O homem da areia e o conceito do 'estranho' na psicanálise

O homem da areia é uma história de terror que apresenta vários dos mecanismos que correspondem ao "fantástico" ou "estranho". Sigmund Freud usou essa história para estabelecer os mecanismos inconscientes que operam nessa forma de horror.
O homem da areia e o conceito do 'estranho' na psicanálise
Gema Sánchez Cuevas

Escrito e verificado por a psicóloga Gema Sánchez Cuevas.

Última atualização: 15 abril, 2019

O homem da areia é uma história escrita por Ernest T. A. Hoffman. Sigmund Freud a tomou como um ponto de referência para a construção do conceito de estranho ou sinistro na psicanálise. Além disso, Jacques Lacan se refere à história em seu seminário ‘A Angústia’. A história faz parte da obra ‘Contos Noturnos’, do gênero gótico de literatura de terror.

A psicanálise assume que o sinistro ou estranho é uma variante da angústia. Uma “estranheza perturbadora”, pela qual o conhecido se torna estranho, ou o estranho se torna conhecido, ou ambas as realidades ao mesmo tempo.

“As emoções não expressadas nunca morrem. Elas são enterradas vivas e se manifestam mais tarde das piores formas”.
– Sigmund Freud –

O conceito de estranho explica por que os seres humanos sentem terror de algo que não existe ou de algo que não conhecemos. Um exemplo disso é o famoso “coco” ou “cuco”, um ser que aparece em muitas culturas, embora não tenha sequer uma representação física. No entanto, muitas pessoas chegam à idade adulta temendo a escuridão. A raiz desses medos pode estar nessas histórias infantis como o “coco” ou “cuco”. O que eles realmente temem? Seja o que for, não está fora, mas dentro de si mesmos.

A história do homem da areia

A história do Homem da Areia começa com as memórias de infância de Nathaniel. Quando criança, antes de dormir, a sua mãe lhe dizia que era hora de ir para a cama, caso contrário o homem da areia viria e jogaria areia em seus olhos para fechá-los. A sua mãe lhe dizia também que isto era uma fantasia, mas uma empregada lhe disse que era uma história real.

De acordo com essa empregada, esse ser monstruoso era muito mau. Perseguia as crianças que não queriam dormir. Jogava punhados de areia em seus olhos até eles sangrarem e saírem das suas órbitas. Depois, o homem da areia colocava os olhos em um saco e os levava para a lua para servirem de alimento para os seus filhos.

Criança se escondendo

Nathaniel associava o homem da areia com um amigo de seu pai. Quando ele morreu, o menino acreditou que o culpado era esse ser horrível. Anos depois, ele acredita que poderá encontrar esse personagem novamente, através de um vendedor de barômetros. Mais tarde, ele se apaixonou por Olímpia, que é um autômato, um ser inanimado que ele confunde com uma mulher.

Tudo isso o leva a mergulhar em uma espiral de loucura e a um manicômio. Então, aparentemente ele melhora; mas em um determinado momento, pensa que está vendo o homem da areia novamente e isso faz com que pule de uma grande altura, causando a sua morte.

A análise de Freud

Baseado na história de O Homem da Areia, Freud dá forma ao conceito do sinistro ou estranho. Começa fazendo uma análise linguística e etimológica desse conceito. Dessa forma, ele conclui primeiro que é o extremo oposto do conhecido e familiar. No entanto, aprofundando os seus estudos, também percebe que a palavra se refere ao que está oculto ou secreto e à palavra “casa”.

Através desta análise, atinge o significado que Schelling dá ao estranho. Isto é: o que está destinado a permanecer oculto veio à luz. Então, aparece a ambiguidade do estranho: é familiar (da casa) e ao mesmo tempo é algo oculto. Da mesma forma, esse ‘estranho ou sinistro’ é uma das formas que a angústia assume.

Saída de uma caverna

Freud percebe que, no sinistro, opera um mecanismo pelo qual algo familiar se torna estranho. É o que acontece quando alguém morre: antes era alguém próximo e agora é um cadáver que está em um estado incompreensível. Daí nasceriam os demônios e espíritos sinistros do “além”.

Em O Homem da Areia, o protagonista tem medo de perder os olhos. Freud associa esse medo à mutilação relacionada ao complexo de castração. Ele também encontra uma clara coincidência entre o conceito de repressão e o tema do sinistro. Este último seria o retorno do reprimido, o reprimido que vem à luz. Ele conclui então que o sinistro é o que leva à angústia do complexo de castração infantil.


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  • Cattaneo Rodríguez, G. (2012). Lo ominoso y el artefacto de la mirada. Affectio Soc.(Medellin), 8(15), 81-98.

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