Noruega, pioneira no tratamento de doenças mentais sem remédios

O tratamento de doenças mentais sem medicamentos é uma porta que foi aberta no Hospital Psiquiátrico Åsgård, na Noruega. Os psiquiatras noruegueses procuram responder se os antipsicóticos são tão eficazes quanto afirmam ser.
Noruega, pioneira no tratamento de doenças mentais sem remédios
Sergio De Dios González

Escrito e verificado por o psicólogo Sergio De Dios González.

Última atualização: 11 junho, 2021

O tratamento de doenças mentais sem remédios é uma opção que sempre esteve em discussão, sempre foi uma opção. No entanto, a partir de meados do século 20, isso se tornou uma espécie de utopia para a parte mais médica e fisiológica da psicologia.

Com a descoberta e a produção em massa de neurolépticos, acreditava-se que as possibilidades de tratamento alcançariam um auge. Os criadores e promotores desse tipo de droga divulgaram a ideia de que os problemas da mente tinham uma raiz fundamentalmente orgânica. Portanto, era possível tratá-los por meio da ingestão de produtos químicos. Assim, popularizou-se a ideia de que era impossível enfrentar a doença mental sem medicamentos.

No entanto, sempre houve uma corrente paralela que vê o assunto de forma diferente. Não estamos falando apenas de uma posição teórica, pois há muitas aplicações práticas com resultados encorajadores.

Com base nessa tradição paralela, o Hospital Psiquiátrico Åsgård, na Noruega, começou a tratar  doenças mentais sem remédios.

“Eles dizem que querem provas de que as alternativas funcionam. Eu digo, ‘por que você não prova que seu tratamento funciona? Eu li muitos artigos e muitos livros, e ainda não vi provas de que os seus medicamentos funcionam.'”
-Håkon Rian Ueland-

Homem preocupado

Respeito pela autonomia do paciente

Por várias décadas, houve uma controvérsia aguda em torno dos direitos dos pacientes psiquiátricos. A maioria dos sistemas de saúde e os especialistas que os formam partem da ideia de que uma pessoa com diagnóstico de doença mental não tem autonomia e, portanto, outras devem decidir por ela. Ao contrário de outras doenças, um paciente psiquiátrico não consegue resistir a qualquer tratamento que outros desejam utilizar.

Existem muitos psiquiatras no mundo que não compartilham desse princípio. Os direitos fundamentais dos pacientes são um aspecto essencial no Hospital Psiquiátrico de Åsgård. Sua política de tratamento de doenças mentais sem remédios é baseada na defesa  dos  direitos  dos pacientes.

Nessa instituição, são os pacientes  que decidem se querem ou não tomar os medicamentos prescritos. Também são eles que decidem quando é o momento de reduzir as doses, com o objetivo de deixar de tomar os comprimidos ou os medicamentos psiquiátricos. A perspectiva do paciente também conta.

Tratamento de doenças mentais sem remédios

O Hospital Psiquiátrico Åsgård cumpre um mandato do Ministério da Saúde norueguês. Trata-se de uma política de Estado que busca, principalmente, igualar  os portadores de transtorno mental  em termos de direitos.

Para muitos, isso pode parecer complicado: como uma pessoa com problemas em sua mente pode decidir com responsabilidade o que é melhor para ela? Essa pergunta é feita por muitos, porque também há muitos que ignoram os pormenores das chamadas “doenças mentais”.

Em geral, o que a sociedade conhece são estereótipos. Por exemplo, acredita-se que alguém com esquizofrenia sempre está fora da realidade, quando não é bem assim. É como pensar que um diabético está sempre em crise. Os “doentes mentais” têm momentos de crise, mas em muitos outros são estáveis.

Além disso, existem muitos estudos que questionam a eficácia dos tratamentos com medicamentos. O que é mais questionado não é realmente a eficácia desses produtos químicos, mas a forma como são administrados e perpetuados, muitas vezes por conveniência e desnecessariamente.

Em certos casos, quase ninguém contesta o poder da farmacologia como chave para começar a trabalhar com um paciente descompensado.

Outra questão é se a farmacologia pode “curar”, chegar à raiz do problema. Este é realmente o ponto, especialmente considerando que certos medicamentos destinados ao tratamento de transtornos mentais têm uma longa lista de prováveis ​​efeitos colaterais.

Tratamento de doenças mentais sem remédios

Um sistema inadequado

As reações à nova estratégia do Hospital Psiquiátrico de Åsgård não demoraram a chegar. Muitos psiquiatras (e empresas farmacêuticas, é claro) criticaram severamente essa opção. Eles acreditam que é uma atitude irresponsável com os pacientes e que pode acarretar maiores dificuldades para o tratamento. No entanto, a Associação Psiquiátrica Norueguesa decidiu apoiar a iniciativa por meio de uma política de “mente aberta”.

A presidente da referida associação, Anne Kristine Bergem, indicou que abordará esta nova experiência em seu encontro anual. A discussão s erá orientada por duas questões: “Os antipsicóticos funcionam? Eles têm o efeito que somos levados a acreditar?” Ambas as questões tocam o âmago da psiquiatria biológica.

Existem boas razões e evidências suficientes para sugerir que a psiquiatria atual é seriamente falha. Muitas delas estão relacionadas à medicação e à forma como o sistema de atendimento a doenças mentais funciona. É um bom momento para surgirem iniciativas como esta, que certamente lançarão muitas luzes sobre essa importante questão.


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  • Galende, E. (2008). Psicofármacos y salud mental: la ilusión de no ser. Buenos Aires: Lugar Editorial.

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