Eduard Punset: o adeus a um grande divulgador da ciência
Nós nos despedimos de seu carisma, de sua voz inconfundível, de seu cabelo à la Albert Einstein, de sua notável facilidade para nos transmitir a paixão pela ciência, etc. Eduard Punset era tudo isso e muito mais.
Uma figura tão midiática quanto querida que estabeleceu um antes e um depois no campo da divulgação científica na televisão espanhola com seu programa Redes. Com seu adeus, aos 82 anos de idade, ficamos, sem dúvida, com um grande vazio.
Ele tinha a aparência de ser um cientista distraído e, embora sua carreira pessoal tenha estado vinculada à política e ao direito, Punset sabia muito bem o que queria transmitir em seu programa que ia ao ar nas madrugadas de domingo.
Foram quase 18 anos apresentando e dirigindo Redes. Ele conseguiu fazer o que apenas figuras como Carl Sagan, por exemplo, fizeram em suas épocas: despertar a curiosidade de milhares de espectadores sobre a ciência.
Com entrevistas como as realizadas com Roger Penrose e Max Tegmark, conseguia quase instantaneamente fazer com que desejássemos nos tornar físicos ou cosmólogos para continuar nos aprofundando na origem do universo.
Com conversas como as que teve com Jane Goddall, Lawrence Krauss, Antonio Damasio e Steven Pinker, pudemos entender ideias e teorias sobre nossas origens, o que são realmente as emoções, e qual possível futuro temos à frente como humanidade.
Física, biologia, psicologia, neurociência, cosmologia… Eduard Punset nos convidou a uma viagem de conhecimentos e descobertas apaixonantes através de seu próprio entusiasmo e de uma curiosidade envolvida por um otimismo incansável. Ele nos conquistou.
Não é fácil, portanto, despedir-se de alguém que incentivou e, inclusive, despertou vocações em centenas de jovens. Felizmente, ainda nos resta seu grande legado audiovisual e também suas inúmeras publicações.
“Um conhecimento de quem realmente somos, das nossas fraquezas, nos ajuda a sermos mais felizes”.
-Eduard Punset-
Eduard Punset, o político que abriu as portas do mundo da ciência
Há quem sempre tenha visto com ceticismo o fato de que Eduard Punset fosse considerado um divulgador da ciência. Oriundo do mundo do direito, com uma pós-graduação em ciências econômicas na Universidade de Londres, Punset tinha, além disso, uma longa trajetória como político.
Primeiro dentro do partido Centro Democrático e Social de Adolfo Suárez e, mais tarde, como deputado do Parlamento Europeu desde 1987 até 1994.
Foi sua grande habilidade para a comunicação que levou a Televisión Española (TVE – empresa gestora da televisão pública espanhola) a lhe propor apresentar um programa de ciência.
Efetivamente, Punset não contava com nenhum título acadêmico nem formação relacionada com grande parte das área nas quais se aprofundava a cada semana.
No entanto, ele tinha outras características a oferecer: carisma, intuição científica e uma clara habilidade para transmitir conhecimento de maneira simples, contagiando a todos com sua própria paixão.
Redes, o saber científico ao alcance de todos
Se os Estados Unidos dos anos 1980 tiveram Carl Sagan no programa Cosmos, a Espanha teve Eduard Punset em Redes. E pouco importava que o programa fosse transmitido de madrugada.
A cada semana contava com milhares de espectadores dispostos a se deixar surpreender, a se deixar transformar de leigos do mundo da neurociência, da astronomia ou da biologia em súbitos apaixonados por esses universos singulares.
O programa começou a ser transmitido em março de 1996. Em 2008, entretanto, passou por uma mudança que faria história. Redes passou a se chamar Redes 2.0, e a cada semana Eduard Punset entrevistava um especialista de renome internacional.
De repente, e pela primeira vez, o mundo da ciência era apresentado à Espanha de maneira inovadora e, sobretudo, íntima.
Quem tinha que acordar cedo no dia seguinte costumava gravar o programa. Porque era certo que a cada semana aprendia-se algo novo e conhecia-se em primeira mão figuras tão importantes quanto Oliver Sacks, James Watson e Francis Crick, Steven Pinker, Robin Dunbar, Lawrence Krauss, Roger Penrose, Jane Goodall, Antonio Damasio, Daniel Dennett e Lynn Margulis.
As entrevistas em inglês eram dubladas pelo próprio Punset. Assim, o público se acostumou, sem perceber, a entender todas as ideias, teorias e perspectivas científicas apresentadas através de sua voz e seu inesquecível carisma.
Eduard Punset e a divulgação através de seus livros
Enquanto apresentava o programa Redes, Eduard Punset iniciou um novo trabalho tão bem-sucedido quanto: a publicação de livros.
Trabalhos como Viagem para a felicidade (2005), A alma está no cérebro (2006) ou Por que somos como somos (2008) iniciaram uma época na qual, de repente, o acesso a temas científicos básicos já não era mais complexo, muito pelo contrário.
Mergulhar naquelas páginas era um prazer, era empreender uma viagem estimulante e educativa.
Em seus livros, não escutávamos sua voz, mas permanecia aquela marca inconfundível do divulgador que faz o complexo ser fácil, que oferece teorias, dados rigorosos e que transforma a ciência em um caminho no qual sempre se tem vontade de saber mais.
Talvez por isso tenham surgido outros trabalhos como Viagem ao amor (2007), Viagem ao poder da mente (2010) e El sueño de Alicia (2013, sem tradução ao português), nos quais Eduard Punset entrou em outro domínio no qual se manteria: a autoajuda.
O programa Redes terminou em janeiro de 2014, e Punset pouco a pouco foi se desvinculando do campo da divulgação científica para se focar, mais precisamente, na esfera do crescimento pessoal e da autoajuda através do projeto Apol (Apoio Psicológico Online).
A progressiva saída de Punset da mídia foi acelerada por seus problemas de saúde nos últimos anos.
Eduard Punset nos deixou e, com sua ausência, queiramos ou não, o mundo da ciência fica um pouco mais órfão devido a uma simples razão: o mundo precisa de cientistas, mas também de personalidades que saibam transmitir a magia do conhecimento.
Eduard Punset tinha o brilho de uma nebulosa e a paixão de uma criança que anseia saber tudo. A sua luz brilhará para sempre. A nós, resta seu legado audiovisual e literário para nos lembrarmos dele sempre que precisarmos.