas e pouco cooperativas com a entrevista do médico. Os sintomas psicológicos revelam, em geral, o conceito de que o paciente tem uma doença mental e, portanto, não pode coincidir com nenhuma das categorias de diagnóstico conhecidas.

Transtornos fictícios com predominância de sinais e sintomas físicos

Este tipo consiste em um quadro clínico em que predominam os sinais e sintomas de uma doença física aparente. Problemas clínicos comuns que são simulados ou provocadas são as infecções (por exemplo, os abcessos), dificuldade na cicatrização de feridas, dor, hipoglicemia, anemia, sangramento, erupção cutânea, sintomas neurológicos, vômitos, diarreia, febre de origem desconhecida e sintomas de distúrbios autoimunes ou do tecido conjuntivo.

A forma mais grave e crônica deste distúrbio foi denominada “síndrome de Münchausen”. A síndrome de Münchausen consiste em repetida hospitalização, peregrinação (viagens) e pseudologia fantástica. Todos os sistemas orgânicos são alvos potenciais e a apresentação dos sintomas é limitada apenas pelo conhecimento médico, sofisticação e imaginação do indivíduo.

Transtornos fictícios com uma combinação de sinais e sintomas psicológicos e físicos

Este subtipo consiste em um quadro clínico em que aparece uma combinação de sinais e sintomas psicológicos e físicos, mas nenhum deles predomina sobre o outro. A forma mais grave e crônica deste distúrbio é chamada de “síndrome de Münchausen“, à qual nos referimos anteriormente, mas com a combinação dos sintomas acima mencionada.

Qual é o curso e evolução do transtorno fictício?

O curso do transtorno fictício são episódios intermitentes. Menos comum é um único episódio ou doença crônica que não melhora. O início da doença ocorre nos primeiros anos da vida adulta. Frequentemente coincide com uma hospitalização por uma doença física identificável ou transtorno mental.

Na forma crônica do transtorno, as hospitalizações sucessivas são quase transformadas em um estilo de vida. 

Referências bibliográficas:

  • American Psychiatry Association (2002). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-4), 4º Ed. Madrid: Editorial Médica Panamericana.

Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.