A metáfora do professor de matemática

A metáfora do professor de matemática é um exercício da Terapia Cognitiva Baseada em Mindfulness (MBCT) que ilustra como nossa tendência de tirar conclusões sem contar com a informação adequada pode ter consequências desastrosas.
A metáfora do professor de matemática

Última atualização: 09 junho, 2020

Em algumas ocasiões, os pensamentos que surgem na nossa mente parecem jogar mais contra do que a nosso favor. O problema é mais o modo que temos de formar nossas ideias, e nem tanto seu conteúdo ou a referência. Há muitos erros cognitivos e esquemas disfuncionais que criam raízes em nossa psique e que dificultam o nosso dia a dia. A metáfora do professor de matemática é um exemplo disso.

Um desses esquemas cognitivos disfuncionais que muitos de nós possuem é o da inferência arbitrária. Estamos falando do processo de chegar a uma conclusão sem evidência que a apoie, ou até mesmo com evidências contrárias à conclusão.

A inferência arbitrária, ainda que seja uma estratégia útil que se baseia na experiência, pode fazer com que cheguemos a conclusões erradas. Vamos aprofundar o assunto a seguir.

A utilidade de tirar conclusões

É verdade que tirar conclusões a partir de uma característica ou fato concreto pode nos ajudar a economizar tempo e esforço.

Se disserem para Alessandra que Guilherme é o responsável pelas tarefas do lar, ela poderia pensar que ele gosta muito de cozinhar. Ela poderia até mesmo pedir para ele que cozinhasse para ela em algum momento. No entanto, Guilherme pode não ter a menor ideia de como acender o fogão.

Ainda que esse erro possa ser taxado como algo lógico, a questão por trás da situação é que o que parece normal e a experiência que acreditamos ter em diferentes cenários pode fazer com que pensemos de uma maneira que nao é necessariamente a mais adequada.

Jovem preocupada

MBCT ou a Terapia Cognitiva Baseada na Atenção Plena

A MBCT se coloca como uma integração entre dois modelos terapêuticos: a terapia cognitiva e o programa de manejo do estresse baseado na atenção plena de Kabatz-Zinn MBSR.

O objetivo inicial dessa fusão de correntes era prevenir as múltiplas recaídas que acontecem depois do término de uma terapia para tratar a depressão. De fato, muitos estudos investigaram os sintomas residuais e as recaídas dos pacientes com depressão após o fim do período de uma terapia.

Os números parecem alarmantes: mais ou menos 70% das pessoas apresentam sintomas cognitivos depressivos após a terapia. Além disso, 75% das pessoas que respondiam positivamente ao tratamento apresentavam cinco ou mais sintomas residuais.

Esses sintomas residuais eram, em sua maioria, problemas de concentração, falta de atenção, dificuldade para encontrar palavras, lentificação mental e dificuldades no processo de tomada de decisões.

Por isso, a MBCT, desenvolvido por Segal, Williams e Teasdale em 2002, coloca-se como algo extremamente necessário para a clínica atual. Esse programa foi desenhado para sessões em grupo, nas quais trabalha-se a meditação, os sentimentos e as emoções para evitar uma recaída.

A MBCT treina o redirecionamento da atenção para formas de pensamentos e processos cognitivos que rompam com a teia de aranha depressiva. Dessa forma, pode tornar mais fácil o aparecimento de um novo episódio depressivo.

Uso de metáforas na MBCT

Na MBCT, é comum a utilização de metáforas para conseguir uma mudança cognitiva e, sobretudo, para ensinar as pessoas a identificar uma forma de pensamento irracional e agir sobre ela em seguida.

Um dos exercícios que a MBCT ensina se relaciona com a metáfora do professor de matemática. Nele, pede-se à pessoa que feche os olhos para começar a tomar consciência dos diferentes pensamentos, sensações e emoções que o relato produz.

Essas são as únicas diretrizes dadas antes de contar a história em si.

Tomada de consciência: a metáfora do professor de matemática

A história contada é a seguinte:

“Clara está indo para a escola.

Ela está preocupada com a aula de matemática.

Não está certa de que poderá controlar a classe da sexta série novamente.

Porque essa, afinal de contas, não é uma das obrigações de uma zeladora”.

Depois de contar a história e dar pausas para que a pessoa pense, é útil compartilhar o que aconteceu durante o exercício. O mais comum é que a pessoa fale sobre seus erros ao tentar tirar conclusões precipitadas.

É provável que em um primeiro momento a pessoa pense que Clara, a protagonista da história, seja uma aluna, depois uma professora, para finalmente descobrir que era uma zeladora.

O perigo de tirar conclusões precipitadas

O que esse exercício ilustra é que nós costumamos tirar conclusões e revisá-las à medida que vamos obtendo informações. No caso do relato, essa conclusão vai sendo desmentida com mais dados, mas não é isso que acontece o tempo todo.

Ninguém, nem uma pessoa, nem a realidade, tem obrigação de corrigir ou chamar atenção para as conclusões falsas às quais nós chegamos. Por isso, é responsabilidade nossa corrigir nosso modo de pensar ao invés de esperar que algo ou alguém externo nos corrija.

Ainda que o pensamento de achar que Clara é uma professora ao invés de uma zeladora não seja algo grave ou que cause algum dano, essa história pode se repetir em muitas situações durante nossa vida.

Por exemplo, se Clara, na verdade, é nossa melhor amiga de longa data, que vemos caminhando a uma certa distância, mas ela não nos cumprimenta, podemos chegar a muitas conclusões diferentes.

Elas podem ser: Clara é muito mal-educada; Clara é muito distraída; Clara está brava; Clara não gosta mais de mim. Essas deduções podem até mesmo causar um impacto no nosso humor, pois Clara não se comporta mais de forma condizente com tudo que achávamos dela até então.

Acontece que a Clara é míope e pode só não ter colocado as lentes de contato hoje.

Em outra situação hipotética, Beatriz avisa no mesmo dia da entrega que não poderá participar da compra do presente de Cláudia, quando ela já havia se comprometido e o presente já havia sido comprado.

O resto do grupo de amigas pode pensar que Beatriz não tem a menor consideração com ninguém, que é egoísta e só pensa nela, e que por isso ela não deveria fazer parte do grupo de amigas.

No entanto, se foram essas as conclusões às quais as amigas de Beatriz chegaram sem nenhuma outra informação sobre a situação, elas estavam erradas.

Beatriz pode ter problemas financeiros, pode ter discutido com sua mãe sobre dinheiro, estar brava e reagido impulsivamente, ou ter descoberto algo sobre Cláudia que ninguém mais sabe.

Homem pensativo

O impacto do que fazemos é responsabilidade nossa?

Essa maneira de pensar não apenas é perigosa, mas também pode afetar gravemente o nosso humor. Como muitas vezes nossos pensamentos moldam o nosso comportamento, as inferências que fazemos também podem fazer com que nos comportemos de uma determinada maneira.

Se um comportamento é motivado por uma conclusão, e se essa pode estar equivocada, o que acontece é um comportamento desajustado.

Se uma pessoa para de falar com a outra porque acredita que foi passada para trás, ou se um grupo de amigas discute e deixa de falar com uma delas por acreditar que ela seja egoísta, mas nada disso corresponde à realidade, estaremos fazendo algo que na realidade não queremos fazer, baseados em razões que não se sustentam fora da complicada trama que foi tecida dentro da nossa mente.

Por isso, interiorizar a metáfora do professor de matemática e lembrar dela cada vez que chegarmos a uma conclusão pode ser algo muito útil. Isso não apenas melhorará a lógica do nosso pensamento racional, como também fará com que adotemos menos posturas equivocadas.


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  • Cebolla, A. y Miró, M. (2008). Efectos de la Terapia Cognitiva basada en la Atención Plena: una aproximación cualitativa. Apuntes de Psicología, 26(2), 257-268.

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