A verdadeira história da chapeuzinho vermelho

A verdadeira história da chapeuzinho vermelho
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 13 abril, 2023

A maioria dos contos que nos foram deixados pelos irmãos Grimm e Charles Perrault foram escritos a partir dessas lendas e tradições locais que percorreram os povos de toda a Europa durante a Idade Média. Entre eles está o da Chapeuzinho Vermelho.

Muitos destes contos refletem a psicologia da época, suas crenças, mitos… todos eles por vezes enraizados em testemunhos que, inevitavelmente, estavam saturados de um certo “realismo mágico”. Um dos mais antigos e talvez mais impressionantes é encontrado na história da “Chapeuzinho Vermelho”.

De acordo com os especialistas essa história é uma das que mais se transformou em relação ao conto original; essas mudanças foram feitas com o intuito de “adoçar” algumas imagens para que o público infantil as absorvesse com facilidade.

A história da Chapeuzinho Vermelho sofreu várias modificações ao longo do tempo, deixando para trás o que, na realidade, se pretendia transmitir para nós.

Mas o fato é que a cada mudança a intenção original ia se perdendo, porque cada conto continha uma doutrina, um ensinamento que todos nós tínhamos que seguir. E o que a Chapeuzinho Vermelho ensinava vale a pena levar em consideração…

Charles Perrault e os irmãos Grimm

Charles Perrault foi o primeiro a coletar a história da Chapeuzinho Vermelho em 1697. Ele a incluiu em sua coleção de contos populares, ciente de que esse conto era um dos mais desconhecidos para a população europeia.

Chapeuzinho Vermelho.

Essa história teve origem no norte dos Alpes e também apresentava algumas imagens grosseiras demais, que foram alteradas devido à necessidade de fazer o enredo chegar de forma segura às crianças. Foi a primeira vez que a história desta jovem de capuz vermelho chegou à Europa.

Em 1812 os Irmãos Grimm também decidiram incluí-la em suas coleções. Para isso eles se basearam na obra do alemão Ludwig Tieck intitulada “Vida e morte da pequena Chapeuzinho Vermelho” (Leben und Tod des kleinen Rotkäppchen), nela estava incluído o personagem do caçador – ao contrário do conto de Perrault.

A história da Chapeuzinho Vermelho não chegou até nós na sua forma original, pois muitos elementos foram suprimidos por serem inadequados para o público infantil.

Todos os vestígios de elementos eróticos e sangrentos foram removidos, e a história recebeu um final feliz. Porque, o que seria de uma história infantil sem o final feliz clássico? Como você já pode imaginar, a história original é muito diferente da que as crianças leem nos livros; vamos conhecê-la agora.

A história da verdadeira Chapeuzinho Vermelho

Como já dissemos antes, essa história tem origem em uma região isolada dos Alpes. O objetivo da história é nos alertar, apontar que existem coisas proibidas para nós como raça humana, como uma comunidade e como um grupo. Na lenda temos como protagonista uma adolescente, uma jovem que acaba de entrar no mundo adulto; por isso a capa vermelha, símbolo da menstruação.

Chapeuzinho vermelho com sua capa.

Esta jovem recebe uma ordem de sua família: ela deve atravessar uma floresta para levar pão e leite para sua avó. Como você pode ver, até agora as variações em relação à história original não são muitas, mas devemos interpretar cada gesto e cada imagem.

A floresta é o perigo, uma zona de risco para os jovens e que funciona como uma provação, como o rito de passagem de uma comunidade para demonstrar que seus filhos já passaram para o mundo dos adultos.

O principal risco dessa floresta é a figura do lobo. Este animal simboliza a selvageria e o irracional. Algo que a nossa Chapeuzinho Vermelho já conhece e que precisa enfrentar. A jovem consegue atravessar a floresta e entra feliz na casa da avó, que a recebe na cama porque está doente. Tudo muito parecido com o conto clássico, sem dúvida. Mas aí vem as mudanças…

A avó manda a jovem guardar o leite e o pão e comer a carne que está na cozinha preparada para ela. Chapeuzinho Vermelho concorda e a devora faminta, ficando saciada para em seguida obedecer à ordem seguinte da velhinha: ela deve tirar a roupa peça por peça e queimá-la no fogo, para logo se deitar ao lado dela na cama.

A história da Chapeuzinho Vermelho é extremamente rica em simbolismo

A jovem, solícita, concorda sem hesitar, sem pensar na estranheza da situação. Mas justo no momento em que ela está prestes a se deitar, descobre que é o lobo quem a recebe a gargalhadas, dizendo que a carne que ela comeu é da avó. Ele cometeu um grande pecado, o canibalismo. Em seguida o lobo devora a jovem Chapeuzinho Vermelho.

 

O simbolismo está implícito em cada personagem, o lobo é o mundo sexual e violento. A velha é comida por uma jovem, renovando assim o velho pelo novo, ao mesmo tempo em que o novo é apresentado como inocente e ingênuo ao cometer um dos maiores sacrilégios da humanidade: o canibalismo. Como você pode ver, uma das histórias mais clássicas e queridas da nossa infância na verdade contém um lado muito sombrio.

Moral de Perrault em Chapeuzinho Vermelho

Como já dissemos, a versão do Chapeuzinho Vermelho de Charles Perrault não é a primeira. As origens são mais antigas. Existe até um poema belga que conta a história de uma garota com uma capa vermelha que encontra um lobo.

No entanto, este autor decidiu remover os elementos mais cruéis das versões originais (como o canibalismo), com o objetivo de dar uma lição de moral às jovens. Nesse caso, Perrault quis punir Chapeuzinho Vermelho por falar com estranhos, sendo o Lobo da floresta a representação deles.

Em quase todas as suas histórias ele deixa uma moral muito explícita e, para a de Chapeuzinho Vermelho, escreveu o seguinte:

“Vemos aqui que as adolescentes e jovenzinhas mais elegantes, bem feitas e bonitas erram em ouvir certas pessoas, e que não devemos nos surpreender com o fato de que tantas são devoradas pelo lobo. Eu digo o lobo, porque estes animais não são todos iguais: existem aqueles com um excelente carácter e humor afável, doce e complacente, que sem barulho, sem fel ou irritação perseguem as donzelas, vindo atrás delas para a casa e até o quarto. Quem discorda que lobos tão melosos são os mais perigosos?”

Com essa passagem, fica evidente a lição moral que ele queria deixar para as jovens que se relacionam com estranhos, enfatizando o caráter sexual desses encontros. É pertinente mencionar que Perrault é também autor de outras histórias famosas como “O pequeno polegar”, “Cinderela” ou “A bela adormecida”.


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