Amores depressivos: quando o amor é uma súplica

Vivemos amores depressivos por carência, e por isso eles podem acabar se transformando em uma súplica.
Amores depressivos: quando o amor é uma súplica
Sergio De Dios González

Escrito e verificado por o psicólogo Sergio De Dios González.

Última atualização: 16 fevereiro, 2022

Chamamos de amores depressivos as uniões de casais que são estabelecidas quando um ou ambos os envolvidos foram diagnosticados com depressão, ou sofrem com vários sintomas significativos deste transtorno. Sob tais circunstâncias, tanto o sentimento quanto o vínculo adquirem características próprias e são vivenciados de maneira particular.

Talvez isso seja duro, mas deveríamos começar nos perguntando se é possível chamar de “amor” um sentimento que nasce em meio à depressão. Muitas vezes não é amor, ou então é algo muito distante do “bom amor”. Dar e receber amor exige um certo equilíbrio que é anterior à relação.

De qualquer forma, os amores depressivos que não se enquadram como “Amor”, com “A” maiúsculo, não necessariamente são menos intensos. Na verdade, ocorre justamente o oposto, pois o sentimento atinge altos níveis de intensidade. Num dado momento, esse sentimento pode parecer a solução para todos os problemas, mas, quando menos se espera, ele pode complicar tudo.

“O preço para sair da depressão é a humildade.”
-Bert Hellinger-

Mulher sofrendo de depressão

A depressão como uma rachadura no amor

Na depressão, são comuns os sentimentos de solidão interior e carência. Independentemente das definições do ponto de vista da psiquiatria, em termos simbólicos esta carência é uma carência de amor. Amor por si mesmo, pela vida, pelas pessoas à nossa volta, pelo trabalho, etc.

Entretanto, deixando de lado o mundo simbólico e focando no mundo puramente concreto, é mais do que claro que o amor provoca transformações em nossa química cerebral. Atualmente sabemos que, quando estamos apaixonados, há um processo fisiológico responsável por uma alta liberação de neurotransmissores, e muitos deles aumentam a sensação de bem-estar.

Ao levarmos o simbólico e o concreto em conta, chegamos a uma conclusão problemática: do ponto de vista químico, o amor pode ser uma “droga” para a depressão. Do outro lado, simbolicamente falando, o amor satisfaz uma carência existente. Diante disso, é possível chegar a uma conclusão questionável: o amor é a solução para tudo.

Os amores depressivos

Os amores depressivos nascem quando uma pessoa afetivamente carente, ou quimicamente desequilibrada, encontra um objeto que muda a sua realidade. Na primeira etapa, a paixão libera um coquetel de neurotransmissores necessários para termos aquela tão desejada sensação subjetiva de plenitude.

O que ocorre depois disso é que o amor entre casais é algo vivenciado a dois. O outro se torna um mundo no qual aquele que sofre de depressão pode se sentir melhor. Além de se distanciar do amor verdadeiro, essa postura egoísta desencadeia uma outra etapa que raramente é tão harmônica quanto a primeira.

Cedo ou tarde, o outro deixa de ser um objeto de conforto e equilíbrio. Por não ser uma coisa, ou mesmo uma droga, o vínculo também começa a ter seus vazios e suas contradições expostas. Nessa altura dos amores depressivos, surge a ideia de que algo não está certo e, primeiro, há exigências para que isso seja acertado. No entanto, mais tarde, começam as súplicas para que o outro volte a ser aquele “objeto” que havia sido inventado no início da relação, aquele objeto que resolvia o mal-estar.

Casal em crise

O que falta na equação?

O que falta na equação dos amores depressivos é justamente o amor. Isso não implica somente a capacidade de se permitir ser amado, mas também de ser capaz de amar o outro. Além disso, também exige a capacidade de abandonar e ser abandonado. O mais importante é saber que é impossível atingirmos este sentimento sem antes possuirmos amor próprio.

É necessário que haja um acerto de contas individual antes de tentar dividir a subjetividade e a intimidade com os outros. O maior perigo é que a pessoa depressiva imagine um cenário no qual será salva pelo outro, ou no qual já está sendo salva por este outro, ou ainda que um dia será resgatada por ele (ou por ela).

O que torna essa atitude nociva é a falácia em seu cerne, que eventualmente se mostrará como tal: tais posturas, longe de ajudar, contribuem para o mal-estar. De fato, é possível vivermos nossos dias como catástrofes ambulantes, sendo as provas definitivas de que não existe mais nada na vida além de uma escuridão que controla tudo.

A longo prazo, os amores depressivos não funcionam. Se ambos os membros do casal sofrem de depressão, é possível que um dos dois acabe assumindo o papel de salvador, mas isso, em algum momento da relação, acaba entrando em colapso.

A perfeição não é condição para viver um amor verdadeiro, mas é preciso que este vínculo seja nutrido a partir de um lugar que não seja a carência ou a necessidade.


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  • Bertholet, R. (2012). La depresión, una lectura desde el psicoanálisis. In IV Congreso Internacional de Investigación y Práctica Profesional en Psicología XIX Jornadas de Investigación VIII Encuentro de Investigadores en Psicología del MERCOSUR. Facultad de Psicología-Universidad de Buenos Aires.


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