Como a assimetria cerebral influencia os processos psicológicos?

Você sabia que os hemisférios esquerdo e direito do cérebro têm certas assimetrias anatômicas? Essas particularidades se traduzem em vários processos psicológicos que nos diferenciam uns dos outros. Este texto os explica em detalhes.
Como a assimetria cerebral influencia os processos psicológicos?
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 04 junho, 2023

A assimetria cerebral mostra que certas funções, como a linguagem, são realizadas de forma mais otimizada em um hemisfério do que no outro. A organização do cérebro não é a mesma na metade esquerda e na direita; existem diferenças sutis anatômica e funcionalmente com várias implicações psicológicas.

Por exemplo, o Instituto Max Planck destacou em um estudo que a assimetria neurológica esquerda-direita pode mediar o início do transtorno do espectro do autismo (TEA) e também da esquizofrenia. Da mesma forma, ser canhoto ou destro estaria condicionado por essa característica interessante. Que outros aspectos estão associados a esta característica? Na leitura, você o descobrirá.

A linguagem humana é uma função realizada predominantemente pelo hemisfério esquerdo. No entanto, este é um ponto que ainda não é totalmente compreendido.

O que é assimetria cerebral?

A assimetria cerebral define uma peculiaridade neurológica em que existem diferenças estruturais e funcionais entre os hemisférios. Isso afeta muitas áreas do desenvolvimento humano. Assim, nem todas as pessoas apresentam a mesma forma anatômica neste órgão. Cada cérebro humano é único e apresenta singularidades.

Foi em 1864 que o neurologista francês Paul Broca descobriu que essa assimetria funcional fazia com que nossa língua se localizasse, em maior grau, no hemisfério esquerdo. Também que aqueles pacientes com lesão no lobo frontal esquerdo apresentavam afasia. Da mesma forma, a lateralidade (ser destro ou canhoto) estaria ligada a assimetrias estruturais do córtex cerebral.

A título de curiosidade, esta particularidade não é exclusiva do ser humano; a maioria dos vertebrados mostra isso. Por outro lado, a neurociência destaca que a assimetria cerebral é uma área de pesquisa relevante, pois permite entender melhor nosso comportamento e a origem de certos problemas mentais.

Como a assimetria neurológica afeta o ser humano?

A assimetria cerebral afeta os domínios comportamentais, cognitivos e psicológicos. O impacto dessa característica anatômica e funcional é tamanho que, em estudo da Universidade de León, na Espanha, destacam a necessidade de promover a neuropsicologia como mecanismo para melhor compreender os processos de aprendizagem no ser humano. Vejamos, porém, como essa assimetria neurológica afeta as pessoas.

Condições mentais como a esquizofrenia revelam certa assimetria cerebral em áreas que mediariam exaustão e falta de iniciativa (apatia).

Lateralidade

A assimetria do cérebro poderia explicar por que as pessoas são destras ou canhotas. Embora pareça haver um gatilho genético, segundo artigo publicado na revista PNAS , ser canhoto está associado a diferenças na referida assimetria neurológica, como ocorre em algumas regiões ligadas à linguagem, controle manual, visão e trabalho memória.

Desta forma, enquanto nos destros o hemisfério esquerdo controla a mão direita dominante, nos canhotos é o contrário.

Transtornos mentais e assimetria cerebral

A assimetria cerebral é uma característica fundamental da organização do sistema nervoso. Isso pode criar variações anatômicas e alterar o funcionamento de múltiplos processos neurológicos. Não deveria surpreender, portanto, que essa peculiaridade biológica desencadeie mais de um problema de saúde mental. Vamos discutir distúrbios comuns, abaixo:

  • Pessoas com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) apresentam anormalidades na simetria cerebral. Essas alterações mediam problemas de atenção.
  • O Max Planck Institute for Psycholinguistics também fornece informações relevantes nessa direção. As pessoas que estão no espectro do autismo (TEA) parecem apresentar neurodesenvolvimento lateralizado alterado. No entanto, os autores destacam a necessidade de realizar mais pesquisas e revisões para chegar a conclusões mais claras.
  • Trabalhos como os publicados em Biological Psychology destacam a ligação entre a depressão maior e a assimetria em questão. Especificamente, há menos atividade no hemisfério esquerdo e hiperatividade na área frontal direita. Tudo isso se traduz em pensamento lento, foco mental mais inflexível, regulação emocional deficiente e alta resistência à mudança.
  • Investigações como as divulgadas pela Acta Psychiatrica Scandinavica fornecem dados significativos. Pacientes com esquizofrenia apresentam maior assimetria na massa cinzenta. Essa anomalia já aparece durante o neurodesenvolvimento da criança e geralmente se manifesta como apatia; isto é, com aquela notável falta de energia nesta doença mental gravíssima.

Você tem um lado favorito para mastigar e também para olhar

Parece muito curioso, mas a assimetria do cérebro faz com que as pessoas tenham uma tendência maior de mastigar de um lado e não do outro. Investigações como as realizadas na Universidade de Barcelona referem-se a essa preferência como efeito de lateralidade e a essas particularidades na anatomia neurológica entre os hemisférios.

Por outro lado, foram encontradas predileções no uso de órgãos sensoriais como os olhos, sendo o direito o preferido na maioria dos casos. Se você quiser saber qual é a sua preferência, tente olhar através de uma fechadura. Qual olho você usa automaticamente?

As pessoas mais criativas têm alguma assimetria cerebral?

Talvez você tenha ouvido muitas vezes que as pessoas mais criativas usam o hemisfério direito em maior grau. Embora a comunidade científica veja esses dados como um neuromito, dado o escasso suporte empírico, uma investigação da Universidade de Genebra ofereceu uma série de argumentos que apoiariam parcialmente essa ideia.

É pertinente esclarecer que o pensamento criativo requer o uso de boa parte dos dois hemisférios. Afinal, esse processo cognitivo exige altas doses de intuição e imaginação, aliadas à análise lógica, ao raciocínio, à leitura, à linguagem (estas últimas tarefas processadas pelo hemisfério esquerdo).

O que os pesquisadores descobriram é que as pessoas mais criativas apresentam uma assimetria cerebral ligada à funcionalidade da dopamina. Ou seja, esses indivíduos recebem um nível menor desse neurotransmissor no hemisfério direito, o que lhes permite combinar conceitos remotos e originais para moldar ideias inovadoras e eficazes.

Portanto, de alguma forma, a ideia de que a criatividade está localizada mais na área direita do cérebro parece ter pouca evidência científica. Os dados são, sem dúvida, emocionantes.


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