E de repente você chegou, uma história sobre a paixão

Ele a amava em segredo há anos, mas não sabia o que aconteceria ao conhecê-la. O que ele menos esperava era descobrir que a paixão está em nossas mentes.
E de repente você chegou, uma história sobre a paixão
Francisco Javier Molas López

Escrito e verificado por o psicólogo Francisco Javier Molas López.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

Ele sempre a via pelos corredores da faculdade. Tentava se sentar perto dela na aula para admirar a sua beleza. O seu rosto transmitia paz, serenidade. O seu cabelo comprido, ondulado e escuro o induzia a um estado quase hipnótico. A sua aparência física era perfeita. Era o tipo de garota que ele sempre havia buscado.

De vez em quando, trocavam olhares e um ou outro cumprimento. Nesses momentos, a voz dele tremia e não sabia muito bem o que dizer. Compreendia que estava em uma fase de paixão bastante intensa. O que ele ainda não sabia é que a paixão está em nossas mentes.

Patrícia era a garota que ele esperava há muitos anos, e ali estavam eles, compartilhando o mesmo lugar todas as manhãs. Quando ele se encontrava com ela, um delicioso perfume invadia o ambiente, e ele ficava completamente embriagado. Quando se cruzavam e diziam “oi”, as pernas dele tremiam.

Ao seu lado

Ele se imaginava com ela passeando pelas ruas da cidade. Comentando os edifícios mais bonitos, os mais estranhos e tudo aquilo que eles observavam. Eles sentariam em um banco, falariam e dariam muitas risadas.

Depois, iriam almoçar em algum lugar e continuariam se divertindo. Até que um dia, eles se abraçariam e dariam um beijo. Cada vez que ele a olhava na faculdade, todos esses tipos de pensamento rondavam a sua mente.

Um dia, almoçando com uma amiga na lanchonete da faculdade, ela se sentou junto a ele. Como aquilo era possível? Ele começou a ficar muito nervoso. A garota da sua vida estava diante dele. Ela era linda. Tudo nela era perfeito. Sua paixão aumentava cada vez mais, e ele sentia muito medo de decepcioná-la.

Casal apaixonado

A ilusão de uma conexão especial

A partir desse dia, compartilharam a mesma mesa em outras ocasiões. Eles falavam de muitas coisas e riam. Sempre pediam o prato do dia para almoçar. Ela bebia refrigerante e ele, água. Ela gostava mais de salada e ele, de massas. E de sobremesa ele costumava comer uma fruta e ela, um pudim. Ele olhava nos seus olhos e se imaginava com ela em alguma praia paradisíaca, pegando sol e nadando em águas cristalinas.

Eles se viam cada vez mais. Patrícia também parecia buscá-lo. Ele estava há mais de um ano e meio apaixonado por ela. Um dia, eles decidiram se encontrar fora da faculdade e foram tomar um café. Foi muito agradável. Eles tinham gostos ligeiramente diferentes, mas isso  não importava; eles se completavam de uma maneira formidável. Ele via nela sinais que pareciam mostrar uma conexão especial.

E chegou o momento

Em uma tarde de inverno, Patrícia se sentou do lado dele na lanchonete da faculdade.

– Tenho que comentar algo com você. – disse a ele. Naquele instante, ele começou a tremer. O momento havia chegado.

– Claro, diga. – ele respondeu.

– Eu estou apaixonada. Não disse isso a você antes porque não gosto muito de falar sobre mim nesse aspecto, mas não tenho certeza do que fazer.

– E qual é o problema? Você não é correspondida? – ele perguntou desejando ouvir a resposta.

– Sim, sou correspondida… – ela respondeu.

– Então? – ele perguntou impaciente.

– O rapaz não é daqui, ele mora em outra cidade, nós nos veríamos muito pouco e os relacionamentos à distância são muito difíceis, ou pelo menos é o que dizem…

Naquele momento, ele parou de ouvir o que ela estava dizendo. Ele mergulhou em um grande poço escuro e apagou a luz. Ele a olhou fixamente, e chegou a sentir uma raiva que não sentia há muito tempo.

Por que aquele rapaz e não ele? Ela havia dado sinais de interesse! O que estava acontecendo? Não podia ser, era dele que ela tinha que gostar, e não do outro rapaz. Ele a amava há muito tempo em segredo, sem poder dizer nada, e agora que a tinha ao seu lado, ela estava apaixonada por outro.

Ele não queria continuar ouvindo. Na verdade, não queria voltar a vê-la. Sua felicidade havia desmoronado, e ele se sentia perdido e decepcionado. Estava bastante iludido, porque um possível relacionamento futuro o faria feliz, mas não restava nenhuma opção.

Ele a amava, mas ela amava outra pessoa. Nada tinha sentido. Inclusive, ele chegou a pensar que ela tinha se divertido às custas dele ao lhe dar esses falsos sinais de interesse.

Homem contemplando o pôr do sol

O que realmente aconteceu

Alguns meses mais tarde, ele conheceu um senhor idoso enquanto ia de ônibus até a sua casa. O trajeto era de uma hora e meia, e eles tiveram muito tempo para conversar.

Falando um pouco de tudo, ele comentou sobre a sua grande história de desamor e, apesar da sua surpresa, o homem olhou para ele com ternura e lhe disse sorrindo:

– O problema é que você não estava apaixonado por ela.

– Desculpe? – ele perguntou incrédulo – Eu a amava há mais de um ano, como não estava apaixonado?

– Você não pode amar quem não conhece, pelo menos em um sentido romântico… você estava apaixonado sim, mas não por ela, e sim pelas suas expectativas sobre ela. A paixão não é amor, jovem amigo, não se confunda. A paixão está em nossas mentes…

Eles permaneceram alguns minutos em silêncio. Ele não entendia muito bem o que o homem estava querendo dizer. Enquanto ele não sabia qual expressão adotar, aquele homem idoso sorria ao observar a paisagem através da janela. O homem virou para ele e continuou:

– Veja bem, essa garota deve ter desencadeado uma certa excitação em você com a sua aparência física, e a partir daí, você começou a imaginar uma vida muito feliz junto a ela. Não era mais do que isso, excitação e expectativas, mas na realidade, você não a conhecia muito bem. Pouco a pouco, você começou a idealizá-la cada vez mais.

– Além disso, quando você começou a conhecê-la melhor, escolheu os aspectos que mais gostava e os exagerou ainda mais, ao mesmo tempo em que evitava voluntariamente aqueles que menos gostava. E isso não é tudo, você pensou que ela deveria fazê-lo feliz, deixou a sua felicidade nas mãos dela. E lamento lhe dizer, jovem amigo, que isso não é amor, isso é apego. Por isso você se sentiu tão decepcionado. O amor é real, o amor é verdadeiro, no amor não se espera que ninguém faça nada por você, é você que busca a felicidade da outra pessoa.

– Você quis interpretar seus sinais como gestos de paixão por você, porque era isso que você queria ver – continuava o senhor idoso. Você foi o diretor, o roteirista e o ator do filme que estava imaginando em sua cabeça. A questão é que você acreditou e desvirtuou a realidade. Mas, não se preocupe. Acontece com todos nós. Costumamos cair nessas armadilhas. Se você realmente sente amor por ela, deseje que ela seja feliz, com você ou com outro rapaz, isso tanto faz. Da próxima vez, pense se você realmente está se apaixonando pelos seus pensamentos e expectativas com respeito a alguém ou se sente um amor verdadeiro.

A paixão está em nossas mentes

– Vou lhe dizer algo – acrescentou aquele homem – como dizia José Ortega y Gasset: “Uma das qualidades mais características da paixão é a pontaria na consciência do ser querido, até o ponto dela limitar, ou inclusive impedir, o bom uso do raciocínio, a necessária concentração mental na execução de diversas tarefas cognitivas”.

– Mas que frase, hein? Ele demorou para aprendê-la, mas o impactou tanto, que não conseguiu esquecê-la, e agora ela vai funcionar para você também.

Acabou o trajeto do ônibus. Ele se despediu do senhor idoso. Chegou em sua casa, cumprimentou seus pais e se deitou no sofá. Pensou em tudo que o homem havia dito. Tratava-se de uma informação que, à primeira vista, poderia parecer uma loucura, mas que, ao ser analisada com uma certa objetividade, parecia estar completamente correta.

Na verdade, Patrícia nunca gostou dele, tudo havia sido sua imaginação. Ele ainda se lembra da frase que aquele homem disse antes de se despedirem: “Se você realmente ama alguém, deseje-lhe o bem, deseje o seu bem-estar, a sua felicidade, não olhe o que essa pessoa pode fazer por você, mas o que você pode fazer por ela. Se você a vir sofrer, ajude-a. Nisso consiste o amor, em ajudar os outros, em fazê-los felizes. E se essa pessoa também sentir um amor real por você, eu garanto que você terá a relação de amor mais maravilhosa que pode existir”.

Tudo fez sentido para ele. Ele começou a ler sobre o amor e a paixão e descobriu um interessante artigo de Chóliz e Gómez (2002) que afirma que as pessoas atraentes têm vantagens sobre aquelas que não são, para que nós as notemos e nos apaixonemos por elas. Pelo simples fato de serem atraentes, nós costumamos atribuir-lhes características desejáveis, e deste modo, elas recebem um tratamento mais cordial.

Assim, entre as palavras daquele senhor idoso e tudo que ele foi lendo, acabou se convencendo, cada vez mais, de que a paixão está em nossas mentes. Por isso, devemos ter cuidado com as expectativas que criamos.

A partir daquela experiência, cada vez que ele conhecia uma garota e começava a ter uma grande ativação emocional, a sua mente lançava como uma flecha a advertência de que a paixão está em nossas mentes, e isso ficava um bom tempo ressoando em sua cabeça. “A paixão está em nossas mentes, a paixão está em nossas mentes…”

“Pensar que a paixão está em nossas mentes pode parecer doloroso e irreal, mas se analisarmos com a lupa da razão, vamos ver o quanto somos capazes de nos enganar sem sermos conscientes disso”.
– Gendun Dorje –


Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.