Como conseguir aceitar a morte?

Como conseguir aceitar a morte?

Última atualização: 14 julho, 2017

É paradoxal que seja tão difícil aceitar o fato mais certo da vida: a morte. É uma verdade absoluta que todos iremos morrer algum dia. Nada escapa a esse destino e, ainda assim, passamos boa parte da vida tentando ignorá-lo ou evitá-lo. Há quem afaste até mesmo os pensamentos ou conversas que tenham a ver com a morte.

Nem sempre foi assim. No Antigo Egito, por exemplo, a morte era um tema cotidiano. Os faraós e nobres, e até mesmo os escravos, dedicavam boa parte de suas vidas ao preparo da morte. Era comum que os homens de poder desenhassem suas tumbas com bastante luxo e antecipação. É isso mesmo: não se acreditava que a vida terminava com a morte física.

“Durma com a lembrança da morte e levante-se com o pensamento de que a vida é curta”.
– Provérbio –

Além disso, os antigos romanos possuíam um costume muito expressivo. Quando os grandes generais obtinham uma vitória militar, entravam na cidade e eram aplaudidos por todos. Porém, atrás deles, era preciso ter um escravo repetindo a frase em seu ouvido “Memento mori”. Seu significado é “Lembre-se de que irá morrer”. Não queriam prejudicar o momento, mas relembrar que nenhum triunfo é tão grande que fique acima da morte.

A morte como desejo e como finalidade

A Idade Média foi a época do obscurantismo religioso, ao menos no Ocidente. O mundo era visto como uma criação de Deus e tudo o que ocorria possuía um significado dentro da lógica divina. A morte era o passo que permitia o encontro com Deus. A vida física era somente uma espécie de introdução para essa existência definitiva.

Plantas crescendo em braço

Um dos textos mais representativos da época é o poema “Vivo sem viver em mim”, de Santa Teresa de Ávila. A primeira estrofe diz “Vivo sem viver em mim/e tão alta vida espero/Que morro por não morrer”. Reflete-se a ideia da morte como desejo. Entretanto, persiste a impossibilidade de crer que exista um fim para a vida humana.

Como quer que seja, o certo é que a morte era uma realidade totalmente assumida. Aceitava-se como um fato sobre o qual era necessário falar. Um fato ao qual se outorgava uma explicação simbólica e para o qual o ser humano devia se preparar.

A morte e a modernidade

A ciência tem sido a criadora de grandes desilusões para a imaginação, uma vez que tem postulado verdades que ainda hoje persistem. A modernidade traz consigo um novo florescimento da ciência. Leonardo da Vinci, que esteve presente no início dessa época, atreveu-se a fazer autópsias. Com ele, começava-se a rachar o halo sagrado que gravitava sobre a morte.

Leonardo da Vinci

Vieram os grandes médicos e cientistas que se lançaram em uma luta frontal com a morte, e o tema se converteu também em um assunto ligado à ciência. Assim, um propósito dos novos estudos era prolongar a vida, que agora era vista como um bem supremo. Revelou-se também que o ser humano era um mamífero evoluído e em quem também imperavam as leis da biologia.

Pela primeira vez, um grupo de pensadores desacreditou a existência de um Deus, assim como a possibilidade de que existisse algo além da vida física. Surgiram correntes de pensamento que assim se expressavam, mas que também proporcionavam uma enorme frustração frente à vida. O niilismo e o existencialismo são alguns exemplos. Quem aderia a essas formas de pensar possuía uma atitude que se dividia entre a desilusão e a crítica.

Encarar a morte na atualidade

A Revolução Industrial trouxe consigo uma produção em série que parecia sem limites. Proclamou-se o fim da história e se produziu uma revolução tecnológica sem precedentes. Pouco a pouco entramos no mundo do efêmero, do descartável, dos ciclos de vida curtos, que terminam de qualquer jeito para voltar a começar.

A ideia da morte foi se dissolvendo. Começaram a desaparecer as inquietudes do homem comum. O tempo da reflexão foi quase totalmente substituído pelo tempo do trabalho e pelo ritmo dos acontecimentos, que permitem apenas pensar em como organizar a hora seguinte. É como se a morte tivesse sido transformada em uma surpresa catastrófica, que sempre interfere na realidade de maneira inesperada.

Olho em preto e branco

A negação da morte é tão intensa que muitos se negam a viver o luto quando esse ocorre. Tentam “sair disso” rapidamente. Voltar à rotina o quanto antes. Voltar às preocupações de sempre. Fingir que é uma realidade alheia, ou, em qualquer caso, distante.

E de que serve pensar na morte e aceitá-la como um fato inevitável? Muitos se perguntam isso. A resposta está nas depressões, ansiedades ou intolerâncias que se instalam como um cisto, sem se saber o porquê. Talvez aceitar o nada, a morte, seja um caminho excepcional para aprender a viver a vida. Talvez, caso desenvolva-se a consciência de que tudo termina, razões únicas também apareçam para dar sentido a este dia, o único que temos.

Imagens cortesia Three Sisters, Eris Carslon


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