Desvinculação moral: não sentir culpa por causar sofrimento

A desvinculação moral tem a ver com a dificuldade de assumir a responsabilidade pelos próprios atos quando eles contradizem um valor ou uma norma. Muitos buscam meios para minimizar ou ocultar a transgressão ética em que incorreram.
Desvinculação moral: não sentir culpa por causar sofrimento
Sergio De Dios González

Escrito e verificado por o psicólogo Sergio De Dios González.

Última atualização: 14 novembro, 2019

A desvinculação moral é um conceito interessante que aponta para uma teoria proposta por Albert Bandura. Tem a ver com as razões pelas quais muitas pessoas acabam se envolvendo em comportamentos que contradizem os valores que defendem. São aqueles que, por exemplo, falam de respeito e insultam, ou falam de paz e agridem.

Existem muitos fenômenos históricos nos quais essa separação moral se tornou evidente. O mais divulgado é o holocausto nazista.

Até hoje ainda nos perguntamos como uma nação inteira concordou em ser cúmplice de um massacre. Como homens e mulheres, mesmo muito esclarecidos e decentes, se prestaram a expor o mundo a uma situação extrema e devastadora.

Apesar disso, a desvinculação moral não é apenas um fenômeno ‘macro’. Nós também a vemos frequentemente na vida cotidiana: pessoas que são contra a corrupção e subornam, ou então que defendem os direitos dos mais vulneráveis ​​e exploram os seus funcionários.

O mais impressionante de tudo isso não é a conduta em si, mas o fato de que esta não gera nenhum tipo de desconforto para quem incorre nessas contradições. É exatamente isso que explica essa teoria.

“A nossa ciência nos tornou cínicos; a nossa inteligência, duros e sem sentimentos”.
– Charles Chaplin –

A desvinculação moral

A desvinculação moral

Existem várias teorias que tentam descrever a maneira como os seres humanos adquirem os princípios e valores éticos que nos governam. Para Albert Bandura, este é um processo pelo qual esses valores são incutidos em nós, por meio de estímulos de recompensa e punição. Nós internalizamos as regras graças a isso.

Segundo a sua tese, há circunstâncias que, às vezes, levam a flexibilizar a observância dessas normas. Pode ser devido à pressão social, ou porque em determinados momentos há alguma conveniência, ou talvez porque há uma urgência, entre outros.

No entanto, a verdade é que o ser humano pode agir contra as normas que lhe foram incutidas e que ele mesmo pratica há muito tempo.

Quando uma pessoa trai as suas convicções morais, gera um grande desconforto no seu interior. Uma mistura de remorso, culpa e inquietação. Nesse estado, a pessoa afetada precisa resolver esse desconforto.

Você poderá fazê-lo retificando ou usando mecanismos para justificar o que fez. Um deles é a desvinculação moral, que lhe permite reinterpretar o seu comportamento para não se sentir mal.

Homem arrependido

Os mecanismos da desvinculação moral

Segundo a teoria de Albert Bandura, existem oito mecanismos através dos quais se realiza a desvinculação moral do próprio comportamento.

Em outras palavras, existem oito maneiras de justificar ou dar uma explicação convincente sobre as razões pelas quais traímos valores nos quais acreditamos. Os oito mecanismos são os seguintes:

  • Justificativa moral: ocorre quando uma pessoa se esconde atrás de determinados valores para desculpar a transgressão de outros valores ou de certas normas. Por exemplo, quando o pai castiga fisicamente o filho e diz: “Fiz isso para o seu bem”.
  • Linguagem de eufemismos: quando o impacto de um comportamento é minimizado, suavizando-o através da linguagem. Por exemplo, quando uma demissão ou abandono é chamado de “deixar ir” ou “libertar”.
  • Deslocamento: tem a ver com responsabilizar um agente externo pelos fatos ocorridos, como quando existe uma lei injusta que é seguida simplesmente porque é lei. Um exemplo disso foram as leis que levaram a maltratar judeus na Alemanha nazista.
  • Difusão: corresponde aos casos em que a responsabilidade individual se dilui na culpa coletiva. É um mecanismo típico da corrupção. “Se os outros fazem, por que eu não posso fazer?”
  • Comparação arbitrária: nesse mecanismo, é feito um paralelo entre os piores atos possíveis e o comportamento que a pessoa assumiu. Se alguém rouba um dinheiro, diz que há outros que roubam 100 vezes mais. Ou, se agredir alguém, diz que há outros que matam.
  • Desumanização: consiste em remover simbolicamente a dignidade humana da vítima de seus comportamentos. Por muitos séculos, foi dito, por exemplo, que os negros não tinham alma.
  • Atribuição de responsabilidade à vítima: ocorre quando a vítima é responsabilizada pelos danos infligidos. “Se ele não tivesse reclamado, ninguém o teria agredido. Se ela não tivesse se vestido de uma certa maneira, ninguém a estupraria”, etc.

Considerações finais

Todos esses mecanismos são usados diariamente no mundo de hoje. Vivemos tempos de excessiva relativização moral. Não é bom aderir a princípios inflexíveis, mas também não é saudável para a sociedade que os limites de tudo sejam tão incertos.


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  • Bietti, L. M. (2009). Disonancia cognitiva: procesos cognitivos para justificar acciones inmorales. Ciencia Cognitiva, 3(1), 15-17.

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