Tipos de vergonha e como elas nos afetam
Recentemente, um aclamado psicanalista americano propôs 4 tipos de vergonha que ele considera fundamentais. Considerando que hoje as pessoas estão mais preparadas para falar sobre o que as envergonha, ele explica como acredita que cada uma dessas variantes pode nos afetar.
Em seu livro publicado recentemente, Burgo (2018) apresenta quatro paradigmas para estudar essa sensação. No entanto, antes de abordarmos as diferenças, podemos dizer que há um quadro detalhado comum em relação às manifestações da vergonha:
- Rubor facial, no pescoço ou no peito
- Comportamentos ou pensamentos de fuga e/ou evasão
- Necessidade imperativa de desaparecer ou mudar de lugar
- Dificuldade em manter o olhar na outra pessoa
- Confusão mental transitória
O que os especialistas no estudo deste estado psicofísico pensam e compreendem sobre a vergonha tende a diferir da concepção que a maioria das pessoas tem dela.
Tipos de vergonha e autoestima
Muitas pessoas têm uma concepção muito negativa da vergonha. No entanto, os autores do estudo científico dos tipos de vergonha a concebem como mais variada em sua natureza e com consequências mais moderadas e menos desastrosas.
De uma maneira ou de outra, a vergonha é um aspecto relativamente frequente e dificilmente evitável de nossas vidas cotidianas. No entanto, este grau de toxicidade que geralmente atribuímos a ela pode não ser tão significativo.
De fato, Burgo propõe em seu livro — com base em suas observações clínicas de mais de 35 anos — uma surpreendente relação entre vergonha e autoestima.
Ele considera que as lições que podem derivar da interação com nossos estados de vergonha teriam um impacto psicológico mais abrupto que a inibição que a emoção poderia gerar. A mensagem que esse autor nos oferece é otimista e desmistificante.
Normalmente, poucas são as ocasiões em que paramos para ouvir e nos envolver em um diálogo produtivo com nossos estados de vergonha. O que costuma acontecer é que os diferentes tipos de vergonha a que ficamos expostos são tão aversivos que tendemos a mascará-los com condições como:
- Vícios
- Perfeccionismo
- Pena de si mesmo
- Promiscuidade
- Narcisismo
“O necessitado não deve se envergonhar”.
-Homero-
Tipos de vergonha e sua influência
Uma das razões pelas quais hoje, tanto no âmbito acadêmico quanto no clínico, é mais fácil abordar a questão é porque, em geral, as pessoas tendem a ter menos medo; a relutância em falar sobre o que nos envergonha é menor na sociedade atual.
A vergonha afeta inúmeros traços de personalidade e de mecanismos de defesa psicológica.
Em um contexto social em que somos encorajados a mostrar nossa verdadeira imagem, amar a nós mesmos pelo que somos e viver em harmonia com nossas qualidades e com o conteúdo de nossa mente, as pessoas estão mais preparadas para olhar para o seu interior e compartilhar o que as deixa envergonhadas.
A psicologia positiva, tão presente atualmente, é um exemplo claro de defesa da aceitação com otimismo de nossos traços menos desejáveis.
Para Burgo, lidar com a vergonha, em qualquer uma de suas formas, é uma ocupação diária, um processo psicológico que, como tantos outros, se desenrola durante o trabalho diário. Portanto, enfrentá-la faz parte de um fenômeno natural e aceitável.
A proposta desse autor é que, de um modo geral, se possa distinguir quatro tipos de vergonha:
1. Amor não correspondido
Basta ter amado alguém e saber que esse amor não foi correspondido, ter sido rejeitado ou abandonado pela pessoa que você amava, para ter uma ideia precisa da vergonha envolvida nesta situação. Em alguns casos, a vergonha chega à humilhação.
Sabe-se que esse tipo de vergonha pode começar a ser experimentado nos primeiros anos de vida; aqueles bebês que, repetidamente, não conseguem provocar as reações afetivas desejadas em suas mães após inúmeras tentativas de chamar atenção, experimentam algo muito semelhante a essa vergonha devido à “unilateralidade amorosa”.
A psicologia observa que as pessoas que foram criadas dessa maneira, com mães que não chegaram a atingir um nível suficiente de empatia no vínculo materno-filial, têm uma aflição estrutural que pode assimilar-se a uma vergonha basal, que condiciona negativamente o desenvolvimento normal do indivíduo.
“Os livros que o mundo chama de imorais são os livros que mostram ao mundo a sua própria vergonha”.
-Oscar Wilde-
2. Exposição indesejada
Esse tipo é mais recorrente quando falamos de vergonha em uma conversa informal. Está relacionada a vários episódios diários, mais ou menos comuns, como receber uma chamada de atenção, ser menosprezado em público, ou alguém entrar no seu quarto quando você não está vestido.
Geralmente, esse tipo de vergonha — devido à sua frequência e relativa falta de gravidade — é transitório e pouco relevante para o bem-estar psicológico do indivíduo.
No entanto, dependendo da predisposição da pessoa e da intensidade da emoção experimentada, alguns casos podem adquirir seriedade ou estar associados a traumas.
4. Quebra de expectativas ou decepção
Aqui estaria o tipo de vergonha que surge após uma tentativa fracassada de alcançar um objetivo, e com a quebra de expectativas autoimpostas ou criadas por outras pessoas.
Quanto à gravidade e às possíveis repercussões, é semelhante ao tipo anterior. Alguns exemplos cotidianos que poderiam desencadear esse sentimento de vergonha são:
- Não atender à projeção profissional esperada.
- Crise em uma relação de amizade.
- O fracasso de uma relação amorosa.
5. Exclusão ou marginalização
Quase todos nós, devido à nossa própria condição de seres sociais, temos o interesse em nos encaixarmos e desenvolvermos um sentimento de pertencimento a um grupo.
Este princípio é aplicável a quase todos os âmbitos da nossas vidas: trabalho, relações amorosas, amizades, etc. No entanto, há momentos em que esse sentimento de pertencimento pode se ver ameaçado…
Nesses casos, uma boa autoestima e a capacidade de fazer atribuições corretas serviriam de defesa contra a influência negativa desse tipo de vergonha — atribuições do tipo “ Meus amigos não me convidaram para o churrasco hoje porque, com o meu trabalho, eles provavelmente pensam que estou muito ocupado e não querem me incomodar, mas não porque não querem ficar comigo “ —.
Conclusão sobre os tipos de vergonha
A vergonha pode chegar a ser cansativa e a irritar. Tanto que, em alguns casos, pode ser um elemento determinante do nosso equilíbrio emocional e da constituição da nossa personalidade.
De fato, alguns traços de personalidade considerados desadaptativos, como o narcisismo ou as tendências autodestrutivas, são tipicamente associados à pobreza de mecanismos de enfrentamento da vergonha.
Dizer “não” a uma criança pode implicar uma variedade muito leve de vergonha, já que tende a interromper os impulsos exploratórios naturais da criança. No entanto, esse tipo de vergonha não costuma durar muito ou causar sequelas a longo prazo.
“É mais vergonhoso desconfiar dos amigos do que ser enganado por eles”.
– François de La Rochefoucauld-
Portanto, a menos que enfrentemos uma pessoa cuja infância tenha sido atormentada por abuso, negligência ou trauma, os pequenos “reservatórios” de vergonha que ela possa ter acumulado não devem implicar um efeito negativo permanente. Por esse motivo, os pais não devem se preocupar em relação às negações que fazem aos filhos de vez em quando.
No entanto, se as pessoas que foram severamente impactadas pela vergonha decidirem procurar assistência psicológica — algo que recomendamos fortemente —, o terapeuta deverá ir a fundo e descobrir, pouco a pouco, as defesas pessoais da pessoa após ter conquistado a sua confiança.
Construir laços de confiança requer tempo e esforço, especialmente para aqueles que nutrem sentimentos profundos de vergonha e humilhação. Para eles, ser julgado pelos outros pode ser uma grande preocupação, e pode haver um medo de ser julgado pelo terapeuta.
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- Burgo, J. (2018). Shame : Free yourself, find joy and build true self-esteem. Londres: Watkins Media.
- Gilbert, P. (2002). Body Shame: Conceptualisation, research and treatment. Sussex: Brunner-Routledge.
- Hutchinson, P. (2008). Shame and philosophy. Londres: Palgrave MacMillan.
- Marina, A. (2017). Vergüenza, orgullo y humillación: contrapuntos emocionales en la experiencia de la migración laboral femenina. Estudios Sociológicos, 35(103), 65-89.