Complexo de Heróstrato: especialistas na arte da aparência

Quanto mais aparências, mais excesso de carências. É isso que se esconde por trás do chamado complexo de Heróstrato, fenômeno cada vez mais comum que esconde, na verdade, uma personalidade desprovida de autoestima que se esforça para parecer o que não é.
Complexo de Heróstrato: especialistas na arte da aparência
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 02 dezembro, 2021

Todos somos testemunhas do complexo de Heróstrato. Nós o vemos nas pessoas que fazem da arte da aparência seu estilo de vida, em um claro exibicionismo social. São também os buscadores de likes nas redes sociais, personalidades que fazem da aparição uma máscara sofisticada para esconder seu complexo de inferioridade.

Alguns dizem que, nesta nova era da cultura da tecnologia, nos tornamos um pouco mais vaidosos. Muitos de nós, porque não, gostam de exibir algum aspecto da vida na linha do tempo do Facebook ou nos stories do Instagram. Fazê-lo de vez em quando não tem nada demais, mas precisar desse like e dessa aprovação constante no dia a dia, sem dúvida, leva a realidades patológicas mais preocupantes.

Agora, o complexo de Heróstrato não habita apenas o universo cibernético. Vemos isso, por exemplo, na postura daquele conhecido que monopoliza a comunicação de um grupo, também no colega ‘fantasma’ do escritório que se esforça para aparecer como vencedor, e em inúmeras pessoas (e personagens) que habitam, com seu culto obsessivo de si mesmo, a paisagem social.

Quem vive para fingir não acaba apenas formando uma existência vazia e infeliz. Além do anedótico, há um detalhe que não podemos ignorar: ao perseguir a notoriedade, o herostratismo pode levar muitas pessoas a manter comportamentos muito prejudiciais e exaustivos.

“Se a fama só vem após a morte, não tenho pressa em obtê-la.”
-Marco Aurélio-

Complexo de Heróstrato

Complexo de Heróstrato, o homem que destruiu uma das sete maravilhas para ficar famoso

Os historiadores dizem que, na noite de 21 de julho de 365 a.C, ocorreu um evento infeliz que entraria para a história. O protagonista desse ato foi Heróstrato, um jovem pastor de Éfeso. Mesmo quando criança, ele tinha a obsessão cega de que havia sido escolhido pelos deuses para fazer algo notável, algo que o tornaria famoso.

Sua aspiração era se tornar um sacerdote de Ártemis. No entanto, por não ter um pai reconhecido, essa aspiração lhe foi negada. Obcecado pelo propósito de ser famoso, ele teve uma ideia, um plano que empreendeu na noite de 21 de julho. Ele foi ao templo de Ártemis, uma das 7 maravilhas do mundo e, após beijar a estátua da deusa, colocou fogo em toda a construção. 

Depois desse desastre, Artaxerxes, rei da Pérsia, torturou-o para entender o motivo que o levou a cometer tal ofensa. Heróstrato, então, declarou seu propósito: entrar para a história como o homem que queimara o belo templo de Ártemis. Ao ouvir isso, o monarca o condenou ao ostracismo e proibiu, sob pena de morte, o registro do nome do homem e a sua ligação com a destruição do templo.

No entanto, essa ordem foi inútil. O historiador grego Teopompo analisou o incêndio e registrou o nome Heróstrato, de forma que hoje temos ciência desse fato. Além disso, no campo da psicologia, essa figura foi escolhida para nomear o complexo de Heróstrato, e assim definir aquelas pessoas capazes de fazer quase tudo para se sobressair, para ganhar fama e reconhecimento.

Tudo pela fama e o reconhecimento

A busca pela notoriedade, a baixa autoestima e atos criminosos

Alfred Adler, um renomado terapeuta austríaco do início do século 20, conduziu um estudo muito interessante explicando o que pode levar a um sentimento latente de inferioridade. Boa parte desses perfis tende a apresentar o mesmo padrão que, de alguma forma, já podia ser visto no próprio Heróstrato de Éfeso.

Essas pessoas tendem a traçar um projeto de vida repleto de idealismos difíceis de concretizar. Eles também apresentam um desejo exacerbado de se destacar, projetando até mesmo uma atitude de desprezo para com todos ao seu redor. Em muitos casos, por desejarem desesperadamente ser o centro das atenções e não conseguirem, acabam acumulando muita hostilidade. 

Algo assim pode ser altamente perigoso. Sabe-se que, em certos casos, essas pessoas atingidas pelo complexo de Heróstrato podem cometer atos criminosos. O próprio Heróstrato fez isso em 21 de julho de 365 a.C, queimando o templo de Ártemis. David Chapman fez o mesmo em 8 de dezembro de 1980, matando John Lennon. Também temos John Hinckley que, em 30 de março de 1981, atacou Ronald Reagan.

A busca pela notoriedade e a baixa autoestima

A rejeição interna que leva à violência

Todos esses personagens apresentavam comportamentos claramente patológicos na busca pela notoriedade. Eles não hesitaram em atacar figuras icônicas para, assim, adquirir um lugar na história. E eles conseguiram.  Não podemos, portanto, banalizar ou tomar como anedótico o comportamento de quem vive apenas pelas aparências, de quem tem a necessidade constante de ser o centro das atenções e idealizar a si mesmo, menosprezando os outros.

Toda aparência é um reflexo de carências graves. São personalidades frustradas que rejeitam quem são e procuram se agarrar a uma imagem inventada, difícil de reafirmar para o público. Como nem sempre atingem esse objetivo, podem recorrer a atos mais extremos, como prejudicar profissionalmente os outros, espalhar boatos e contornar inescrupulosamente a linha entre o que é ético e moral e o que não é.

O complexo de Heróstrato não apenas limita nosso potencial de ser feliz, mas, em muitos casos, pode levar os humanos a mostrar seu lado mais sombrio. Vamos manter isso em mente.


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