Por que quando crescemos paramos de acreditar em mágica?

Na infância tudo é coberto por uma auréola mágica. Fadas, os Reis Magos, monstros, Papai Noel, duendes, coelhos que aparecem no chapéu de um homem vestido de preto... Crescemos acreditando que tudo é possível. No entanto, acreditar em mágica não é para sempre. Ou sim.
María Vélez

Escrito e verificado por a psicóloga María Vélez.

Última atualização: 08 novembro, 2022

Quando crescemos, a maioria das pessoas deixa de acreditar em mágica. Tudo o que nos acontece deve ter uma explicação lógica e coerente, para que se ajuste aos nossos esquemas mentais. Para entender o desconhecido.

No entanto, há adultos que preferem pensar que há algo além das leis da física, que há energias e mundos extraordinários ou que eles têm uma série de superstições que tingem de magia seu cotidiano.

Neste artigo, trazemos algumas explicações de por que e como nossa crença na mágica evolui.

O que é mágica?

Ao falar sobre mágica, as crenças e explicações de fatos fantásticos vêm à mente. Seja acreditar que a fada dos dentes vem à noite recolher os dentes e deixar uma moeda em troca. Ou pensar que algue´m desde a parte de trás de uma carta pode ver o outro lado.

De uma forma mais técnica, o pensamento mágico é definido como a atribuição das causas de eventos reais a ações ou pensamentos que não estão fisicamente conectados a eles. De acordo com os teóricos, existem quatro razões características para a crença na mágica que são comuns aos exemplos dados acima:

  • Pensamentos, desejos ou palavras podem criar ou afetar os objetos físicos.
  • Um objeto físico não animado pode de repente se tornar animado.
  • Um objeto físico pode ser transformado ou reconvertido instantaneamente, violando as leis fundamentais de permanência, espaço físico e tempo.
  • Certos objetos ou eventos afetam outros eventos de maneira não física.

Em suma, as crenças mágicas costumam incluir a fé na existência de eventos ou seres que desafiam o que hoje conhecemos do espaço, do tempo e da matéria.

O que nos faz acreditar em mágica?

Do ponto de vista antropológico, a crença na mágica foi um elemento-chave, pois ajudou a nos tranquilizar a nossa necessidade de buscar relações entre causas e efeitos. A mesma coisa acontece ao longo do desenvolvimento evolutivo. Na infância, a fase entre aproximadamente 2 e 7 anos é caracterizada pelo pensamento simbólico.

Segundo Piaget, nesse estágio pré-operacional, as crianças dão um sentido fantástico ou mágico ao que não entendem. Nessa fase aparecem os primeiros medos irracionais que tentam compreender através da fantasia. Elementos não reais, inspirados muitas vezes nos adultos, nos quais depositam boa parte de suas esperanças. Logo, de quem esperam receber presentes? Do Papai Noel, dos Reis Magos, da fada dos dentes, do duende, etc.

As crianças costumam se sentir à vontade com a existência de um mundo paralelo onde qualquer problema tem uma solução. Além disso, trata-se de um mundo paralelo que nós adultos utilizamos em muitas ocasiões para educar ou promover determinados valores – de outra forma, os desejos das crianças não serão atendidos pelas criaturas mágicas, que são sensíveis aos seus pensamentos e comportamentos -.

Por que deixamos de acreditar?

No entanto, a partir dos 7 anos essa etapa chega ao fim e dá lugar à etapa de operações concretas. Agora as crianças estarão mais preparadas cognitivamente para diferenciar o mundo real do mundo da fantasia.

Isso ocorre porque elas passam a ser capazes de pensar de forma mais lógica e a operar por meio de regras e suposições. Especificamente, elas começam a parar de acreditar em magia porque adquirem as seguintes habilidades:

  • Comparar elementos e ordená-los com base em suas diferenças, o que permite lidar com números, tempo, medidas ou orientação.
  • Classificar objetos de acordo com suas características e determinar o grupo ao qual pertencem. Assim, elas poderão entender, por exemplo, a hierarquia entre seres vivos, humanos e mamíferos.
  • Compreender a conservação dos objetos. Ou seja, apesar de sofrer alterações em sua aparência, o objeto permanece o mesmo.
  • Considerar vários aspectos da mesma situação, como várias dimensões de um único objeto.
  • Compreender as relações espaciais. Por exemplo, o tempo que leva para fazer uma rota ou usar pontos de referência para encontrar um objeto oculto.
  • Formar juízos de causalidade. Embora essa habilidade não seja totalmente adquirida até anos depois, ela começa a ser capaz de formar um raciocínio lógico entre dois eventos.
  • Estabelecer relações lógicas entre dois elementos. Por exemplo, se um chihuahua é um cachorro e os cachorros são mamíferos, os chihuahuas são mamíferos.
  • Diminuição do egocentrismo ou a capacidade de assumir a perspectiva de outras pessoas e pensar sobre como os outros entendem o mundo.

Bingo! Você nem sempre para de acreditar em mágica

Mas então, o que acontece com os adultos que continuam a dar explicações mágicas para certos eventos? Será que eles não superam esse estágio de desenvolvimento? As evidências encontradas a esse respeito são, no mínimo, interessantes.

Embora poucos estudos tenham analisado essa questão, há evidências de que o pensamento mágico não diminui ao longo da vida. Pelo menos, até o final da adolescência. Uma das explicações que os pesquisadores apresentam é que a crença na magia se torna seletiva. Em outras palavras, as experiências e o conhecimento que adquirimos ao longo da vida determinarão em quais eventos aplicamos a mágica.

Por exemplo, se eu tiver conhecimentos avançados de física, usarei suas leis para explicar por que um objeto parece levitar. No entanto, se minhas habilidades aritméticas são menores, quando me deparo com um jogo mágico baseado em números, posso pensar nisso como mágica.

Nesse sentido, um estudo interessante descobriu que, à medida que a idade dos participantes aumentava, as defesas cognitivas e emocionais contra a magia se manifestavam. Em outras palavras, ao se depararem com um evento que não souberam explicar, atribuíram o desaparecimento de um objeto à sua própria falta de atenção. Ou, diante da proposta de se submeter a uma “sugestão mágica” negativa, a rejeitaram por medo ou sentimento de ameaça.

Além disso, apresentavam aos adultos dois cenários hipotéticos em que alguém na rua lhes oferecia dois feitiços (ser rico e feliz, ou ser escravo do diabo). Surpreendentemente, das pessoas que disseram não acreditar em mágica, 60% das pessoas aceitaram o primeiro feitiço, e ninguém o segundo. A razão, que o feitiço negativo poderia ter um efeito em suas vidas futuras. No entanto, quando os feitiços afetaram outras pessoas, elas declararam sua falta de crença na mágica.

Em resumo

Acreditar em mágica parece ser algo que todos carregamos dentro de nós de alguma forma. No entanto, o desenvolvimento cognitivo e a busca por explicações lógicas compensam a frequência com que nos voltamos para seus argumentos. Além disso, na vida adulta é difícil viver na contradição entre as leis da natureza e as experiências mágicas, embora mantenhamos, em muitas ocasiões, algumas superstições.

Ao longo da vida podemos encontrar explicações coerentes. Por outro lado, em outras não. Portanto, embora a ciência e o raciocínio lógico tenham cobrado seu preço, não deixe a fantasia de lado. Pensar que algumas das coisas mais bonitas que nos acontecem não têm explicação é mágico e, acima de tudo, nos enche de esperança.


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