Os vikings eram assassinos sanguinários?

Temidos por seus contemporâneos, as descrições históricas dos vikings se confundem com suas lendas. Sem dúvida, eles eram mais agricultores do que guerreiros.
Os vikings eram assassinos sanguinários?
Juan Fernández

Escrito e verificado por o historiador Juan Fernández.

Última atualização: 05 janeiro, 2023

De todos os povos que percorreram as páginas da história, certamente um dos mais conhecidos e admirados são os vikings. Tidos como inspiração de uma infinidade de romances, séries e filmes épicos, todos nós temos uma imagem definida desses marinheiros e guerreiros. No entanto, o conhecimento histórico que temos deles está longe de ser muito claro, e muitas vezes contradiz a lenda popular.

Deve-se ter em mente que, como acontece com muitos outros grupos no início de sua história, os textos contemporâneos que falam sobre os vikings ou normandos nos séculos VIII e IX foram escritos por seus inimigos.

Se adicionarmos a estes poucos textos o incrível choque cultural que sua chegada pode ter significado para a Europa Ocidental e Meridional, teremos o coquetel que atingiu os nossos tempos. Mas será que a imagem de invasores implacáveis, sanguinários e invencíveis é verdadeira?

Europa no século VIII

No ano 476 depois de Cristo, Rômulo, o último imperador da vertente oeste do Império Romano foi deposto por Odoacro. Esse parecia ser o fim de uma era, mas a realidade é bem distinta.

Após a crise do século III, a chegada sucessiva de tribos bárbaras e a perda do poder de Roma significaram a desintegração do Império em territórios mais ou menos independentes. Da forma como os vemos hoje, os árabes e os vikings foram apenas mais um dos povos que invadiram o mundo cristão nestes séculos. Na época, a visão era bem diferente.

A verdade é que os novos reinos nascidos da união da cultura romana com os bárbaros gozavam de certa estabilidade e paz. Com a notável exceção da Península Ibérica, os demais territórios não temiam a invasão de povos pagãos.

Os bárbaros foram romanizados e cristianizados, e a guerra entre os cristãos respeitava certos códigos. A ameaça árabe não estava presente nas costas cantábricas ou do norte, ou nas terras do interior. Os saxões e outros povos que ainda adoravam deuses antigos não eram uma ameaça potente.

Vikings

Vikings nas costas

No ano 793 depois de Cristo, no mosteiro de Lindisfarne, na Inglaterra, ocorreu o primeiro ataque normando relevante no Ocidente, dando início à chamada Era Viking. O confronto, como muitos dos sucessivos, foi tremendamente desigual.

Muitos dos mosteiros, portos ou cidades perto das costas europeias não tinham defesas, ao contrário do mundo mediterrâneo. Os monges e aldeões não tinham treinamento militar. A fraqueza convidava a continuar com os roubos e ataques.

Os vikings, ainda não cristianizados, não respeitavam os lugares sagrados. Após séculos de refinada “paz cristã”, a barbárie dos gigantes do norte foi absolutamente traumática. A partir dessas histórias, surgiu a nossa visão atual.

Bárbaros implacáveis

Aqueles que sofreram os ataques dos vikings contaram ter passado por uma série de crueldades e torturas. As fontes escritas pintam um panorama nunca visto antes, mas é difícil discernir até que ponto são exagerados.

Alguns líderes normandos, como o agora famoso Ragnar, parecem ter se destacado por sua selvageria. Outros, entretanto, podiam ser indistinguíveis dos exércitos de sua época. Parece claro, então, que práticas como a “Águia de Sangue” são fruto da imaginação dos cronistas.

O terror gerado por seus ataques em terras de relativa paz, sua chegada inesperada, a ignorância de sua cultura pelos cristãos e sua aura de invencibilidade os transformaram em guerreiros lendários.

Hoje, as evidências arqueológicas sugerem que, mais do que soldados, eles devem ter sido mercadores e agricultores. Na verdade, eles não começaram a tirar proveito das suas habilidades de navegação para saquear até que sua terra natal começou a sofrer com uma crise de superpopulação. Mesmo em tempos de maior violência, sua principal fonte de renda continuou sendo o comércio.

Barcos vikings

A invencibilidade dos vikings

Os seus navios, capazes de subir rios europeus, permitiam-lhes realizar rápidos ataques surpresa. Sua altura, que hoje não ultrapassaria a média de nenhum país europeu, os tornava gigantes na Idade Média. Suas táticas de terror favoreceriam a rendição de seus adversários, evitando a luta. Sua disciplina militar, independentemente do que possamos considerar hoje, foi intensa para a sua época. Mas eles estavam longe de ser invencíveis.

Embora seja verdade que eles acumularam vitórias surpreendentes na Europa Ocidental e Oriental, seu objetivo nunca foi a conquista. Os rápidos ataques e fugas favoreceram os saques, mas os monarcas europeus não demoraram muito para tomar medidas contra eles.

As vitórias de Abderramão II, Ramiro I e Luis III demonstraram que os normandos eram vulneráveis. Após as primeiras décadas dramáticas, eles começariam a se aliar às diferentes facções da política europeia, até que estivessem totalmente integrados ao mundo que tanto os temia.

Ainda hoje, lenda e história se entrelaçam no legado de um dos povos mais fascinantes da Idade Média.


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  • Moskowich, Isabel (2002). El mito vikingo: el escandinavo como el “otro” en la Inglaterra medieval, UDC.
  • Jones, Gwyn (1984). A History of the Vikings (revised edition), Oxford.

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