Demência pugilística: a síndrome do boxeador

Existe algum tipo de demência associado ao esporte? A resposta é sim, e o caso mais importante é o da demência pugilística.
Demência pugilística: a síndrome do boxeador
Francisco Roballo

Escrito e verificado por o psicólogo Francisco Roballo.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

A demência pugilística é um distúrbio neurodegenerativo que ganhou uma relevância especial por suas características associadas. O seu outro nome, “síndrome do boxeador”, nos dá uma pista sobre a sua etiologia.

A palavra de raiz latina pugil refere-se ao boxe, que, em muitos casos, é a causa da doença devido aos repetidos golpes recebidos.

Receber a quantidade de golpes na cabeça que um boxeador ou um atleta que pratica esportes de contato recebe ao longo de sua carreira não é fácil. Assim, não é tão difícil imaginar as repercussões que os golpes podem ter no cérebro das pessoas afetadas.

A demência pugilística é uma doença causada por vários politraumatismos e concussões que resultam em uma atrofia cortical do cérebro. 

A demência que assola o cérebro

Características gerais da demência pugilística

Esse tipo de demência foi descrito clinicamente pela primeira vez em 1928 pelo patologista e legista Harrison Martland.

Atualmente, é considerada uma variante da encefalopatia traumática crônica, embora a princípio uma não fosse diferenciada da outra.

A distinção entre as duas ficou evidente quando os pesquisadores perceberam que os sintomas da demência pugilística foram encontrados em outras populações.

Uma doença silenciosa

A popularidade do boxe no início do século XX fez com que muitos profissionais e fãs se voltassem para o esporte. No início, os resultados não eram tão óbvios, mas com o passar dos anos, os casos de pessoas afetadas aumentaram muito.

Os principais sintomas eram a apatia, características psicóticas, perda de coordenação e deterioração intelectual global acentuada. Os cientistas foram claros: essas mudanças estavam associadas a repetidas microlesões do cérebro, resultado das concussões.

O desenvolvimento da demência pugilística

A atrofia do córtex cerebral resulta em uma redução geral no peso e no metabolismo do cérebro. Normalmente, todas as estruturas cerebrais acabam sendo afetadas, prejudicando a sua funcionalidade geral.

No entanto, esta doença ocorre em fases, de forma progressiva, e os sintomas variam:

  • Fase inicial: primeiros sintomas de comprometimento cognitivo como resultado dos golpes. Embora não tenha sido estabelecido um início claro, a doença geralmente está latente nos primeiros anos.
  • Fase avançada: especula-se que ocorre entre 12 e 16 anos após o esporte começar a ser praticado. Os sintomas já aparecem claramente, embora ainda não possam ser classificados como demência.
  • Demência: os sintomas já estão instalados e afetam a funcionalidade do indivíduo em todos os aspectos. A perda das faculdades mentais, como memória e razão, se torna evidente, e há um grande impacto no comportamento.

Principais sintomas

Os sintomas da demência pugilística são muito variados e frequentemente se sobrepõem aos de outras doenças neurodegenerativas. Mesmo assim, encontramos um grupo de características muito presentes nas pessoas afetadas, que se acentuam à medida que a doença progride.

  • Apatia generalizada: falta de expressividade e interesse emocional acentuada pela deterioração da capacidade de comunicação.
  • Agressividade física e verbal, destacando a impulsividade e a grande irritabilidade.
  • Depressão: a progressividade com a qual os sintomas se manifestam geralmente leva ao desânimo, isolamento e desesperança.
  • Memória: é afetada principalmente nas tarefas do dia a dia. A alteração dessa função está correlacionada com dificuldades para manter a atenção.
  • Problemas motores: a princípio, são pequenas falhas ou falta de jeito, que evoluem gradualmente para problemas de lentidão, rigidez e coordenação.

Principais fatores de risco

O principal fator de risco para a demência pugilística é a prática de um esporte de contato. Assim, a deterioração resultante das várias lesões não ocorre apenas no boxe; existem outros esportes com alta incidência da doença:

  • Futebol americano.
  • Kickboxing.
  • Esportes de alto contato.
  • Esportes de corrida motorizados.

Por outro lado, outros fatores de risco podem ser:

  • Começar a prática de um esporte de contato desde muito jovem.
  • Não usar a proteção recomendada.
  • Uma carreira esportiva de longa duração.
  • Não usar estratégias de prevenção.

Diagnóstico

A demência pugilística não está associada a uma lesão específica ou a uma área específica do cérebro. Por esse motivo, o seu diagnóstico é muito complicado e pouco específico.

Os sintomas comportamentais e motores costumam ser explorados e avaliados por um neurologista e um neuropsicólogo. Da mesma forma, ferramentas de neuroimagem, como a tomografia, são usadas para detectar a profundidade dos danos cerebrais.

Demência pugilística

Tratamento da demência pugilística

O principal tratamento é evitar os fatores de risco. No caso de um esporte com as características mencionadas acima, ele deve ser executado com o maior cuidado e proteção.

Caso os sintomas já estejam presentes, há duas abordagens gerais:

  • Medicação: tratamentos com medicamentos que atuam sobre os sintomas específicos.
  • Reabilitação: deve ser precoce e aproveitar a plasticidade cerebral. Ela se concentra em fornecer ao paciente ferramentas para compensar as perdas motoras para não perder a sua funcionalidade.

Algumas considerações

A demência pugilística é um exemplo muito ilustrativo dos efeitos de não cuidar do nosso cérebro. As alterações ocorrem a médio e longo prazo, mas as causas são muito precoces.

Embora geralmente não haja uma percepção real dos danos devido ao pouco impacto imediato, qualquer atividade corrosiva para o sistema nervoso gera grandes danos no futuro.

Assim, cuidar da dieta e dos hábitos de consumo são um fator de prevenção muito importante para qualquer tipo de demência.

Finalmente, é conveniente ter em mente que algumas práticas populares não são totalmente saudáveis, especialmente se as medidas de precaução necessárias não forem aplicadas.

Uma grande quantidade de ex-jogadores de futebol americano sofrem lesões cerebrais traumáticas que os condicionam por toda a vida.

Graças ao progresso dos estudos e à conscientização geral sobre esses riscos, são possíveis algumas medidas, como a indenização paga pela federação americana aos ex-jogadores e o investimento em novas pesquisas.

“As pessoas que você encontra quando está no topo podem ser as mesmas que você encontrará quando descer ao inferno”.
– Mike Tyson –


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