Bruce Springsteen: sobrevivi dessa forma à escuridão da depressão
Bruce Springsteen admite: “Sei que não estou inteiramente bem”. Ele está ciente de que essa batalha contra a depressão implica tentar sobreviver a cada dia com bons recursos. Também com uma mente que escolhe a esperança sobre a escuridão. Nessa em que ele esteve preso em mais de uma ocasião, conseguindo sair dela apenas com a ajuda de medicamentos, terapia e de sua família.
Born to run (2016) foi o livro autobiográfico em que nos revelou muitos daqueles becos mais íntimos que correm paralelos a sua faceta musical. Porque a arte, em qualquer das suas expressões, alimenta-se da própria existência e, sobretudo, daqueles fragmentos menos amáveis para os quais a música serve de catarse. Também serve de refúgio para almas sensíveis e ao mesmo tempo atormentadas.
Nas páginas de suas memórias transpiram sinceridade e crueza. Ele explica que aprendeu certas habilidades para lidar com “isso” (a depressão, que ele não nomeia), mas admite que ainda tem medo dela. É algo poderoso, explica, uma presença que surge de lugares inexplicáveis. E esses espaços, para Springsteen, têm a ver com genética.
Seu pai sofria de esquizofrenia e sua família também tinha vários problemas de saúde mental.
Bruce Springsteen lamenta que seu pai não tenha conseguido lhe dizer “eu te amo” antes de sua morte.
Bruce Springsteen e seus territórios sombrios
Bruce Springsteen tem 72 anos, 20 Grammy Awards e mais de 120 milhões de discos vendidos. Ele canta, compõe e nós o conhecemos como The Boss, embora além dos palcos, das salas de gravação e da companhia de seu violão, haja outra pessoa. Alguém que transcende o consagrado astro do rock ‘n’ roll, e que nos revela mais uma faceta de sua vida que nem todos conhecíamos.
Nos últimos tempos, estamos vendo quantas figuras públicas vêm a público e falam sobre sua saúde mental. Alguns dirão que é uma moda passageira. No entanto, ser honesto e contar as batalhas que cada um trava com seus problemas psicológicos é uma forma de coletivizar as experiências. Só então nos damos conta de que todos passamos ou podemos passar pela mesma coisa.
Além de sua biografia, há pouco mais de um ano ele iniciou um podcast com o ex-presidente Barack Obama. Logo no primeiro episódio de Renegades: Born in the USA, ele falou sobre sua infância e da relação com o seu pai…
“Minha depressão se derrama como o petróleo sobre o belo golfo verde-turquesa de minha existência cuidadosamente planejada e controlada. Sua lama negra ameaça sufocar até a útlima parte viva de mim.”
-Bruce Springsteen-
Rock ‘n’ roll e demônios familiares
O pai de Bruce Springsteen tinha esquizofrenia e um longo histórico familiar de problemas mentais. Muitos desses parentes nunca receberam sequer um diagnóstico. Uns tinham medo de espaços fechados, outros arrancavam os cabelos… Crescer em um ambiente dominado por um progenitor que navega pelo sofrimento, pelo caos emocional e pelo desequilíbrio deixa uma marca e altera tudo.
A infância de Springsteen foi dominada por uma figura paterna violenta e pouco afetuosa. No entanto, quando fez da música sua vida, não hesitou em se apropriar dos demônios de seu pai para criar suas músicas. Também para criar sua imagem. Ele escolheu suas roupas de operário e impregnou sua música de escuridão. Ele homenageou sua identidade e serviu, por sua vez, como uma narrativa da história de seu país.
Suas duas crises de depressão
A primeira vez que ele ficou cara a cara com a depressão foi quando tinha 30 anos. Mais tarde, essa sombra voltou quando ele tinha 60 anos, e foi apenas aos 64 anos que ela foi embora novamente. Como o próprio Bruce Springsteen explica, ele construiu defesas altas por um longo tempo para suportar o estresse de sua infância.
Mas em algum momento, todas essas construções internas deixaram de ser úteis. Tudo desmoronou. Ela pensava que conter suas emoções em um grau extremo fosse a solução, mas finalmente veio o colapso. Ele se sentia como um trem carregado de nitroglicerina. Como explica em suas memórias, ele não cjhegou a ser hospitalizado, mas deveria ter sido.
A partir dessa primeira crise, ele começou a tomar medicação. Ele assume que a origem de suas depressões e estados maníacos tem uma raiz e é ela que o liga à figura de seu pai. Uma escuridão que o aproxima, segundo ele, de alguns lugares bem ruins.
“Tudo o que sei é que, à medida que envelhecemos, o peso da nossa bagagem desordenada fica mais pesado. A cada ano que passa, o preço de nossa recusa em fazer essa escolha sobe cada vez mais.”
-Bruce Springsteen-
Como Bruce Springsteen saiu de sua escuridão?
The Boss sabe que, de alguma forma, ainda não saiu completamente desse território depressivo. Ele continua tomando medicamentos, mas aprendeu, graças à terapia, ferramentas valiosas para lidar e enfrentar esses pensamentos e sentimentos adversos. Conforme detalhado em seu livro, o mais importante é falar e nomear o que nos machuca.
“Sinto-me mal porque…”, “O que sinto agora é”, “Isso aconteceu e o que me preocupa é”… Devemos definir detalhadamente o que vivenciamos, reconhecer a presença dessas emoções e desses estados e, então, trabalhear nisso. Basta dar um nome ao que nos corrói sem levantar barricadas, isso já nos liberta.
Apesar disso, Bruce Springsteen não pode deixar de fazer uma pergunta a si mesmo: posso ficar doente o suficiente para ser muito mais parecido com meu pai do que eu pensava? No momento isso não aconteceu e a música, assim como o apoio de sua família, continua sendo seu melhor apoio.
Possivelmente, toda a escuridão que nele residia já ficou do lado de fora e em muitas das letras de suas canções. Nós esperamos que sim.
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- Springsteen, Bruce (2018) Burn to Run. DeBolsillo