A menina das pulseiras no pulso

A menina das pulseiras no pulso
Lorena Vara González

Escrito e verificado por a psicóloga Lorena Vara González.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

Por onde começar esta história, minha história, a história da menina das pulseiras no pulso. Como explicar que eu tinha tudo e perdi sem saber como. Como te fazer entender que o que aconteceu não foi culpa minha, que foi uma questão de tudo ou nada, de querer ser amada e evitar o vazio que sinto todos os dias.

Porque sim, eu tinha tudo, mas algo chamado transtorno de personalidade limítrofe fez com que eu perdesse pouco a pouco e passasse a ser a menina das pulseiras no pulso.

Talvez você não seja capaz de me entender, a maioria não consegue. É muito difícil se colocar no lugar do outro quando o outro não se comporta, não sente ou não pensa como a maioria das pessoas. Mas hoje vou contar um segredo, mesmo que não pensemos ou agimos como você, não significa que não tenhamos sentimentos.

Agora eu lhe peço que leia, que me escute e tente se colocar em meu lugar. Quero contar minha história, ainda que não saiba quando começa nem se chegou ao seu final. Desejo que conheça o que alguém sente quanto tem uma doença mental que ninguém entende, obtendo em troca tudo o que tentava evitar: a solidão e a rejeição.

Entre você e eu existe somente um diagnóstico de diferença, mas este rótulo serve para me desumanizar e te fazer acreditar que você é melhor do que eu.

A menina das pulseiras no pulso

A história da menina das pulseiras no pulso

Como disse, não sei exatamente quando tudo começou, mesmo que acredite que possa ter sido na mudança de cidade ao começar a universidade. Nunca tinha estado sozinha em um local novo, sempre tinha vivido no mesmo lugar com as mesmas pessoas. Isso me causava uma grande ansiedade, porque a ideia de não me encaixar, de estar sozinha, me aterrorizada cada vez mais.

Por isso e desde o início, me propus a ser a legal do grupo da universidade. Isso implicava estar magra e sempre perfeita, ou nisso acreditava. Comecei a vomitar quando pensava que comia demais. Inclusive pulava as refeições ou procurava não comer diante das pessoas. Além disso, bebia muito, até perder o controle, porque pensava que assim me aceitariam melhor e me livraria da timidez.

E então ele apareceu. O menino do sorriso perfeito. O menino dos meus sonhos. E o objetivo de toda a minha existência se baseava nele me amar como eu o amava. Não importava se já tivesse uma namorada, não importava que não se interessasse por mim. Eu o queria e faria qualquer coisa para que ele me quisesse também. Pensava, bom, não pensava, estava convencida de que ninguém, jamais, poderia dar a ele o que eu daria.

Averiguei onde morava e comecei a deixar cartas de amor no correio. Criava filmes em minha cabeça nos quais éramos os dois protagonistas de uma bela história de amor, e com o passar do tempo acabei acreditando que eram realidade. Tentei convencer o resto do mundo que sua namorada era má, para que terminassem de uma vez. Fiquei tão obcecada que ele se tornou meu mundo, mas um mundo que não existia e isso fazia crescer um vazio em meu interior.

Menina observando lago com plantas

As pulseiras que cobrem minhas vergonhas

Perdi o controle até dos meus sentimentos. Tudo se converteu em branco ou preto, em me amar ou me odiar, naqueles “ou está comigo ou está contra mim”. Porque eu era a dona dos extremos da realidade e me negava a ver os pontos intermediários. Eu me converti em um furação de sentimentos, somente amava com a maior das intensidade ou odiava com todas as minhas forças. Mas dentro desse furação estava o olho da tormenta, um olho que mostrava o vazio que se tornava cada vez maior em meu interior.

Esse vazio que cada vez se tornava mais forte maquiava minha realidade de tal maneira que era toda emoção no meu exterior, mas não sentia nada. Então, buscando deixar para trás esse vazio, buscando sentir, comecei a cortar os pulsos. E foi nesse momento que me converti na menina das pulseiras no pulso, porque essas pulseiras eram as únicas que tampavam o que eu não queria mostrar.

Mas as pulseiras não curam tudo, somente escondiam aquilo que não queria mostrar. Escondem a parte de mim que não controlo. Essa parte pela qual sou o motivo de risos daqueles que me conhecem, porque para eles sou a louca exagerada. E eu…eu… eu só quero me encaixar e sentir algo bom, por isso me animei a pedir ajuda.

Sei que vai ser um caminho longo, muito longo, mas agora existe esperançaGraças ao tratamento que sigo com minha psicóloga clínica e uma medicação prescrita pelo psiquiatra, vou sendo um pouco mais eu, meu eu anterior. Fui corajosa e busquei ajuda, por isso conto minha história. Se você se sente da mesma forma ou conhece alguém como eu, não ria sem saber; por trás do que você vê, existe um ser humano que se sente perdido e que pode, como eu, esconder debaixo das pulseiras aquilo que lhe causa dor e, ao mesmo tempo, vergonha.


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