Limites porosos ou permeabilidade emocional: você sofre disso?

Se seus pais não respeitaram suas necessidades e desejos, você pode ter internalizado que não é importante. É por isso que você tem dificuldade em estabelecer limites saudáveis, dizer “não” e priorizar seus objetivos. Como mudar essa situação debilitante?
Limites porosos ou permeabilidade emocional: você sofre disso?
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 12 novembro, 2023

Como você foi criado? Seus cuidadores validaram cada um dos seus sentimentos e emoções? Você cresceu sentindo que suas necessidades eram importantes? Pode ser que não tenha sido assim. Como milhares de outras pessoas, você pode ter chegado à maioridade presumindo que as necessidades de sua mãe ou de seu pai tinham prioridade. Essas primeiras experiências costumam deixar sérias consequências.

Uma delas, a mais frequente, é desenvolver o que entendemos como limites porosos. Ou seja, assumimos que existe uma linha muito tênue entre o que é aceitável e intolerável em nossas vidas. Não saber como estabelecer limites saudáveis é uma consequência comum entre aqueles que cresceram em lares negligentes. É a fenda de uma ferida pela qual escapam a autoestima e o respeito próprio.

Compreender essa porosidade defensiva, sua origem e como ela se manifesta pode nos ajudar a fortalecer nossas barreiras psicológicas perante os outros. Essas fronteiras que, se não forem respeitadas, nos levam a relacionamentos prejudiciais, insatisfações e problemas para nos sentirmos realizados. Foi o psicólogo e fundador da terapia familiar estrutural, Salvador Minuchin, quem se aprofundou nesse tema que vale a pena lembrar.

Os limites pessoais são fundamentais para desenvolver um bom autocuidado psicológico e para nos empoderar como pessoas.

Homem que sofre de limites porosos
Pessoas com limites porosos se envolvem demais com os outros a ponto de esquecerem de si mesmas.

Limites porosos: como se manifestam?

Amigos que sempre pedem favores. Irmãos com comportamentos passivo-agressivos. Parceiros que ignoram nossos valores e que priorizam seus desejos e vontades. Estabelecer limites é mais necessário do que pensamos, principalmente nas relações com as pessoas mais próximas, aquelas com quem convivemos.

É justamente nesse território do afetivo que as fronteiras entre nossas necessidades e as dos outros se tornam mais fluidas. Tanto que acabam se tornando permeáveis. Os limites porosos aparecem quando nos envolvemos excessivamente em prestar atenção às figuras que compõem nosso ambiente mais próximo. Fazemos isso até que nos dissolvemos completamente nas prioridades de outras pessoas.

Como explicou o médico e psiquiatra Salvador Minuchin em sua obra “Reflections on Boundaries”, de 1982, a criação de limites é o princípio básico para a construção de sistemas relacionais saudáveis. No entanto, nosso condicionamento herdado da infância muitas vezes nos impossibilita de nos capacitar nessa competência.

Nos atrevemos a estabelecer limites quando finalmente conseguimos nos amar como merecemos.

Como é uma pessoa com essa característica e como ela se comporta?

As pessoas que aplicam limites porosos com seu ambiente mostram vínculos de dependência com suas figuras mais próximas. É possível que tenha um relacionamento baseado justamente na codependência excessiva. Também pode ser que elas mal tenham amigos, mas o medo de perdê-los faz com que elas nem mesmo estabeleçam uma fronteira defensiva.

  • Incapacidade de dizer “não” a todas as solicitações do entorno.
  • Priorizam as necessidades de outras pessoas antes das suas próprias. Se acostumaram a sempre se colocar em segundo lugar.
  • Necessidade de se ajustar às expectativas dos outros. O medo de decepcionar ou frustrar é muito intenso.
  • O que os outros pensam delas é uma preocupação constante, quase obsessiva.
  • Medo do abandono.
  • Demonstram grande empatia, é comum que sofram constantes contágios emocionais. Ou seja, internalizam o estresse do parceiro, a preocupação daquele melhor amigo ou o desconforto da família.
  • Não hesitam em se abrir emocionalmente com as pessoas ao seu redor, contam tudo, explicam tudo sem pensar no que os outros podem fazer com essa informação.
  • Normalizam os desrespeitos, as decepções, os vazios que essas pessoas próximas podem lhes causar. Fazem isso porque repetem o mesmo padrão da infância, quando foram criados por famílias disfuncionais.

Que efeitos os limites porosos têm na saúde?

Concentrar-se nos outros, à custa do próprio bem-estar emocional, nos deixa feridos de várias maneiras. A porosidade nos limites faz com que a autoestima nunca se materialize. O autorrespeito não existe, a oportunidade de focar nos próprios sonhos e necessidades é pouco mais que uma quimera

Como bem podemos deduzir, os efeitos de viver por várias décadas com essas cercas psicológicas quebradas e caídas fazem com que a convivência com os outros os sobrecarregue.

  • A necessidade de agradar os outros esgota todos os recursos. É comum que essas pessoas lidem com transtornos como ansiedade e depressão.
  • É comum levar a relacionamentos abusivos.
  • A pessoa com limites porosos dificilmente alcança a autorrealização pessoal e profissional.
  • Da mesma forma, não podemos ignorar um fato. Por trás dessa figura que não é capaz de impor limites entre ela e os outros, geralmente há um trauma de infância. Um passado em que não houve um afeto sincero, válido e seguro.
Garota preocupada em terapia psicológica tratando limites porosos
Para estabelecer limites saudáveis, devemos curar feridas do passado e fortalecer a autoestima. A terapia psicológica pode nos ajudar.

Como podemos reparar esses limites fluidos e falíveis?

Passar de limites porosos para limites saudáveis requer um trabalho pessoal profundo. Alcançar isso nos permitirá não apenas ganhar em saúde mental, mas também nos capacitaremos como seres humanos e trabalharemos melhor em nossos sonhos e necessidades. No entanto, por onde começar?

  • Autocompaixão como exercício de validação. Não podemos estabelecer fronteiras entre nós mesmos e os outros se primeiro não reconhecermos nosso valor como pessoas. É necessário fortalecer a autoestima, tratar-nos com compaixão.
  • Aprender a se comunicar de forma assertiva. Nada nos beneficiará tanto quanto aprender habilidades assertivas e técnicas de comunicação. Falar com clareza e segurança é uma ferramenta de vida.
  • Sinta-se confortável no “NÃO”. Dizer não não é um ato agressivo. Faz parte de nossas interações diárias, é uma forma de respeito próprio e nossa realidade pode mudar completamente quando nos acostumamos a declinar pedidos, a estabelecer limites para o que não queremos ou não sentimos.
  • Aprenda a decepcionar os outros. Para viver juntos, para ganhar bem-estar psicológico e crescimento pessoal, é necessário decepcionar mais de uma pessoa em seu entorno de vez em quando. Você não pode se encaixar em todos os moldes e expectativas que os outros têm para você.
  • Conheça seus limites e explore seus interesses. O que você não quer na sua vida? Que dinâmicas, gestos e comportamentos você não consegue mais tolerar em seus relacionamentos? Esclareça-o e mantenha-o em mente. Então, olhe para dentro de si para descobrir o que você quer e sonha neste momento de sua existência.

Para concluir, às vezes passamos metade de nossas vidas colocando nosso foco em certas pessoas. Temos que mudar a lente e nos explorar mais. Somos mais importantes do que pensamos, e é hora de nos servirmos como merecemos. Vamos curar esses limites porosos e evitar que a dignidade e a felicidade escapem por eles.


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  • Minuchin, S. (1982). Reflections on boundaries. American Journal of Orthopsychiatry, 52(4), 655–663. https://doi.org/10.1111/j.1939-0025.1982.tb01455.x
  • Minuchin, P. (1985). Families and individual development: Provocations from the field of family therapy. Child Development, 56(2), 289–302.
  • Scott, L., Julian, A., Tu, C. (2019). El establecimiento de límites en la terapia de pareja y familia. En: Lebow, JL, Chambers, AL, Breunlin, DC (eds) Encyclopedia of Couple and Family Therapy. Springer, Cham. https://doi.org/10.1007/978-3-319-49425-8_313

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