Simone Biles e outras ginastas testemunham sobre o abuso sexual
“Eu culpo o sistema por ter feito vista grossa ao abuso de Larry Nassar.” Simone Biles e outras ginastas testemunharam há poucos dias perante o Comitê Judiciário do Senado nos Estados Unidos. Essa foi a frase mais repetida pelas jovens que, mais uma vez, deram seu sincero testemunho sobre sua difícil experiência com o médico oficial da equipe de ginástica.
Foram mais de 20 anos de abuso contínuo. Até o momento, são 265 vítimas identificadas que se atreveram a fazer a denúncia, no entanto, estima-se que possa haver muito mais mulheres. Tanto que Lassar é considerado o maior predador sexual da história do esporte nos Estados Unidos.
Ele as manipulou psicologicamente e usou sua reputação para fazê-las acreditar que se tornariam grandes estrelas. Conta-se que nas paredes de seu escritório, ele colocou as fotos das meninas que haviam chegado ao topo da ginástica – vítimas também – para impressionar as novas meninas que pretendia abusar…
Com Harry Lassar já condenado à prisão perpétua no Arizona, o sistema judicial e suas vítimas buscam encontrar mais responsáveis…
“De que adianta denunciar abusos se nossos próprios agentes do FBI vão enterrar esse relatório em uma gaveta?”
-McKayla Maroney-
Simone Biles e outras ginastas testemunham sobre seus abusos: ainda há mais culpados
Engana-se quem pensou que estava acabado o caso das agressões às ginastas da seleção dos Estados Unidos. Existem muitas feridas abertas e traumas psicológicos com os quais elas possivelmente terão que lidar ao longo de suas vidas. Porém, algo de que todas as vítimas desse tipo de experiência precisam é a sensação de que a justiça foi feita. Algo que não aconteceu com centenas dessas jovens.
Em 15 de setembro, Simone Biles e outras ginastas (McKayla Maroney, Aly Raisman e Maggie Nichol) testemunharam perante o comitê judiciário do Senado dos Estados Unidos. Aquela audiência revelou informações denunciadas há vários anos: tanto o FBI, a USA Gymnastics e o Comitê Olímpico e Paraolímpico sabiam dos abusos e nada fizeram.
Os monstros não estão apenas em armários ou debaixo das camas
Os verdadeiros monstros, os verdadeiros predadores, não vivem na escuridão dos armários das crianças. Em muitos casos, eles vivem no ambiente mais próximo das crianças. São familiares, cuidadores, professores e também médicos. Harry Lassar foi o homem que, por vinte anos, abusou de centenas de garotas do time de ginástica americano.
No entanto, deve-se notar que existe uma outra tipologia de monstros: aqueles que olham para o outro lado quando conhecem atos dessa natureza. Aquele que finge não ver, além daquele que se recusa a acreditar no depoimento das vítimas quando há muitas evidências que o corroboram. Foi o que aconteceu com muitas dessas meninas que, aos 12, 14 ou 15 anos, relataram ao FBI o que estavam acontecendo.
Mckayla Maroney, que foi medalhista de ouro nas Olimpíadas de Londres de 2012, deu um testemunho especialmente duro. Em uma dessas ligações para o FBI, ele explicou como Nassar deu pílulas para deixá-la sonolenta, de modo que pudesse abusar dela por horas. Ela também relatou quantos de seus tratamentos consistiam em inserir os dedos em sua vagina. Diante dessas explicações, o FBI limitou-se a perguntar se isso era tudo e se aquelas técnicas a ajudavam.
“Durante muito tempo nos questionamos porque ninguém nos validou ou acreditou completamente em nós”. Ter meus abusos minimizados e dispensados pelas pessoas que deveriam me proteger fez com que o trauma durasse mais tempo”.
-Mckayla Maroney
Simone Biles e outras ginastas exigem justiça
Simone Biles e outras ginastas disseram aos senadores que o caso Nassar ainda não foi encerrado. As pessoas que deveriam protegê-las não o fizeram. Quando qualquer uma das meninas relatou uma agressão, o FBI levou cerca de 14 meses para entrevistá-las. Depois, eles minimizavam o ocorrido e fechavam o caso.
O atual diretor da agência federal de investigação e inteligência, Christopher Wray, pediu desculpas no Senado. Ele o fez supondo que a conduta de sua instituição era repreensível e que eles lamentam o que ocorreu. Afirmam também que o supervisor envolvido no caso foi despedido há muito tempo.
Simon Biles insistiu na importância de essas situações não acontecerem novamente. Segundo ela, nenhum atleta olímpico e nenhuma pessoa deve sofrer o que ocorreu com ela, estamos falando de centenas de jovens, em muitos casos crianças. “Se você permitir que um predador sexual machuque crianças, as consequências serão rápidas e irreparáveis.”
O peso do trauma em atletas
A Linköping University, na Suécia, conduziu um estudo em 2014 que revelou que o abuso é mais comum do que pensamos entre atletas de elite. As consequências dessas experiências são altamente prejudiciais, em muitos casos causando uma ideação suicida.
Simone Biles e outras ginastas (estima-se que sejam mais de 300) são exemplos disso. Biles foi a única que testemunhou e que conseguiu competir nas últimas Olimpíadas e todos nós sabemos o que aconteceu. Graças a ela, a importância da saúde mental dos atletas foi colocada em destaque.
Dessa forma, se somarmos o tema do trauma causado pelo abuso sexual aos problemas de ansiedade e transtornos depressivos associados ao mundo da competição, a realidade é ainda mais dura. Mas, no caso de Simone Biles e as outras ginastas, outro fator importante as afetou. A falta de empatia, o desamparo por tantos anos e a sensação de que seus infernos particulares não importavam para ninguém.
Esperançosamente, esse tipo de realidade não acontecerá novamente. Tomará, todos os monstros (aqueles que vivem entre nós) sejam rapidamente identificados e punidos.
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- Timpka t, Janson s, Jacobsson J, et Allifetime sexual and physical abuse among elite athletic athletes: a cross-sectional study of prevalence and correlates with athletics injurybritish journal of sports medicine 2014;48:667.