Tratamento orientado por fase para transtornos dissociativos

Hoje queremos mostrar como podemos ajudar as pessoas que foram profundamente feridas por traumas e experimentam a dissociação.
Tratamento orientado por fase para transtornos dissociativos
Gorka Jiménez Pajares

Escrito e verificado por o psicólogo Gorka Jiménez Pajares.

Última atualização: 11 janeiro, 2023

Nossa memória é muito vulnerável a traumas (amnésia dissociativa). Você pode ter ouvido falar de pessoas que chegaram longe de casa, sem nenhuma lembrança de onde queriam ir ou de onde vieram ( fuga dissociativa ). Estes são exemplos de transtornos dissociativos. Como o leitor poderá intuir, são entidades clínicas cuja intervenção é complexa e por isso vamos apresentar neste artigo o tratamento orientado por fases.

Todos podem dissociar. Na verdade, dissociar é normal. Esse ato nos protege de eventos que são psicologicamente ameaçadores. Você já se sentiu “desconectado” diante de uma situação que superou sua capacidade de enfrentamento? Se sua resposta for sim, provavelmente você se dissociou.

A fronteira que separa essas experiências “normais” das patológicas chama-se “tempo e repercussão”. Quando as experiências dissociativas prevalecem ao longo do tempo e deterioram a saúde da pessoa, então podemos avaliar a existência de um quadro clínico.

paciente em terapia

Tratamento orientado por fase

Imagine que você pega um cristal e o joga no chão. Agora olhe para o vidro quebrado em pedaços; com as memórias, algo semelhante ocorre na dissociação. O impacto de um trauma psicológico pode dividir parte da psique -separar, criar diferentes partes, produzir rupturas-.

Um dos elementos importantes da metáfora é que a mente da pessoa impede que ela consiga juntar as peças, protegendo assim sua saúde mental (se pudesse juntá-las, sentiria uma dor profunda por dentro).

A pesquisa disponível até o momento ressalta que os pacientes pioram sem tratamento em que o terapeuta reconheça e trabalhe com cada parte dissociada. Portanto, o primeiro passo em qualquer intervenção deve ser a estabilização dos sintomas do paciente. Feito isso, você pode avançar no processo de “união” das partes que foram ligadas ao trauma e separadas.

1. Estabilização do paciente

O objetivo desta primeira fase é fortalecer e estabilizar o paciente. É uma fase que visa que o paciente consiga regular as suas emoções e as suas relações interpessoais. Fundamentalmente, trata-se de promover o autocuidado, a conexão com o corpo e a compreensão dos sintomas.

Lembremo-nos do vidro quebrado no chão, dificilmente podemos juntá-lo e consertá-lo sem primeiro juntar os pedaços. Antes de usar qualquer cola devemos arrumar as peças, colocá-las sobre uma superfície lisa e ver como se encaixam.

Nesta fase é aconselhável conter as memórias traumáticas do paciente para evitar a sua reativação, pois a pessoa ainda carece de ferramentas que lhe permitam fazê-lo. O primeiro passo para isso é criar as condições para que o paciente se lembre com certeza.

A pessoa que se encontra nesta fase tem fobia de sua vivência interna e das partes dissociadas, razão pela qual a construção da memória provavelmente será um processo progressivo, com o que poderíamos chamar de pontos de lucidez.

“Como regra geral, a parte ou partes da pessoa que funcionam na vida cotidiana serão responsáveis, e não o terapeuta, por cuidar das partes do bebê.”

-Fonseca-

2. Processamento do Trauma: Integrando Memórias Traumáticas

Nesta fase, o objetivo é processar as emoções, pensamentos e sensações corporais que foram ligadas ao trauma. Isto é conseguido pela re-experiência de situações traumáticas e pela verbalização das emoções intensas sentidas pelo paciente. O exercício é mais do que uma liberação emocional, porque envolve a elaboração e integração da experiência.

“Isso implica uma lembrança, para processar e curar.”

-Fonseca-

O objetivo é confrontar, trabalhar e integrar memórias traumáticas. Esta fase carrega um perigo: o paciente tem fobia de suas memórias traumáticas e revivê-las pode levar a um novo trauma, por isso é essencial avançar na exploração; abordagens especializadas como a EMDR ou a psicoterapia sensorimotora são utilizadas para este fim.

transtornos dissociativos
A terapia EMDR é endossada pela comunidade científica para tratar traumas.

3. Integração da personalidade e reabilitação

Às vezes é impossível passar da primeira fase, quanto mais chegar à última. O objetivo aqui é organizar uma identidade o mais estável e unida possível. Nesta fase, é provável que o paciente tenha fobia das implicações de levar uma vida cotidiana.

“Na melhor das hipóteses, as partes dissociadas serão coerentes.”

-Fonseca-

A terceira é uma fase de luto. Luto pelas perdas passadas, presentes e futuras. É fundamental que o paciente aprenda a correr os riscos de levar uma vida normal, o que pode reativar memórias relacionadas ao trauma. Se isso ocorrer, é recomendável revisar com o terapeuta as tarefas realizadas nas fases anteriores.

Recomenda-se intervir individualmente com pessoas que sofrem de dissociação. A terapia pode durar anos, pode durar até a vida inteira do paciente. Nestes casos, a validação e a relação terapêutica tornam-se especialmente relevantes.


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