O ciúme, a desvalorização e a descrença: como se relacionam?

O ciúme não é saudável; é uma dinâmica que pode prejudicar o relacionamento amoroso, abrindo caminho para a desvalorização e a descrença.
O ciúme, a desvalorização e a descrença: como se relacionam?

Última atualização: 29 julho, 2022

Ao contrário da inveja, que envolve duas pessoas, o ciúme ocorre em uma dinâmica triangular em que a segunda pessoa envolvida acredita que a primeira forma um vínculo com uma terceira (real ou imaginária). Essa situação às vezes desencadeia os “instintos mais selvagens” da segunda pessoa.

Em um relacionamento, a menos que ela tenha a certeza de que seu parceiro é infiel, a pessoa ciumenta é dominada por um sentimento de desvalorização. Ela desconfia, não se sente segura e tem medo de ser abandonada. Ela também sente raiva, que encobre a angústia e a tristeza. Na verdade, não é uma situação real que a faz sofrer, mas sim o que ela imagina. Concretamente, são suas ruminações mentais, ideias que a perseguem, que a afetam.

Os problemas relacionados ao ciúme são um dos principais motivos para consultar um psicólogo. Embora o motivo pelo qual muitos pacientes recorrem à terapia seja diferente, muitas vezes o ciúme está presente, piorando a situação.

Uma pessoa ciumenta acaba tendo várias ideias sobre como seu parceiro pode traí-la. Sua riqueza imaginativa é tanta que, para justificar seu ciúme excessivo, ele conta a si mesma histórias que são verdadeiros planos de infidelidade.

Todas as recriminações contêm uma ideia floreada sobre as atividades que o cônjuge poderia desenvolver na infidelidade fantasiada:

  • “Você se atrasou porque com certeza ficou conversando com a sua cliente.”
  • “O que você estava fazendo tão tarde no trabalho?”
  • “Desde quando você se interessa tanto pelo vizinho?”
Mulher ciumenta

Os amantes também sustentam um casamento

A terceira pessoa desta tríade nem sempre causa a destruição da relação. Às vezes, ela até consegue sustentá-la. Diante da instabilidade da relação, o amante descomprime o relacionamento e a crise do casal fica momentaneamente desfocada.

No entanto, esta não é uma solução. O amante nem sempre é um ser de carne e osso; ele pode ser o trabalho, as festas, os esportes, a televisão, os encontros com amigos, os hobbies, os estudos, etc.

Pode-se compilar uma coleção de histórias de ciúme, mas o mecanismo da tríade envolve essencialmente um cônjuge desconfiado do seu parceiro devido à existência de um amante que pode ser uma pessoa real.

A primeira pessoa, por esta aliança, torna-se o objeto de desejo e valor da segunda. A segunda é aquela que se desvaloriza. Se existem pessoas valorizadas (a primeira e a terceira), elas existem enquanto houver uma desvalorizada (a segunda), que é dominada por vários sentimentos, incluindo impotência, rejeição, difamação e agressão.

O ciúme se baseia na desvalorização. Uma pessoa ciumenta tem baixa autoestima. Uma pessoa que se ama e se sente bem consigo mesma não tem motivo para fantasiar que seu parceiro pode traí-la.

É possível que o marido seja muito sedutor com outras mulheres, dedique muito tempo a seus hobbies e à prática de esportes, etc. É possível que a mulher flerte com outros homens, saia muito ou dedique muito tempo ao trabalho. Nesses casos muito específicos, existem boas razões para suspeitar de infidelidade.

Uma pessoa com uma autoestima saudável não acredita que seu parceiro possa valorizar outra. Na verdade, ela acredita que o relacionamento deles é a melhor coisa que pode acontecer com ela e que ambos não precisam procurar outra coisa fora da relação. Não se trata de negar, mas de valorizar. São conceitos e mecanismos muito diferentes.

Em suma, neste dinamismo interacional, a segunda pessoa fantasia que a primeira está com uma terceira. Isso significa que ela valoriza, ama, deseja, e leva a primeira em consideração. Significa também que ela se inferioriza na relação. A partir daí, nascem sentimentos de desvalorização e insegurança que gradualmente minam sua autoestima.

A pessoa que sofre de ciúme é incrédula

As tentativas de resolver o problema reforçam o quadro. Quanto mais a primeira pessoa tenta convencer a segunda de que está errada em suas avaliações, menos crível ela se torna. A segunda, incrédula e cheia de raiva, não tem dúvidas de que a primeira tem algo com uma terceira. Ela, portanto, não quer ser convencida pela primeira.

A primeira cobrirá a segunda de elogios para tentar valorizá-la. Mas essas palavras não são confiáveis ​​para a segunda. Dessa forma, ela confunde o resto do sistema.

Os becos das pessoas ciumentas

O mecanismo do ciúme tende a criar becos e não fornecer respostas. Observamos profecias autorrealizáveis: as hipóteses da pessoa ciumenta tornam-se realidade.

  • Se a primeira pessoa diz que estas acusações não são verdadeiras e rejeita as acusações da segunda pessoa, esta última dirá a si mesma que a primeira está mentindo.
  • Se a primeira não responder, a segunda pensará que ela não disse nada porque está escondendo algo.
  • E se a primeira responder com uma carícia ou dizendo eu te amo, será suspeita de sedução e evasão.

Em suma, qualquer que seja a resposta da primeira, ela apenas confirmará a hipótese inicial da segunda. Não há resposta certa. Nada terá credibilidade para a pessoa que sofre de ciúme.

Uma esposa ciumenta e insegura fantasia que o marido olha para a nova secretária. Ela começa a ligar para ele no escritório com insistência e a controlar obsessivamente seus horários. Chegar em casa quinze minutos a mais que o normal pode desencadear uma crise no relacionamento com alegações e acusações de infidelidade.

Esta situação se repete com o tempo. Ele se sente tão oprimido em seu relacionamento que começa a procurar algo melhor fora dele. Ele chega em casa cada vez mais tarde, passa muito tempo no trabalho, sai com seus amigos cada vez mais para beber e planeja um jantar com seus antigos colegas de faculdade.

Este tempo longe de casa é um terreno fértil para as fantasias da sua esposa, que agora confirma sua certeza de que o marido a está traindo. Ela se transformou em uma “bruxa” hostil que o desvaloriza e o faz se sentir um tolo. Isso porque um dos recursos da pessoa prejudicada e desvalorizada é desvalorizar a outra da mesma forma.

Casal em crise

Ciúme, brigas e violência

O ciúme leva a discussões e confrontos. Os parceiros acreditam estar tentando se encontrar através da comunicação, mas não estão. Então, o grito aparece na forma de um paradoxo; fisicamente eles estão muito próximos, mas internamente estão muito distantes, tão distantes que precisam gritar um com o outro para se comunicarem.

Apesar de seus esforços, eles continuam a dar ordens e a estabelecer expectativas que o outro não pode cumprir, acumulando frustrações para ambos. E nesse confronto patológico, a distância só aumenta.

É assim que o casal navega entre rivalidades e conflitos, ciúme e projeções, racionalizações e contaminações, entre ideais e decepções, entre carências e necessidades. Com esse fardo, os parceiros, que se encontram no meio de uma batalha campal, ficam exaustos e tensos.

Quando a violência se faz presente no relacionamento

A violência pode atingir a relação quando, por exemplo, as palavras em uma discussão falham e um dos interlocutores mergulha na mais aguda frustração. Ele pode, então, tentar dominar a situação usando a força física.

Uma vez que a violência verbal e física ocorre, o agressor se sente culpado. A vítima o perdoa e há um período de aparente calma. No entanto, em algum momento, um novo círculo de violência estourará. O agressor recorre às “mãos” com cada vez mais facilidade.

Vamos dar um exemplo: com todas as advertências que sofre, o marido continua tentando se afastar passando cada vez mais horas no trabalho. Isso faz com que sua esposa coloque mais pressão sobre ele. Trata-se de um círculo vicioso que se concretizou. Ambos os cônjuges se tornaram dois “coitadinhos” desvalorizados.

Certa manhã, ele chega ao trabalho e um colega diz: “Bom dia, como você está elegante hoje!” Seus olhos se iluminam e corações são desenhados no ar, como desenhos animados. Alguém o notou, e sem desqualificá-lo! Isso pode ser o início de uma infidelidade real originada de uma fantasia. Trata-se de uma profecia autorrealizável.

O ciúme é um insulto à confiança e um elogio à mentira. Em casais funcionais, a comunicação fluida implica mostrar suas vulnerabilidades pessoais, sem culpar o outro por suas próprias fraquezas.

No entanto, também envolve valorizar a si mesmo, além do parceiro. É sobre se ver nos olhos do outro e ver o olhar do outro sobre si mesmo. É valorizar para ser valorizado.

“O ciúme sempre é o instrumento que destrói a liberdade interior e elimina toda a felicidade possível na relação.”
-Gregorio Marañón-


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