Como nosso primeiro amor afetou o cérebro
As primeiras experiências da infância e adolescência são vividas com especial intensidade. Tanto que às vezes, como adultos, gostaríamos de viver uma determinada experiência novamente pela primeira vez. Todos nós podemos lembrar, por exemplo, como um determinado livro, um determinado filme ou série, um determinado grupo musical e, claro, certas pessoas nos marcaram.
Muitos de nós vivemos nosso primeiro amor com uma mistura de fogos de artifício e espinhos em nossos corações. Foi algo emocionante e melancólico ao mesmo tempo, porque apesar de vivermos aqueles momentos com especial efusividade, éramos péssimos novatos nesses assuntos. E com certeza, houve alguma decepção, uma lágrima ocasional e, claro, um aprendizado valioso.
Além disso, quando vemos adolescentes sofrerem com aquelas primeiras paixões, é comum dizer-lhes que “não se preocupe, você tem muito pelo que viver, isso não é nada”. Fazemos com a autoridade de quem acredita ter vivido tudo, e não hesita em aconselhar.
No entanto, a ciência nos diz que essas primeiras decepções no amor são as piores, as mais dolorosas. Elas são porque a mente jovem ainda não tem nenhuma referência experiencial com a qual comparar a dor daquele coração partido. E ela vive isso como o fim do mundo, como a pior das tragédias.
Não podemos subestimar ou infantilizar esses primeiros sofrimentos afetivos dos adolescentes. Porque esses primeiros fragmentos na arte do amor nos marcarão de muitas maneiras.
Os sentimentos que experimentamos com nosso primeiro amor criam um modelo cerebral de como abordaremos os relacionamentos futuros.
Nosso primeiro amor e desenvolvimento cerebral
O que é amor para você? Pense bem, mas quando o fizer, há um aspecto que estará presente. A forma como entendemos as relações de casal também se alimenta da nossa experiência com aquele que foi o nosso primeiro amor. Não importa se essa experiência foi orquestrada por desejos não realizados, decepções ou pela própria imaturidade da idade.
Faz parte do nosso registro mental e cerebral aquela pessoa que ativou em nós a maquinaria do desejo, da ternura, do fascínio e da paixão. Desta forma, um estudo da Universidade do Sudoeste da China destaca um aspecto importante. A neurobiologia do amor é tremendamente complexa, pois são ativados desde as redes de recompensa e dopamina, até a amígdala, o núcleo accumbens e o córtex pré-frontal.
Essa tempestade neuroquímica pode ser muito intensa, turbulenta e caótica. Na verdade, figuras como a antropóloga Helen Fisher nos lembram que o amor é como um vício. Tudo isso deve nos fazer entender o que significa aquela primeira experiência em um adolescente cujo cérebro ainda está em pleno desenvolvimento. O primeiro amor imprime não apenas uma memória permanente, mas os alicerces de como entenderemos os relacionamentos a partir daquele momento…
Quando temos 14, 15 ou 16 anos, nossos primeiros amores são vividos intensamente. Eles são os primeiros, e nossas vidas dificilmente têm outras responsabilidades além de experimentar, aprender, sentir… Isso significa que essas histórias deixam uma marca permanente em nós.
Os primeiros amores servem de padrão para o amor posterior (e o seguinte)
A forma como vivemos nossas relações afetivas e nos relacionamos com os outros tem como referência três cenários. A primeira tem a ver com a nossa família e os modelos que temos visto em nossa casa. A maneira como nossos pais se tratavam e ofereciam afeto configura aquela primeira visão do que deveria ser o (suposto) amor.
Da mesma forma, não podemos ignorar o apego e a forma como nossos cuidadores se vinculam a nós. Um apego seguro, por exemplo, nos permite construir relacionamentos mais positivos, autônomos e satisfatórios. A estes dois quadros acrescenta-se um terceiro e é o nosso primeiro amor. Essa primeira paixão cria uma base para relacionamentos subseqüentes.
Nessa experiência se configurará o que esperamos encontrar em um próximo casal e também o que não devemos aceitar. Aos poucos, e com o tempo, vamos construindo uma experiência afetiva na qual, gostemos ou não, o primeiro amor atua como alicerce. Embora visto em perspectiva esteja sem dúvida muito longe, aquela estrutura ainda está lá, latente dentro de nós…
A memória emocional é mais intensa durante as duas primeiras décadas de vida
A Universidade de Harvard realizou um estudo sobre o desenvolvimento cognitivo humano. Neste trabalho foi possível definir quando atingimos nossos limites máximos de processamento de memória, atenção, reflexão, etc.
Entre os dados fornecidos, destaca-se um dos mais especiais. A memória emocional atinge seu pico máximo de funcionamento entre os 15 e os 26 anos. Ou seja, tudo o que vivemos naquele período nos marca profundamente; Para o bem ou para o mal.
Isso significa, por exemplo, que determinados cenários, filmes ou mesmo algumas pessoas nos fazem lembrar intensamente aquelas experiências passadas, impregnadas de tantas emoções borbulhantes, emocionantes e até nostálgicas. Nosso primeiro amor atua como aquela âncora de nossa memória emocional, à qual é muito fácil retornar quando menos esperamos.
Existem amores trágicos e até obsessivos que às vezes nos impedem de virar a página por muitos motivos.
E se nos apegarmos às memórias de ontem?
Em geral, as pessoas são nostálgicas. A mente gosta de mergulhar com frequência em nosso passado e navegar por esse oceano habitado por boas lembranças e acontecimentos, às vezes nem tão felizes. Pensamos no que poderia ter sido e não foi. Divagamos sobre o que deveríamos ter feito e não fizemos.
Dessa forma, lembrar de vez em quando do nosso primeiro amor ainda é algo positivo. Permite-nos ver-nos em toda a nossa inocência para vislumbrar uma versão mais inocente, luminosa e confiante de nós próprios. Também nos ajuda a tomar consciência de tudo o que aprendemos.
Porém, não nos convém nos apegar excessivamente a esse baú do passado. É possível, sem dúvida, que esta experiência não tenha sido muito emocionante e que as seguintes também não tenham sido muito gratificantes. Seja como for, não podemos ficar presos aos sofrimentos de ontem, a vida acontece agora e o amor sempre valerá a pena. Vamos nos abrir para novas oportunidades.
Para concluir, embora seja verdade que Albert Einstein disse uma vez que o amor não pode ser explicado em termos de física e química, a verdade é que a neurociência e a psicologia sempre nos permitem entender um pouco do mistério. E esse é outro tipo de magia pela qual também somos gratos.
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