Lutos sobrepostos: como lidar com várias perdas consecutivas

Às vezes, enquanto estamos em processo de luto, ocorre uma mudança que nos leva a enfrentar uma nova perda sem terminar de processar a anterior. Assim, hoje nos perguntamos o que podemos fazer nesses casos.

Escrito e verificado por a psicóloga Elena Sanz.

Última atualização: 20 novembro, 2022

A morte de um ente querido é uma experiência dolorosa. Quando isso acontece, sentimos que a vida está paralisada, submergindo-nos em um líquido que faz todo o nosso corpo emocional doer. No entanto, às vezes esse período é interrompido por uma nova perda, o que só acrescenta mais dor e exigência a uma situação já complicada. Superar vários lutos sobrepostos é realmente desafiador e precisaremos ter ferramentas pessoais, bem como suporte externo.

Essa é uma situação que ocorre quando perdemos vários entes queridos ao mesmo tempo (por exemplo, se eles morrem em um acidente) ou quando morrem consecutivamente em um período de tempo relativamente curto. Nesse contexto, a dor se acumula e pode facilmente nos sobrecarregar. Se não lidarmos com isso de forma adequada, é muito provável que um luto complicado seja desencadeado ou mesmo que isso leve a um transtorno depressivo.

Sobreposição de lutos e as reações emocionais

Como dissemos, lutos sobrepostos aparecem quando somos forçados a enfrentar as mortes consecutivas de vários entes queridos. Mas também existem outros tipos de perdas que podem dar origem a esse fenômeno. Por exemplo, se enquanto processamos a dor de uma morte vivemos um divórcio, uma demissão ou qualquer mudança de vida de grande importância.

O luto é a reação psicológica natural diante de uma perda, a mesma que nos permite processar o que aconteceu, gerenciar emoções e integrar o evento para seguir em frente. Todas essas tarefas exigem tempo e, se antes de poder finalizar enfrentamos um novo evento adverso, o trabalho se complica.

Além disso, às vezes uma perda recente pode reativar outra dor passada que não elaboramos. Assim, podemos nos ver de luto pela perda atual, enquanto sofremos a dor de uma morte ocorrida anos atrás. Por exemplo, a perda do segundo genitor costuma reativar o luto pela perda do primeiro – não só se perde a pessoa, mas também a referência que os pais supõem.

Seja qual for o caso, os lutos sobrepostos geram uma série de emoções características que são difíceis de enfrentar:

Impotência e falta de controle

Essa é uma das mais marcantes e impressionantes. E é que a pessoa que enfrenta lutos sobrepostos pode se sentir totalmente impotente e indefesa diante de um mundo que parece ter se tornado hostil e imprevisível. Fortes sentimentos de raiva e um sentimento de que a vida é injusta por nos bater com tanta frequência costumam aparecer.

A pessoa pode sentir que tudo de ruim acontece com ela e que não há nada que ela possa fazer para se proteger da dor e da incerteza. Para superar esse sentimento de vulnerabilidade, é importante entender que a realidade em que vivemos é dual e que, portanto, existem eventos positivos e negativos. E, de fato, embora não possamos controlar o que acontece, temos uma certa margem de ação sobre nós mesmos e a forma como lidamos com isso.

Sensação de incapacidade

Os lutos sobrepostos gera um grande estresse emocional, pois a pessoa sente que há enormes demandas sobre ela e que não tem recursos para responder. Se superar uma perda é difícil, lidar com duas ao mesmo tempo pode ser extenuante. É natural sentir que não podemos seguir em frente, que não estamos preparados para lidar com essa dor; é válido se sentir assim, mas você também tem que lembrar que isso é apenas um sentimento e não uma realidade imutável.

Culpa

Um dos fenômenos mais característicos que surgem diante de várias perdas consecutivas é o sentimento de culpa. E é que de alguma forma a pessoa pode sentir que a perda mais recente está se sobrepondo à mais antiga, ocupando mais espaço mental e mais recursos emocionais.

No entanto, é importante entender que isso não significa que um machuque mais do que o outro, ou que uma pessoa seja mais amada do que a outra. É simplesmente uma reação da mente que, devido aos seus recursos limitados, destaca o luto mais recente ou novo.

Como lidar com lutos sobrepostos

Para superar a dor acumulada de viver várias perdas consecutivas, precisaremos de tempo, autocompaixão e apoio. Assim, aqui estão algumas orientações que podem ajudar:

• Tente elaborar cada luto no momento em que ocorre. Fugir ou evitar a dor é um mecanismo de defesa que, embora possa ser necessário no início, se for prolongado, nos impede de avançar e deixa essa dor entrincheirada e pronta para ser reativada no futuro. Por isso, é preferível assumir o controle das emoções no momento em que elas surgem.
• Tente não apressar a recuperação. Para cada pessoa, o tempo necessário para preparar um luto é diferente e, quando vários se sobrepõem, pode aumentar. É natural e benéfico permitir-se parar um pouco, diminuir o nível de exigência pessoal e atender a essa tristeza que nos exige. Você não deve a ninguém continuar funcionando no mesmo nível de antes, seja compassivo consigo mesmo.
• Peça ajuda à sua rede de suporte social. Assumir o controle da dor emocional é uma tarefa complexa e exigente, por isso é permitido delegar e confiar em outras pessoas para certas tarefas diárias. Deixe-se cuidar e tente não se isolar, o apoio social é um bom protetor contra o luto complicado.
• Busque apoio profissional. Nem sempre temos que ser capazes de lidar com tudo sozinhos; em uma situação tão exigente como essa, ter um espaço seguro para nos expressarmos e recebermos orientações é essencial. Às vezes, as pessoas mais próximas ou um líder espiritual podem desempenhar essa função de ventilação e conforto, mas muitas vezes a ajuda psicológica será necessária para lidar com as perdas.

Superar lutos sobrepostos é possível

Em suma, o luto sobreposto multiplica a dor que qualquer perda acarreta e nos confronta com emoções de impotência, desamparo, desconsolo e falta de confiança em nossos próprios recursos de superação.

Por isso, é importante respeitar nossos ritmos, deixar-se sentir e deixar-se ajudar pelas pessoas próximas e por profissionais qualificados nesse sentido. Dessa forma, evitaremos que essa reação natural à perda leve a um transtorno de humor a longo prazo.