Onde está o meu velho eu?

Onde está o meu velho eu? Uma pergunta que pode nos fazer repensar a nossa existência e a nossa identidade, se olharmos para a nossa trajetória de vida.
Onde está o meu velho eu?
Cristina Roda Rivera

Escrito e verificado por a psicóloga Cristina Roda Rivera.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

Um acidente, um rompimento ou uma mudança estética que não aceitamos podem prejudicar a nossa identidade. De repente, nós nos repensamos e, dependendo do dia, não nos reconhecemos na pessoa que somos atualmente. Já não temos os mesmos sonhos nem as mesmas referências. No entanto, temos muitas resignações a mais.

Perguntar onde está o nosso velho eu não é uma questão de idade. Podemos nos reconhecer como estranhos ao nosso passado desde muito jovens. Já na puberdade, a nossa transição de criança para adolescente pode ser mais ou menos traumática, dependendo de como as mudanças vão sendo assimiladas, internalizando novos papéis e abrindo mão de certos privilégios da infância.

Talvez não nos recuperemos completamente do fato de termos sido crianças ou talvez é nessa fase que nos sentimos como o nosso verdadeiro eu, ao viver nossas ilusões, paixões e misérias. A verdade é que, no caminho para a maturidade, vamos perdendo a nossa espontaneidade.

adolescente preocupado
Dependendo das fases que vivemos, podemos nos sentir mais próximos ou mais distantes do verdadeiro eu que escreveu nas primeiras páginas em branco.

A necessidade de nos reconhecermos por dentro e por fora

Todos nós precisamos de referências. Pais, irmãos, amigos, colegas de classe, etc. Então, logo olhamos além do nosso contexto imediato e queremos ver “como é” o mundo lá fora. Assim, observamos celebridades, influencers, lemos biografias sobre figuras históricas e analisamos o que nos atrai nelas.

A curiosidade sobre o mundo social não nos distancia do nosso mundo interior, mas às vezes pode perturbá-lo. É em plena adolescência, durante a construção do nosso “avatar social”, que compreendemos o que podemos ter de interessante para o mundo, bem como o que o mundo pode ter de interessante para nós.

É um momento em que a incidência de alguns distúrbios está disparando; muitas pessoas vão sofrer porque vão sentir que sua imagem corporal está longe do ideal social. Enquanto isso, outras sentirão que talvez não sejam tão masculinas ou femininas quanto os outros esperam ou desejam. Muitas também vão enfrentar a difícil tarefa de serem aceitas por si mesmas como alguém diferente da família…

Em meio à luta pela identidade pessoal, também teremos que lidar com a aceitação social dentro de um grupo social de referência. Dependendo de como formos nessa construção de mão dupla, chegaremos a uma representação mais ou menos consolidada do “eu”.

Essa motivação para ser “você mesmo” será desafiada. Vamos sentir como ela se dissolve ou desaparece se fizermos coisas com as quais a nossa identidade nunca teve que lidar antes. Por outro lado, vamos sentir que o nosso “eu” será endossado e fortalecido se fizermos coisas que a nossa identidade reconhece como valores que nós mesmos viemos traçando e não desafios ou testes que nos são estranhos para a construção da identidade.

Identidade, uma jornada em direção a nós mesmos que durará pela vida toda

Encontrar a si mesmo pode soar como um objetivo inerentemente egocêntrico, mas, na verdade, é um processo altruísta que está na raiz de tudo o que fazemos na vida. Para nos sentirmos uma pessoa valiosa, devemos saber o que valorizamos e o que temos para oferecer.

É um processo que envolve desmoronar, desfazer-se de camadas que não nos servem em nossas vidas e que não refletem quem realmente somos. No entanto, envolve também um tremendo ato de construção: reconhecer quem queremos ser e trabalhar apaixonadamente para alcançar o nosso destino único, seja ele qual for.

É uma questão de reconhecer o nosso poder pessoal, porém estando abertos e vulneráveis às nossas experiências. Não é algo a temer ou evitar, mas sim algo a procurar com a curiosidade e compaixão que teríamos em relação a um novo e fascinante amigo.

A sensação aterrorizante de que não somos “nada” do que éramos

Há um sentimento muito angustiante que pode aparecer em determinados momentos de nossas vidas, que é o de “não se reconhecer”. Seja por ter feito muitas mudanças, por não ter feito nenhuma, ou por tê-las feito em uma direção que consideramos de pouco valor para nós.

Esses momentos são muito delicados, pois podemos sofrer episódios de despersonalização e desconexão da realidade em que vivemos. São inúmeras as causas que podem despertar esse sentimento de ter perdido parte de nossa identidade.

Há experiências sensoriais, sociais ou ecmnésicas que nos causam desconforto e desenraizamento em relação à nossa vida sentimental, social e profissional. Algumas das experiências que podem nos fazer duvidar do nosso senso de identidade são as seguintes:

  • Ver uma fotografia do passado: uma fotografia é uma visão de nós mesmos “vistos de fora”, que nos fornece um contexto imediato do que estávamos vivenciando em um determinado momento, no que estávamos envolvidos, como estávamos felizes naquele momento, etc. Assim, sentir que desconectamos a nossa vida de uma certa imagem passada que era agradável pode induzir um sentimento de desesperança e fracasso pessoal.
  • Um pedaço de papel que resume uma época de nossas vidas: uma passagem de avião, instruções para uma operação ou anotações sobre o que fazer durante a semana. Não é necessário abrir um diário para voltar a um momento passado que nos lembra o que estávamos fazendo ou para onde estávamos indo em nossas vidas.
  • Encontrar uma pessoa que não vemos há muito tempo: esta é uma das experiências mais gratificantes ou dolorosas que podemos viver. Fora dos filtros visuais e relatos das redes sociais, quando encontramos alguém, somos expostos durante alguns minutos a um “exame” visual e experiencial para o qual talvez não estivéssemos nos preparado e em uma situação não planejada.

Essas são algumas das situações que podem nos fazer sentir que nossa identidade foi perdida ou alterada porque não nos reconhecemos em relação às grandes questões e valores de vida que já tivemos.

Ter grandes projetos de vida é tão inspirador quanto problemático para a identidade pessoal. Eles podem nos ajudar a nos construir, mas também a projetar excessivamente o que pensamos que somos, ignorando as circunstâncias que são cruciais para entender o que fazemos e por que fazemos.

Mulher com bola de cristal pensando em acessórios de personalidade
Sentir que perdemos parte de nossa identidade pode levar à angústia.

Uma viagem ou uma parada…

Perguntar “onde está o meu velho eu?” pode ser uma das primeiras perguntas para nos levar a um reencontro com nós mesmos, aceitando o que aconteceu no nosso passado; ou, pelo contrário, pode ser a introdução para uma série de censuras que não nos levam a lugar nenhum.

Para que a jornada da identidade seja criativa e não repressiva, temos que nos equipar com as ferramentas para isso. Um bom profissional da psicologia vai oferecer as ferramentas necessárias para ressignificar algumas das suas experiências cotidianas e dar sentido a elas novamente, em vez de perseguir um ideal totalmente alheio à realidade em que você vive.


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