Autoabuso e autoestima: como se relacionam?
O autoabuso é o lado oposto da autoestima e é muito mais comum do que imaginamos. Boa parte de nós costuma tecer julgamentos a respeito de como somos, o que merecemos, qual é o valor do nosso trabalho, etc. Estes julgamentos geralmente são feitos em um nível interno, muitas vezes se mantendo em segredo e minimizando nossas conquistas. Diante desse fenômeno, costumamos maximizar os erros.
Por consequência, aumentamos nosso nível de autocobrança, nutrindo a sensação de que sempre podemos fazer melhor. Portanto, a autoestima pode ser diminuída. Nossas ações são desprezadas pelo pensamento de que qualquer pessoa poderia ter feito algo melhor.
Como o autoabuso se desenvolve?
A autoestima, de modo geral, é a capacidade que temos de valorizarmos a nós mesmos. Ela implica o desafio de enfrentar os pensamentos negativos que outras pessoas podem ter sobre nós.
Uma baixa autoestima nos torna mais suscetíveis às críticas dos outros, inclusive aumentando a probabilidade de tomarmos essas críticas como verdades absolutas. É aí que começa a se desenvolver o “ditador interno” do autoabuso: minimizamos as conquistas, aumentamos a percepção dos erros e o nosso sentimento de vergonha por eles, etc.
Autoabuso: as origens do “ditador interno”
Estamos expostos à avaliação e aos julgamentos dos outros desde que nascemos. A falta de motivação que sofremos desde a infância mina a nossa capacidade de nos defendermos das críticas.
Se desde essas experiências primárias nossos fracassos vêm sendo castigados e nossas conquistas, de certa forma, reduzidas, provavelmente acabaremos nos enxergando como pessoas de poucas capacidades.
Mais ainda, teremos a sensação de que não fracassar é algo especialmente importante. Do contrário, teremos que encarar os julgamentos e as críticas dos demais. Se a motivação de não fracassar é mais importante do que as conquistas, podemos perder todo o valor que as críticas podem trazer, uma vez que não as aceitamos de maneira construtiva.
Nessa dinâmica, as críticas dos demais podem se enraizar, fazendo com que nos enxerguemos como pessoas de pouco valor. Por sua vez, as críticas que nós mesmos fazemos se tornam muito mais impiedosas do que as das outras pessoas. Podemos sustentar a crença de que não temos valor, não somos dignos de amar, etc. Consequentemente, a autoestima anda de mãos dados com o autoabuso da seguinte forma: somos capazes de acreditar que nossa essência é baseada em nossas conquistas e estas, por sua vez, são percebidas como sendo de pouco valor.
Como constatar o autoabuso?
Normalizar o autoabuso é muito perigoso. Não apenas provoca danos à autoestima, mas também pode desencadear formas mais perigosas, como os transtornos de humor, mais especificamente os transtornos depressivos.
O autoabuso não surge de uma só vez. É um tipo de agressão que se ancora em nossas vidas com o passar dos anos. Algumas vezes, inclusive, é difícil diferenciar nossas próprias críticas das críticas dos outros. Quando o autoabuso se fixa em nossas vidas, até mesmo as críticas mais construtivas que recebemos dos outros acabam sendo encaradas como um tipo de fracasso. Por exemplo:
- Alguma vez já te recomendaram fazer uma tarefa de trabalho de modo a obter melhores resultados e você ficou remoendo que seu jeito de fazer as coisas era ruim?
- Quantas vezes você já ficou remoendo seus erros, apesar dos seus esforços terem sido reconhecidos?
- Você já pensou alguma vez que não é digno do trabalho que tem, que outra pessoa poderia fazer melhor do que você e que, a qualquer momento, seus chefes vão se dar conta disso?
Parar nossas vidas para parar o “ditador interno”
A voz do “ditador interno” pode ser tão forte que chega a paralisar nossas ações valiosas. Se interrompemos atividades que consideramos valiosas, caímos na armadilha da experiência humana, ou seja: quando os julgamentos dos outros durante a nossa infância se somam aos julgamentos de hoje. Em outras palavras, passamos nossa vida tentando não fracassar.
Tentar não fracassar significa não estar disposto a sentir as doses de mal-estar que estão no caminho em direção aos nossos valores. Isso não nos livra do “ditador interno” do autoabuso, pois ele provavelmente vai nos dizer que estamos “nessa situação” porque temos medo e que não somos capazes de enfrentar esse medo.
Qual é o papel da autoestima?
Você já parou para observar a sua situação como se fosse outra pessoa que age em função do que um conhecido diz, segundo o julgamento deste último? Considerando essa situação, percebemos como nossa mente, no modo de autoabuso, nos afasta das coisas que consideramos importantes. Pode ser frustrante para os nossos objetivos quando escutamos esse diálogo interno e acreditamos que ele é uma verdade absoluta, pois, muitas vezes, nossa mente nos diz que não somos capazes.
De toda forma, tentar eliminar o “ditador interno” é como tentar retirar ervas daninhas de um jardim: podemos arrancá-las, mas vão continuar crescendo. Livros de autoestima tampouco ajudam a eliminar essas formas de autoabuso; eles apenas dão orientações que nada mais são do que conhecimentos adquiridos por uma experiência de muitos anos para melhorar a autoestima.
Mesmo assim, há uma maneira de observar essa luta entre o autoabuso e a autoestima com outros olhos: os da autocompaixão. A autocompaixão nos permite observar esse conflito a partir de outra perspectiva, permitindo-nos falhar e observar o que acontece em nosso mundo interior quando o mal-estar se faz presente.