Alguns sonhos nos preparam para enfrentar nossos medos

Muitos de nossos medos e angústias aparecem na forma de pesadelos. A ciência agora nos diz que esse seria um mecanismo psicológico para nos ajudar a enfrentar esses medos na vida real. Saiba mais a seguir.
Alguns sonhos nos preparam para enfrentar nossos medos
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 15 novembro, 2021

Existem sonhos que nos preparam para enfrentar nossos medos. Esse universo onírico para o qual nosso cérebro nos leva todas as noites às vezes cumpre um propósito que poderíamos chamar de terapêutico. De acordo com estudos recentes, muitas das nossas ansiedades e medos surgem nesse cenário inconsciente para nos ajudar a regular seu impacto na vida consciente.

Os dados são, no mínimo, impressionantes. Pensar que um sonho ruim ou mesmo um pesadelo tem um propósito específico para o nosso equilíbrio, adaptação e bem-estar é algo tão interessante quanto surpreendente. Especialmente porque poucas coisas são tão enigmáticas no mundo dos sonhos quanto essa dimensão que até pouco tempo atrás estava completamente além do nosso entendimento.

Ao longo do século XVIII, os pesadelos eram tidos como doenças da mente, como aqueles estados em que o sofrimento humano se manifestava. Essa ideia vem mudando ao longo do tempo. Hoje, especialistas na área, como a Dra. Deirdre Barrett, psicóloga clínica da Cambridge Health Alliance, os definem como respostas emocionais que fazem parte da nossa evolução.

Sabe-se que crianças entre 3 e 6 anos de idade experimentam mais pesadelos. O ambiente ao redor delas está cheio de coisas que elas não entendem, de dimensões que interpretam como ameaçadoras e que acabam aparecendo em seus sonhos de forma aterrorizante. À medida que crescem e amadurecem, esses mundos oníricos angustiantes vão desaparecendo.

Vamos conhecer mais informações sobre o assunto a seguir.

Mulher tendo pesadelos

Todos nós temos sonhos que procuram nos ajudar a enfrentar nossos medos

Na terapia cognitivo-comportamental, costuma-se usar uma estratégia específica para fazer com que os pacientes reduzam a intensidade da sua resposta emocional a certos medos, fobias ou situações que lhes geram um alto estresse. Essa abordagem é a terapia de exposição, na qual a pessoa é exposta diretamente a esse foco de angústia. É claro que são sempre situações muito controladas.

Curiosamente, todos nós viemos de fábrica com um mecanismo semelhante para o mesmo propósito, um mecanismo para nos ajudar a enfrentar nossos medos. Além disso, esse recurso tão único do ser humano é ainda mais realista. Eles são, é claro, os sonhos. Alguns mais, outros menos, mas todos já tiveram alguma experiência no cenário onírico dos sonhos onde ficam frente a frente com seus medos mais cotidianos ou mais adversos.

Uma entrevista de emprego, um exame, entrar em um avião, medo de ser abandonado ou traído pelo parceiro, etc. Cada uma dessas situações é, para muitos, um foco de angústia. O cérebro sabe disso e frequentemente transfere esses focos para o tecido dos sonhos com um propósito adaptativo.

Com isso, o que ele busca é nos expor a esses medos para dar visibilidade ao nosso problema e nos forçar a resolvê-lo. No entanto, muitas vezes o faz usando simbologias complexas que nem sempre são fáceis de desvendar.

Os sonhos ruins (não os pesadelos) seriam nossos aliados terapêuticos

Talvez não seja fácil acreditar. Pensar que nossos sonhos ruins teriam a função de nos ajudar a enfrentar nossos medos é complicado de aceitar por várias razões. A primeira, porque os sonhos desagradáveis ​​geram desconforto, e não é fácil assumir que possam nos ajudar em algo.

Em segundo lugar, muitos de nós não nos lembramos dos nossos sonhos. Então… como você explicaria esse propósito? No ano passado, foi publicado um estudo interessante realizado pela Universidade de Genebra, pelos Hospitais Universitários de Genebra (HUG) e pela Universidade de Wisconsin (EUA).

Algo que pôde ser visto através de uma longa pesquisa é que os sonhos ruins ativam intensamente nossa amígdala cerebral, a estrutura encarregada de gerar a sensação de medo e alarme. Neste estudo, os participantes foram treinados para anotar seus sonhos todas as noites e tentar entendê-los, dar-lhes um significado.

Muitos desses sonhos ruins estavam relacionados a problemas reais, situações de estresse ou angústia. O simples entendimento da mensagem desses sonhos os ajudava a reduzir a carga emocional. Além disso, também ajudava a desenvolver estratégias de enfrentamento.

Agora, os responsáveis ​​pelo estudo destacam: os pesadelos não possuem o mesmo objetivo. Estes, ao contrário dos sonhos ruins, onde o medo é moderado, são definidos por uma intensidade excessiva de emoções, as quais têm um impacto muito negativo sobre nós.

Mulher carregando pedra nas costas

O mundo onírico, um espaço para nos vermos cara a cara e nos compreendermos

O Dr. Lampros Perogamvros, um dos pesquisadores do estudo, destaca que, a partir dos seus resultados, podemos estabelecer o objetivo de conseguir que os sonhos e a sua compreensão nos ajudem a tratar os transtornos de ansiedade. Não seria uma forma exclusiva de terapia, mas uma ferramenta com a qual abordar o foco dos problemas, assim como uma maneira de regular o impacto emocional.

De certa forma, essa ideia se encaixa no que Carl Jung nos disse uma vez: o mundo inconsciente e o tecido dos sonhos não buscam nada além de restaurar o equilíbrio psicológico. É mais um canal para compreender e usar a nosso favor. Portanto, seria uma questão de registrar nossos sonhos ruins, entendê-los, aceitá-los e gerar mudanças em nossa vida consciente para enfrentar nossos medos.

Uma tarefa complicada, mas interessante, na qual sem dúvida vale a pena se envolver.


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  • Virginie Sterpenich, Lampros Perogamvros, Giulio Tononi, Sophie Schwartz. Fear in dreams and in wakefulness: Evidence for day/night affective homeostasis. Human Brain Mapping, 2019; DOI: 10.1002/hbm.24843

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